O Estado de S. Paulo
Nada mais incorreto do que chamar os atos de sexta-feira de "protestos". Só se foram protestos contra o protesto real marcado para hoje, este sim contra alguma coisa. Aliás, contra muitas coisas, a começar do governo Dilma Rousseff.
As manifestações de sexta, financiadas pela CUT, coloridas pelas camisetas vermelhas e apoiadas por PT e PC do B, foram a favor do governo, de Dilma, da reforma política e do que resta da Petrobrás. Se foram contra alguma coisa, foram preventivamente contra o verdadeiro protesto, neste domingo.
Governo e partidos, de situação e de oposição, parecem um tanto atarantados diante das manifestações de hoje. Não conseguem prever que dimensões terão, quão diversificado será o público, qual o efeito disso tudo e qual o impacto sobre quem fica em casa, assistindo pela TV e comendo pipoca.
O tucano Aécio Neves, que acaba de sair de uma eleição com quase metade dos votos do País, nem consegue dizer, ao certo, se torcerá ao longe ou dará uma passadinha. Talvez sim, talvez não. Depende do quê? Da própria manifestação.
Não é o PSDB que comanda a manifestação, é a manifestação que está comandando os passos do PSDB, do PPS, do DEM... Eles apoiam a ida às ruas, mas estão a reboque delas.
Ao contrário do movimento de sexta-feira, que tem origem e objetivos claros, o de hoje nasceu difusamente nas redes sociais, ganhou envergadura tal o tamanho das crises (política, econômica, ética) e tem a organização e o financiamento dividido com a Força Sindical. Tende a atrair de jovens a velhos, de profissionais liberais a assalariados de baixa renda, de centro esquerda à direita mais reacionária. É o movimento do "não" ao que está aí.
Será que também vai render R$ 30 para um imigrante da Guiné, que nem fala português, vestir uma camiseta, fazer figuração e inflar os números (como mostrou o Globo ontem, nas reportagens sobre as manifestações da CUT na sexta)?
Entre tantas dúvidas quanto a este domingo, sobressaem-se duas. A primeira é sobre o tamanho da coisa. Será menor, tão grande ou maior do que a de sexta? A segunda é sobre o risco de provocações. Se tudo transcorreu na santa paz em 23 Estados e no DF na sexta, por que não transcorreria hoje?
Porque sempre pode haver black blocs, encapuzados, quebra-quebra. Que desde já fique todo mundo sabendo que, se isso acontecer, não terá sido por acaso nem genuinamente. A isso se chama de infiltração e provocação.
Esse início de polarização entre prós e contra o governo - que chegou às raias da insanidade na Venezuela, mas poucas vezes se viu no Brasil - ocorre numa conjuntura muito desfavorável. A presidente da República não pode mais pisar em São Paulo, para evitar vaias, e tem dificuldades para abrir a boca, para não sofrer panelaços.
Com o Executivo atolado num mar de indicadores econômicos negativos (o pior em dez anos, o pior em 15 anos, o pior da história...), o Legislativo patinando na Lava Jato e endeusando Eduardo Cunha, mais o Judiciário escorregando ao destacar o ex-advogado do PT como juiz do PT, o que se tem é irritação.
É a irritação que leva as pessoas às ruas hoje. E foi a irritação com essa irritação que levou os militantes às ruas na sexta, para apoiar o governo - ou, mais apropriadamente, o PT no poder.
Registre-se que tudo começou com a convocação para o impeachment - a ponto de a própria presidente, em mais um erro político crasso, ter falado publicamente sobre a hipótese. Entretanto, hoje, no dia D, na hora H, o foco parece bem mais diluído.
De qualquer forma, este domingo, 15 de março, abre uma nova etapa no dinâmico e sempre surpreendente processo político brasileiro. Dê no que dê, a luta continua. E dos dois lados. Lula já convocou o "exército do MST". Fernando Henrique reagiu: se é meio a meio na Venezuela, Lula teria 20% no Brasil. A conferir.
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