Algumas questões se impõem: a quem interessa um ambiente de instabilidade institucional alimentada pelo conflito aberto entre os Poderes da República? A situação política, econômica e social em que o País se encontra já não é suficientemente grave? Há saída plausível para a crise que não seja a concentração das energias da sociedade brasileira na discussão e implantação de um amplo e ousado plano de recuperação nacional? A quem cabe, senão ao governo legalmente constituído, por meio da ação articulada dos Três Poderes, a responsabilidade de estimular e coordenar o debate e dar consequência prática a esse plano de recuperação? Agiu bem, portanto, o Supremo Tribunal Federal (STF) ao colocar o interesse nacional acima da imponderabilidade das paixões e, com coragem e bom senso, colocar em prática a convicção recentemente manifestada pela ministra Cármen Lúcia, presidente da Corte, de que “a missão da Justiça é pacificar”.
Inegavelmente, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) – beneficiado pela decisão do STF de mantê-lo na presidência do Senado – é um político cujos precedentes na vida pública custam-lhe o repúdio praticamente unânime dos brasileiros. É réu em uma ação no Supremo e investigado em outras onze. Mas as circunstâncias de um sistema político-partidário reconhecidamente em descompasso com os melhores padrões de representação popular colocam o senador alagoano na condição de peça-chave na discussão e aprovação das urgentíssimas medidas propostas pelo governo para debelar a crise que corta a produção, empregos e renda. É o mínimo que Renan Calheiros poderá fazer pelo País no exercício de um mandato de presidente do Senado que expira em menos de 60 dias. Depois disso, terá o senador alagoano que se haver, em outras circunstâncias, com os ministros do Supremo.
O governo que o País tem é o que está aí, com as imperfeições e fraquezas que são de conhecimento público, mas essas circunstâncias não justificam a tentativa irresponsável de desestabilizar o Executivo, de quem a Nação exige ação pronta e eficaz. Além disso, por detrás dessa tentativa se abrigam forças políticas que foram expelidas do poder exatamente por se terem revelado incompetentes para governar – e, pior que isso, jogaram o País nessa crise descomunal, da qual não querem que saia.
Pode-se discordar, no todo ou em parte, das medidas que o governo está propondo, como a emenda constitucional que estabelece teto para os gastos públicos ou o projeto de reforma da Previdência. Quem tiver ideias melhores que cumpra o dever patriótico de apresentá-las. O que não se pode é tentar imobilizar o governo, sabotando a tramitação parlamentar das medidas que propõe, para depois acusá-lo de inoperância.
A responsabilidade dos agentes públicos, nesses momentos conturbados, é manter-se a uma cautelosa distância do jogo das paixões políticas e do clamor das ruas. No caso do Supremo Tribunal Federal, os últimos acontecimentos demonstram que nem todos os seus ministros conseguem pautar-se por essa diretriz óbvia que se aplica, com particular rigor, à atividade judicante. Mas o plenário da Suprema Corte ousou trafegar na contramão dos humores populares e aprovou uma decisão conciliadora que permitirá que continue harmônico o entendimento entre os Poderes – condição essencial, repetimos, para que o País encontre as saídas da crise.
Aos desavisados, e também aos inconformados, cumpre lembrar que, mantendo Renan Calheiros na presidência do Senado por mais dois meses, a Suprema Corte não absolveu o senador alagoano dos malfeitos em que está envolvido. Apenas adiou para ocasião mais oportuna – em nome do bom direito e do interesse nacional – esse inevitável ajuste de contas. Ao fazê-lo, os ministros do Supremo Tribunal Federal pacificaram as crispadas relações entre o Legislativo e o Judiciário, impedindo que se agravasse um confronto que só interessa aos pescadores em águas turvas.
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