Dilma diz que não respeita delator e rejeita acusações
Giuliana Vallone, Raul Juste Lores, Renata Agosti – Folha de S. Paulo
• Presidente diz que não aceita suspeitas sobre doações à sua campanha em 2014
• Presidente compara confissão feita por empreiteiro a delações obtidas sob tortura na ditadura militar
NOVA YORK, BRASÍLIA - Em sua primeira manifestação pública sobre as acusações de irregularidades no financiamento de sua campanha à reeleição, a presidente Dilma Rousseff rejeitou as suspeitas e comparou a confissão do empreiteiro Ricardo Pessoa às delações obtidas sob tortura na ditadura militar.
"Eu não respeito delator, até porque estive presa na ditadura militar e sei o que é", disse a presidente nesta segunda (29), em Nova York. "Tentaram me transformar numa delatora. A ditadura fazia isso com as pessoas presas e garanto para vocês que resisti bravamente", afirmou.
Militante de grupos de esquerda que defendiam a luta armada contra a ditadura, Dilma foi presa e torturada por militares e ficou na cadeia por quase três anos, até 1972.
Apontado como líder do cartel de empreiteiras investigado pela Operação Lava Jato, Ricardo Pessoa fez acordo de delação premiada para colaborar com as investigações. Ele confessou ter pago propina para fazer negócios com a Petrobras e afirmou ter feito doações eleitorais a Dilma e outros políticos para não perder seus contratos na estatal.
A empresa de Pessoa, a UTC, deu R$ 7,5 milhões para a campanha de Dilma no ano passado. As doações foram declaradas à Justiça Eleitoral e negociadas por Pessoa com o então tesoureiro da campanha, Edinho Silva, que hoje chefia a Secretaria de Comunicação Social do Planalto.
Dilma negou irregularidades na campanha. "Jamais aceitarei que insinuem sobre mim ou sobre minha campanha qualquer irregularidade", disse. "Se insinuam, alguns têm interesses políticos."
A presidente lembrou que seu adversário na corrida presidencial, o senador Aécio Neves (PSDB-MG), também recebeu doações da UTC. O tucano declarou R$ 4,5 milhões à Justiça Eleitoral.
Aécio reagiu com uma nota em que diz que Dilma "não está bem". Segundo ele, "ou não está raciocinando adequadamente, ou acredita que pode continuar a zombar da inteligência dos brasileiros".
Ao explicar por que não respeita delatores, Dilma se referiu a Joaquim Silvério dos Reis, o delator que denunciou a Inconfidência Mineira no fim do século 18.
O acordo de delação premiada de Ricardo Pessoa, que lhe permitirá obter uma pena menor para seus crimes na Justiça, foi feito de acordo com regras estabelecidas por uma lei sancionada pela própria presidente, em 2013.
Tortura
Advogados das empreiteiras investigadas pela Operação Lava Jato, que consideram abusivas as prisões de seus executivos, têm comparado à tortura psicológica as pressões que eles têm sofrido na cadeia nos últimos meses.
A repercussão das revelações de Ricardo Pessoa, que vieram à tona no fim de semana, mudaram o clima da visita de Dilma aos Estados Unidos, onde ela espera obter notícias positivas para reagir ao aprofundamento da crise política e econômica que enfrenta desde o início do ano.
Ela se encontrou nesta segunda com o ex-secretário de Estado dos EUA Henry Kissinger, que apoiou ditaduras no Brasil e outros países da América Latina nos anos 70. Dilma disse que ele é uma "pessoa fantástica" e que a conversa foi "instigante e inspiradora".
Após a entrevista, visivelmente cansada, Dilma confundiu-se ao se despedir dos jornalistas, dizendo: "Agora, eu vou para os Estados Unidos".
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