• Sem maioria no Congresso não há programa fiscal
- Valor Econômico
Antes de ter a equipe econômica montada e um programa de ajuste a cumprir, o vice-presidente Michel Temer está, com a ajuda do senador Romero Jucá, envolvido na construção de uma base de apoio para a eventual administração do PMDB. Sem sustentação política não haverá governo. E sem governo não haverá recuperação da economia. É a partir dessa compreensão, e de que foi a ausência de suporte do Congresso que inviabilizou o governo Dilma Rousseff, que o provável novo presidente da República está trabalhando.
Até o momento, asseguram fontes próximas ao vice, ele está conversando muito e já tem uma conclusão: "Não há falta de diagnóstico nem escassez de talentos", resumiu um interlocutor que esteve com Temer esta semana. Entre os diversos nomes que circulam como prováveis componentes de uma equipe econômica, ele ainda não fez escolhas.
Temer também já sabe que não poderá se comprometer com o reequilíbrio das contas públicas em um prazo curto. O estrago foi muito grande e isso demandaria um corte brutal do gasto do Orçamento, algo como mais uns R$ 100 bilhões sobre uma base já exígua de receitas e despesas crescentes.
A ideia, portanto, é fazer um programa de ajuste fiscal que resgate a capacidade do setor público produzir superávits, mas de forma gradual, e combinado com a retomada do crescimento que viria a partir do choque de confiança que a mudança de governo pode produzir. Ou seja, ao invés de prometer um equilíbrio para 2017, ele optaria por um ajuste mais prolongado que aponte superávit primário para 2019 ou 2020, por exemplo.
Se assumir a Presidência da República, Temer está disposto a reduzir os atuais 32 ministérios para cerca de 20 e diminuir substancialmente os cargos comissionados. Hoje são 35 mil e poderiam cair para 20 mil. Essa é uma medida que economiza pouco, mas tem um efeito simbólico importante na hora em que se exige mais sacrifícios da população.
As negociações para construção de uma base política estão sendo feitas sobre o resultado da votação de domingo, dia 17, na Câmara. Foram 367 votos a favor da admissibilidade do processo de impeachment de Dilma Rousseff, 137 contra, 7 abstenções e 2 ausências. Em tese, o provável governo Temer teria mais de dois terços (2/3) da Câmara, quórum necessário para aprovar propostas de emenda constitucional. Em tese, porque na vida real não é assim que funciona. Os compromissos se firmam com a participação dos partidos no governo.
Garantida uma maioria no Congresso, Temer vai definir quais propostas de reformas constitucionais têm impacto mais imediato nas finanças públicas e menos resistências políticas para dar partida ao seu governo. De uma série de 10 a 15 medidas de maior consenso no país hoje (exceto junto ao PT e partidos correlatos), a eventual nova administração escolherá três ou quatro. Poderá enviá-los ao mesmo tempo, ou em etapas, para aprovação parlamentar.
As propostas mais citadas são: a desvinculação das verbas orçamentárias, desindexação dos gastos sociais da variação do salário mínimo, reforma tributária, flexibilização do mercado de trabalho e reforma da Previdência Social, com o estabelecimento da idade mínima para aposentadoria.
É importante lembrar que esses são temas que os próprios ministros da Fazenda do governo Dilma têm levantado como necessários para restabelecer o equilíbrio das contas públicas. Assim como é parte da agenda da área econômica do atual governo passar um pente-fino nos programas como o Bolsa Família e o seguro-defeso, para que sejam destinados a quem efetivamente se enquadra nas suas premissas.
Hoje, 92% do Orçamento já segue carimbado (com receitas vinculadas a despesas específicas) para votação no Congresso. A desvinculação é necessária para dar alguma margem de manobra ao Executivo. A proposta é fazer uma Desvinculação de Receitas Orçamentárias (DRU) mais ampla do que a que tramita no Congresso, que libera cerca de 30% das verbas. Todos os benefícios sociais (abono salarial, seguro-desemprego, Loas) são corrigidos anualmente pela variação do salário mínimo. Desindexar esses programas não será tarefa muito fácil, mas é parte da agenda e tem impacto imediato na política fiscal. As demais alternativas têm sido largamente discutidas e enfrentam resistências conhecidas.
Se for assegurada uma maioria para aprovar o programa econômico centrado no saneamento das contas públicas, a escolha dos nomes que vão executar a política econômica torna-se mais simples. Pelo menos essa é a concepção do vice-presidente, segundo seus interlocutores.
Mesmo diante da lamentável situação da economia brasileira, há razões para acreditar que o ano de 2016 pode terminar bem melhor do que começou. A profunda recessão e o aumento do desemprego começam a afetar os prognósticos para a inflação deste e do próximo ano. O relatório Focus, do Banco Central, mostra que nas últimas quatro semanas a projeção de inflação dos que mais acertam (Top 5) para este ano caiu de 7,2% para 6,7%; e para 2017, recuou de 5,75% para 5,5%.
É bastante provável que os juros comecem a cair no meio do ano e, talvez, com maior intensidade do que se imagina hoje. Temer iniciaria seu governo, portanto, colhendo os frutos que Dilma plantou. Não se deve subestimar o potencial que o corte dos juros e um programa fiscal crível teriam sobre a confiança e, por consequência, sobre a decisão de investimentos dos empresários.
Está nas mãos das lideranças políticas o destino do país. Os economistas, em sua grande maioria, concordam com o diagnóstico e soluções. Quando for chamado a decidir como tirar o Brasil do atoleiro em que se encontra, será uma boa oportunidade para o Congresso Nacional mostrar que é melhor do que se revelou no dia 17. Naquele domingo, filhos, avós e tias foram homenageados a cada voto proferido. Na hora de votar as medidas fiscais, será bom os parlamentares se lembrarem dos seus eleitores.
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