Bloqueio na estrada, peso no bolso
• IPCA-15 dispara para 1,33%, o maior em 12 anos. Protesto de caminhoneiros é nova ameaça
João Sorima Neto, Lucianne Carneiro, Juraci Perboni (*) e Anselmo Carvalho Pinto (*)
Roda presa
RIO, SÃO PAULO, FLORIANÓPOLIS e CUIABÁ - No sétimo dia de protestos dos caminhoneiros, os pontos de bloqueios atingiram rodovias em pelo menos 12 estados brasileiros, e o desabastecimento já ameaça jogar mais lenha na fogueira da inflação que o mercado espera que passe de 7% este ano. Ontem, o IBGE informou que o IPCA-15, prévia da inflação oficial, subiu 1,33% em fevereiro e acumula alta de 2,23% em apenas dois meses - metade do centro da meta fixada para este ano, de 4,5%. Com os protestos nas estradas, já há falta de produtos e aumento de preços em alguns municípios. Segundo economistas, a intensidade do impacto na inflação dependerá da duração das interdições nas estradas e o efeito pode ser apenas temporário.
Em municípios de Santa Catarina e Paraná, a falta de combustível fez alguns postos cobrarem até R$ 5 pelo litro de gasolina e R$ 4 pelo de diesel. Na Ceagesp, maior entreposto comercial de São Paulo, frutas como melancia, maçã e pera começam a desaparecer das lojas.
Pressão da energia elétrica
Os efeitos do protesto também já se faziam sentir ontem no Rio de Janeiro, onde alguns varejistas da Ceasa deixaram de receber mercadorias. Outros foram avisados por fornecedores que muitos caminhões de entrega sequer serão abastecidos por medo de perder a cargas nos bloqueios. Nos supermercados, embora ainda não haja falta de produtos, fornecedores já se organizam para antecipar entregas e evitar eventuais problemas de estoque. A expectativa é que se o protesto for mantido, outros preços subam ainda nesta semana.
- A tendência é que a paralisação dos caminhoneiros seja mais um fator de pressão (sobre a inflação). Mas vai depender do tempo de duração. A princípio, se espera alguma alta no frete, que será um fator a mais para perturbar os preços, mas não vai mudar o número da inflação no ano. Problemas como a alta do preço da energia elétrica são muito mais sérios que isso - avalia o professor de Economia da PUC-Rio Luiz Roberto Cunha.
Tradicionalmente um mês em que a inflação é puxada por educação - por causa dos reajustes de mensalidades escolares -, neste ano os preços de fevereiro foram mais influenciados por transportes e energia. O maior impacto individual foi energia elétrica, que subiu 7,70% e respondeu por 0,23 ponto percentual da alta de 1,33% do mês. Com aumento de combustíveis (4,80%), ônibus urbano (2,46%) e veículo novo (2,76%), os preços do grupo Transportes subiram 1,98%, com impacto de 0,37 ponto percentual. Com isso, o IPCA-15 foi o maior para um mês de fevereiro em doze anos: em 2003, a alta foi de 2,19%.
A economista da Tendências Consultoria Adriana Molinari destaca a possibilidade de impacto nos preços de alimentos no curto prazo. Mas por pouco tempo:
- Os preços sobem, mas a tendência é de uma espécie de devolução quando a oferta se normaliza.
Por ora, são os varejistas os primeiros a sentir os efeitos dos protestos. No Rio, a Rossi Alimentos não recebeu as cargas de de manga e mamão que vinham do Espírito Santo e de Petrolina (PE).
- Não sabemos como vai ficar. Os fornecedores avisaram que já liberaram a mercadoria, mas pode ficar preso na estrada. Se não chegar mais fruta, não vamos nem abrir a loja - disse o proprietário, Olivio Angotti.
A escassez também fez o preço aumentar: a caixa de mamão papaya de sete quilos passou de R$ 10 na segunda-feira para R$ 14. Na Nipo Alimentos, o preço da caixa de 20 quilos de cenoura, que na segunda era vendido entre R$ 50 e R$ 55 , passou para R$ 60, segundo Mario Kikuta, vendedor da loja.
Governo convoca reunião
Segundo a Polícia Rodoviária Federal (PRF), até o fim da tarde de ontem, foram registrados 124 pontos de bloqueios em rodovias federais. Também houve bloqueios em estradas estaduais, como a via Anchieta, em São Paulo, que dá acesso ao Porto de Santos, em Goiás e no Piauí. Após muita negociação, a força-tarefa da Advocacia Geral da União (AGU) e do Ministério da Justiça conseguiu liberar as rodovias BRs 293, 116 e 392, na região de Pelotas (RS) e em todo o estado de Minas Gerais.
Preocupado com os reflexos do protestos dos caminhoneiros, o governo vai abrir a partir de hoje uma mesa de negociações entre as lideranças dos caminhoneiros e dos empresários do setor. Após articulação com cinco ministros, foi marcada uma reunião para esta tarde no Ministério dos Transportes.
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