• A autoridade do topete do líder Picciani é eloquente
- Valor Econômico
Exercício impossível imaginar qual governo sairá da nova composição do ministério da presidente Dilma Rousseff, a segunda gestada em nove meses do segundo mandato. Mas quem se importa? É um vale tudo, na verdade, não uma composição para governar, tal como entendido o verbo, de maneira simples. A execução de um plano formulado a partir do que o presidente da República, seu partido, seus ministros, constatam ser o melhor para o país. Dilma não teve plano a anunciar nem na campanha eleitoral, omitiu até mesmo aquele papel falso, que candidatos apresentam aos seus eleitores como uma agenda de intenções, para ficar mais confortável criticar o plano alheio. As poucas coisas que mencionou, no calor do debate com adversários ou em peças de propaganda, delas desistiu, ou foi premida a fazer exatamente o contrário do que propusera depois de eleita.
Agora, então, é o que está em cada cabeça. Cada um faz o que quer, vez que não é um Ministério para executar um programa de governo, menos ainda para conseguir eficiência em áreas onde o PT claudica, desde sempre, de forma a recuperar sua imagem para a próxima rodada eleitoral.
O que a presidente quer, e para isso juntou essas pessoas num mesmo governo, é evitar o impeachment. Meta alcançada, segundo constatam os especialistas em contagem de votos na Câmara e no Senado. Havia, porém, uma sub-meta, a de aprovar a CPMF, novo imposto para a Previdência (segundo o governo e o novo ministro Miguel Rossetto) ou para a Saúde (segundo o novo ministro Marcelo Castro) que, como o dinheiro não tem carimbo, se destinaria ao superavit das contas ou redução dos deficits orçamentários. Como, de resto, ocorreu com a CPMF do primeiro governo petista, extinta por exaustão da sociedade com a desproporção entre a extorsão dos governos e os péssimos serviços públicos oferecidos à população. Essa conversa de vinculação ainda vem mal jogada na hora que o governo gostaria de ampliar a desvinculação de receita, portanto não convence nem os puros.
Na verdade ninguém tem mais credibilidade para nada.
O governo sabe que aprovar a CPMF é missão impossível que deu a essa nova base supostamente mais fiel que a anterior, mas não há ninguém mais surdo e cego às obviedades políticas do que o staff presidencial. É um grupo de pessoas autossuficientes, arrogantes, que vão em frente seguidos por um arranjo que se sobrepõe ao anterior que não deu certo, sucessivamente.
O caso das contas do governo é exemplar desse modelo de operação. Vários pareceres foram emitidos pelo TCU, dos técnicos e do relator, públicos, todos condenando as práticas da administração orçamentária do governo Dilma. Foi prorrogado por duas vezes o prazo de defesa, foram aceitos recursos, defesa oral, defesa escrita, os ministros do tribunal convocados a reuniões em ministério. O governo impondo a aceitação de uma defesa simplória, baseada no fato de que cometeu o erro porque todos cometeram. Faltando uma semana para o julgamento, tomou uma providência concreta para demonstrar boa vontade em corrigir-se, com o decreto proibindo pedaladas fiscais. Apenas para mostrar, na última hora, que não vai pecar mais.
Ato contínuo apela a uma série de chicanas que estão deixando perplexos os ministros de tribunal que gostariam de solidarizar-se a Dilma mas agora temem envolver-se no amadorismo do processo.
Assim agiu o governo em todas as áreas, e não tinha porque melhorar na reforma ministerial. A prioridade retórica à educação já está passando ao terceiro ministro em nove meses. A tentativa, constatada em conversas ontem, nas solenidades de posse, é adivinhar quanto tempo vai durar essa alegria.
A autoridade do topete do líder Leonardo Picciani (PMDB), mentor da reforma, no palco da posse do ministro da Saúde Marcelo Castro, é eloquente. Saindo dali, depois de devidamente homenageado na nominata, já não conseguiu dar quorum de deputados à sessão do Congresso que analisaria vetos da presidente a projetos que criam despesas.
O ministro Andre Figueiredo (PDT), que assumiu o Ministério das Comunicações, resolveu deixar bem claro que continua a discordar da política econômica, tal como quando era líder. Quem se importa?
Nesse clima de liberalidade, quem havia barbarizado na semana passada, até recuperou-se: o ministro da Saúde Marcelo Castro.
Seu antecessor, Artur Chioro, fez um interminável discurso de uma hora para relacionar o que acha que fez em vinte meses de gestão e levantar a militância petista que o acompanha, mais numerosa do que aquela que resistiu no Ministério da Cultura. Castro falou por menos tempo, de maneira mais objetiva e demonstrando conhecimento de todos os avanços e retrocessos da área, ministro a ministro, nos últimos 25 anos. Fixou sua agenda em poucos e objetivos pontos, entre os quais o primeiro foi o financiamento à saúde. Fez a defesa da indefectível CPMF mas omitiu a fórmula de imposto bipolar que havia proposto logo após ser empossado: a cobrança na entrada e na saída do dinheiro. O ministro foi discreto, evitou repetir a ideia e transferiu às autoridades da economia a definição da facada.
Na Educação, para onde voltou contrariado o ministro Aloizio Mercadante, já foram perdidas todas as esperanças de conhecer-se na sua essência o slogan "Pátria Educadora". Com seus antecessores de gestão sobrevivendo três meses cada um, Mercadante havia deixado lá um secretário-executivo que toca a pasta enquanto faz política. Será a continuidade.
Só não há dúvida de que é uma configuração ministerial por pouco tempo. O PT retomará seus postos logo que a presidente Dilma conseguir um pouco de ar para respirar e o impeachment virar apenas um pesadelo que passou com o amanhecer.
Procura-se quem inventou o orçamento com déficit, quem propôs arguir suspeição do relator das contas do governo, quem sugeriu convocar os jornalistas que entrevistaram o ministro Augusto Nardes para deporem contra sua fonte e a favor do governo no TCU, quem convenceu o governo que não há imposto substituto para a CPMF. Só pode ser a mesma pessoa.
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