A judicialização tentada pelo Palácio do Planalto não conseguirá evitar que o processo de impeachment da presidente Dilma confirme-se, e reforçe-se, como tema central da agenda do país – incluindo o embate entre a continuidade do mandato dela e a alternativa de novo governo – neste final de ano e ao longo dos primeiros meses de 2016.
Num contexto em que as crises política e de precaríssima governabilidade serão alimentadas pela piora dos indicadores econômicos e da gestão fiscal. De par com a explosão de seus efeitos sociais e os do esperado rebaixamento da nota de crédito do Brasil para o grau especulativo por mais uma, ou duas, das três agências internacionais de classificação de risco. Bem como pelos da divulgação em março dos dados do IBGE sobre um PIB de 2015 entre -3,5% e -4%. Simultaneamente à caminhada para mais um déficit primário, após a batalha pelo reequilíbrio das contas públicas perdida nestes dias, com a derrota para o núcleo petista do governo do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, antes de seu afastamento do cargo.
Tudo isso – junto com os desdobramentos da ruptura da Executiva do PMDB com a presidente Dilma, cujo empenho pela divisão do partido pode levá-lo a uma convenção extraordinária em janeiro – acontecendo sob os impactos de uma condicionante política de crescente peso: o avanço das investigações do petrolão e paralelas, envolvendo o Ministério Público, a partir do juiz Sérgio Moro, a Polícia e a Receita Federal e o STF (para os investigados com direito a foro privilegiado). Avanço este do qual cabe destacar os passos, recentes e próximos, que se seguem.
A confissão por José Carlos Bumlai de que o empréstimo de R$ 12 milhões que obteve em 2005 do Banco Schahin foi conseguido graças a intervenções do então chefe da Casa Civil, José Dirceu, e dos tesoureiros do PT, Delúbio Soares e João Vaccari Neto, e repassado em seguida ao partido. Confirmando delação premiada dos diretores do Banco, que vincularam a concessão do “empréstimo” a contrato, formalizado posteriormente, de R$ 1,6 bilhão de um navio-sonda da Petrobras. E reforçando dados do Ministério Público sobre o uso de tal repasse para que fossem abafadas investigações a respeito da morte do ex-prefeito Celso Daniel, de Santo André, e para cobertura de gastos da campanha presidencial de Lula em 2006. Outro passo a ser concretizado amanhã: o interrogatório pela Polícia Federal do próprio Lula sobre fortes indícios de negociata em torno de MPs – no governo dele e no de Dilma Rousseff – favoráveis a empresas da indústria automotiva, envolvendo também a aprovação do pagamento de R$ 2,5 milhões a um de seus filhos por uma das empresas na fase de viabilização das referidas MPs.
E mais um passo, ontem da Lava-Jato, com a fase Catilinárias, desencadeada através do procurador Rodrigo Janot e do ministro Teori Zavascki: buscas de provas incriminatórias, do envolvimento em atos de corrupção, em casas e escritórios do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, de ministros e ex-ministros do governo Dilma e de parlamentares ligados a caciques do PMDB – da ala até agora governista do presidente do Senado Renan Calheiros, mas também, alguns, próximos do presidente Michel Temer e com potencial de complicar a “virada” da legenda para afirmar-se como protagonista de alternativa de um novo governo.
Nos cenários, contrapostos, de pós-crise do impeachment, a continuidade da presidente Dilma aponta para um governo mais à esquerda do que em 2015 sob as restrições do ajuste fiscal. Isso em função de três fatores: a defesa do mandato assumida basicamente pelo PT e seus aliados esquerdistas; a ruptura da Executiva e das correntes centristas do PMDB; e a prevalência das prioridades do tutor Lula de apoiar-se numa “frente popular” para tentar reverter o esvaziamento do PT e a erosão de sua própria imagem, por meio de uma retomada de programas assistencialistas.
Enquanto o cenário da troca de governo, associado ao vice Michel Temer, foi configurando-se com base na forte rejeição social da presidente (reiterada e até ampliada em pesquisa do Ibope divulgada ontem à noite). Adensou-se com o crescente entendimento das camadas médias, e sobretudo do empresariado, da incapacidade e mesmo da impossibilidade de um governo petista dar respostas – conjunturais e menos ainda estruturais – para enfrentamento e ultrapassagem das crises econômica e fiscal, política e ética que sufocam o país, desdobrado em amplo apoio às propostas pró-mercado contidas na “ponte para o futuro”. E ganhou consistência política com o respaldo (à alternativa Temer) recebido da Executiva e das principais lideranças do PSDB, bem como dos demais partidos de oposição.
Cabe, porém, assinalar que a consolidação dela – ademais dos obstáculos de todo tipo que serão contrapostos pelo Palácio do Planalto e pelo lulopetismo – dependerá em grande medida da capacidade do comando do PMDB, especialmente do presidente, de distinguir-se da imagem do partido de principal parceiro dos governos petistas, do pós-mensalão até agora. Imagem que os desdobramentos da Lava-Jato estão evidenciando.
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Jarbas de Holanda. jornalista
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