• O governo quer adiar o julgamento até que se analise na Corte de Contas se o relator do balanço contábil de 2014, ministro Augusto Nardes, é suspeito no caso por ter adiantado voto em manifestações na imprensa
Fábio Fabrini, João Villaverde e Beatriz Bulla - O Estado de S. Paulo
BRASÍLIA - O governo apresentou nesta terça-feira, 6, no Supremo Tribunal Federal um mandado de segurança para tentar suspender sessão do Tribunal de Contas da União (TCU) que avaliará as contas da presidente Dilma Rousseff, marcada para hoje. A medida jurídica é o último lance para evitar a provável rejeição do balanço de 2014 pela corte, possivelmente por unanimidade.
Se mantida a sessão, a tendência é de que todos os integrantes do TCU sigam o entendimento do relator, Augusto Nardes, que recomendou aos colegas a reprovação por conta de irregularidades conhecidas como pedaladas fiscais (manobras contábeis).
A estratégia do governo é tentar evitar ao máximo o envio de um parecer adverso ao Planalto para o Congresso. A oposição e setores rebelados da base aliada esperam que o tribunal recomende a rejeição para embasar um processo formal de impeachment de Dilma. Cabe ao Legislativo julgar as contas da presidente e, caso deputados e senadores confirmem a reprovação, uma das principais consequências é que ela se torna inelegível, pela Lei da Ficha Limpa, não podendo disputar cargos eletivos.
No pedido de liminar feito pelo advogado-geral da União (AGU), Luís Inácio Adams, o governo alega que o TCU descumpriu o rito previsto no Código do Processo Civil (CPC) ao tratar do pedido de suspeição e afastamento do relator, Nardes, apresentado na segunda-feira, com o argumento de que ele agiu com parcialidade e antecipou seu voto em entrevistas à imprensa sobre o processo. Com isso, teria descumprindo a Lei Orgânica da Magistratura e normativos do próprio TCU.
Na peça apresentada ao Supremo, a AGU sustenta que o pedido de suspeição deveria ser tratado pelo TCU num processo apartado e, só depois de uma decisão a respeito, a apreciação do mérito das contas poderia ocorrer. O tribunal, no entanto, marcou a análise dos dois assuntos na mesma sessão e distribuiu o caso ao relator.
“As manifestações do relator junto ao TCU não constituem declarações genéricas. Ao contrário, manifesta opinião concreta sobre o processo de contas da presidente, ainda pendente de apreciação. Referida conduta e ilegal e acarreta a suspeição do ministro, além das possíveis consequências de ordem disciplinar”, argumentou Adams no mandado de segurança. “Deve ser julgada (a suspeição) em apartado, antes das questões de mérito discutidas no processo principal, o que não está sendo observado pelo TCU”, acrescentou ele.
Reunião. Na tarde desta terça, a própria AGU avisou o presidente da corte, Aroldo Cedraz, de que um mandado de segurança seria apresentado. Com isso, uma reunião de emergência foi convocada. Participaram sete dos nove ministros que julgam as contas.
Para evitar que o ministro do Supremo Luiz Fux, sorteado para analisar o mandado de segurança do governo, conceda uma liminar favorável a Dilma, o TCU decidiu ontem mesmo autuar um processo em separado para a análise da suspeição.
Na sessão de hoje, o relator do caso, ministro Raimundo Carreiro, que também é o Corregedor da Corte de Contas, vai relatar o pedido do governo e colocá-lo para votação entre os demais colegas. Nardes não estará presente nessa fase. Há consenso no tribunal de que ele deve ser mantido na relatoria.
Decidido isso, Nardes entrará no plenário e somente então terá início a análise sobre o mérito das contas de 2014. O relator, então, lerá seu voto, antecipado na última sexta-feira pelo portal estadao.com.br, que pede a rejeição das contas – será a primeira vez, desde 1937, que um ministro do TCU pedirá a reprovação.
Em seguida, o procurador-geral do Ministério Público de Contas, Paulo Bugarin, também vai se manifestar. Em seu parecer, também liberado na sexta-feira, ele reforçou a sugestão pela reprovação das contas.
Adams tentará defender o governo em sustentação oral. Ele vai argumentar que manobras contábeis como as pedaladas fiscais não constituíram crimes de responsabilidade fiscal, como defende o TCU, e, ainda, que foram realizadas, ainda que em menor grau, por governos anteriores, como o de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Finalmente, o ministro vai defender que, pelo princípio da segurança jurídica, uma decisão do TCU só deve ter validade para o futuro e não para o passado.
As pedaladas fiscais foram reveladas pelo Estado em julho do ano passado. Elas consistem nos atrasos propositais do Tesouro Nacional no repasse de recursos aos bancos públicos, que foram forçados a usar dinheiro próprio para continuar pagando em dia programas sociais obrigatórios. O TCU entende que, ao fazer isso, os bancos públicos financiaram seu controlador, o governo federal, o que é proibido pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
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