Vista de longe, a economia nacional vive momento contraditório. Nas últimas semanas, enquanto se divulgavam dados sobre uma recessão que talvez se mostre sem paralelos em nossa história, os preços dos ativos brasileiros caminhavam na direção oposta –ações subiram de preço, juros de longo prazo caíram e o real se valorizou.
O paradoxo tem explicação. A degradação das condições econômicas, combinada com as recentes revelações da Lava Jato, eleva a insatisfação popular com o governo Dilma Rousseff (PT); as chances de a presidente sofrer impeachment também aumentam nesse cenário.
Certa ou errada, predomina a visão de que eventual mudança no Planalto destravaria decisões e abriria caminho para uma agenda mínima de reformas. Daí por que a percepção de um desenlace da crise política impulsiona as cotações.
A alta na Bolsa chegou a 25% desde meados de fevereiro, a cotação do real se valorizou cerca de 10% e os juros reais (descontada a inflação) de longo prazo caíram para 6,5%, nível que vigorava pouco antes de o país perder o selo de bom pagador, em setembro.
Trata-se de movimento significativo, pois a situação permanece crítica. A queda do PIB desde meados de 2014, quando a recessão se iniciou, pode chegar a 8,7% até o final deste ano, completando 11 trimestres consecutivos de contração. Será o pior resultado da história, superando as retrações do início dos anos 1980 e do período Collor (1990-1992).
Outros fatores podem ser elencados para justificar o paradoxo. Por exemplo, o fato de a crise atual não decorrer de um quadro de insolvência em moeda estrangeira –ou seja, o país não tem dívida externa excessiva (Petrobras à parte) e conta com reservas internacionais de US$ 370 bilhões.
Ao contrário de quase todas as crises anteriores, o problema hoje é essencialmente doméstico. Explica-se pelo crescimento explosivo da dívida pública interna em moeda nacional, que deriva dos erros na gestão econômica e da incapacidade do governo Dilma de reequilibrar as contas. Em tese, retomar as rédeas da economia depende de decisões internas.
O que há hoje no Brasil é uma paralisia de decisões dos agentes econômicos, travando investimento e consumo. Sobra, por isso mesmo, capacidade ociosa –e crescer utilizando tal capacidade é mais fácil do que superar gargalos.
Os contornos de uma nova etapa ainda não estão claros, mas o comportamento dos mercados chama a atenção para algo importante. Num estado de depressão geral, mudanças nas expectativas têm poder maior que o usual para modificar a realidade econômica.
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