- O Globo
Michel Temer tem ouvido economistas atrás de receitas para enfrentar a crise. O que eles estão dizendo está em parte no seu programa Ponte para o Futuro. Escrever um programa é mais fácil do que executá-lo, principalmente se há ideias como: idade mínima para aposentadoria, fim da indexação do salário mínimo e da vinculação de receitas do Orçamento. Sem a aprovação de reformas, o otimismo seria breve.
O economista José Márcio Camargo, da Opus Gestão de Recursos, avalia que um novo governo Temer precisa começar com medidas que podem ser tomadas pelo próprio executivo, sem depender do Congresso. Uma delas, a mudança dos modelos de concessões para infraestrutura, que têm seguido um viés de modicidade tarifária. No governo Dilma, ganha o leilão a empresa que oferece o preço mais baixo ao consumidor, mas, na prática, a tarifa aumenta com os aditivos que são incorporados aos projetos. Um outro ponto que depende exclusivamente do Executivo é esquecer de vez a ideia de recriação da CPMF.
— É um péssimo imposto, com efeito cascata, além de ser altamente impopular. Se o governo precisa arrecadar mais, é melhor elevar a Cide, que pode ser feito pelo executivo. Além de punir o uso de combustíveis fósseis, vai estimular outros setores da economia, como de energias limpas — disse Camargo.
Ao mesmo tempo, o caminho para a recuperação passa pelo envio ao Congresso de medidas que comecem a combater de forma estrutural o rombo das contas públicas, principalmente na Previdência. No programa do PMDB, Ponte para o Futuro, está prevista a implementação de idade mínima para aposentadoria, de 65 anos para homens e 60 anos para mulheres. Outra medida importante, segundo Camargo, e que também consta no programa do partido, é uma profunda reforma no Orçamento, acabando com a indexa- ção e a vinculação de despesas, que impedem o Executivo e o Congresso de decidir, ano a ano, o que é prioritário. Hoje, o executivo tem controle sobre apenas 10% do Orçamento, enquanto 90% dos outros gastos são obrigatórios.
— A DRU (Desvinculação de Receitas de União) é apenas um jeitinho para driblar essa obrigatoriedade. Mas o que é preciso é apresentar uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) e conseguir dois terços dos votos do Congresso e mudar a lei — disse Camargo.
Todos os itens do programa só seriam aprovados com um esforço hercúleo de convencimento dos políticos. Para o economista Sérgio Vale, da MB Associados, a crise fiscal é a âncora para o crescimento do país. Por isso, a onda de otimismo com Temer, sem reformas, não seria duradoura se o novo governo não apresentar medidas que contenham a escalada da dívida pública.
— O mercado já antecipou a possível queda da Dilma. O dólar não vai cair muito mais, nem a bolsa subir muito, enquanto o país tiver projeções de déficit primário de R$ 100 bilhões. É claro que haverá um impacto forte na confiança, com reflexo em indicadores de atividade, o que também aconteceu com a queda do governo Collor. Mas ele vai precisar aproveitar este momento de euforia para apresentar reformas — disse Sérgio Vale.
Nesse ponto, os economistas apostam na habilidade política do vice-presidente em negociar com o Congresso e avaliam que é preciso urgência, com o encaminhamento de projetos nos 30 primeiros dias de governo. Um Ministério com nomes de peso, e que dê respaldo a muitas medidas que são impopulares, também é fundamental.
— Começar a limpar a bagunça na economia, recolocar de pé o tripé macroeconômico, já teria um efeito muito grande sobre a economia. Mas isso apenas não seria suficiente para superar a crise — disse Sérgio Vale.
Chama atenção a disparidade de projeções entre os cenários com Dilma e com Temer. Para o ano que vem, José Márcio Camargo projeta queda de 2% no PIB, no cenário Dilma, com inflação entre 8%e 9%, provocada por uma nova desvalorização do real. Já com Temer, a expectativa melhora um pouco, com crescimento entre o zero e 1%. Sérgio Vale estima uma queda de 3,1% no PIB no ano que vem, com a manutenção da presidente Dilma, e um crescimento de 0,6%, caso assuma o vice.
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