Por Juliano Basile e Daniela Chiaretti – Valor Econômico
NOVA YORK e SÃO PAULO - A viagem da presidente Dilma Rousseff a Nova York para participar hoje da Assembleia da Organização das Nações Unidas (ONU) e denunciar o processo de impeachment que está sofrendo no Congresso deverá ter pouco impacto sobre os países membros e não deverá alterar a posição do governo dos Estados Unidos sobre o assunto.
A expectativa é a de que o Departamento de Estado americano permaneça distante das disputas políticas internas do Brasil e de que não adote posicionamentos contrários nem favoráveis ao impeachment. Essa posição foi adotada na segunda-feira, quando o porta-voz do Departamento de Estado, John Kirby, disse que o Brasil vive "um momento político desafiador", mas possui instituições "suficientemente maduras para endereçar os desafios do país".
A ONU também se manifestou de forma diplomática e apartidária sobre o impeachment através do secretário-geral, Ban Ki-moon, que pediu uma "solução harmoniosa" aos líderes brasileiros, se disse preocupado com a instabilidade política no país e pediu que o Judiciário fosse respeitado. "Acho que poucos países vão fugir muito desse roteiro", avaliou o professor da American University e pesquisador do Conselho de Relações Internacionais (CFR na sigla em inglês), Matthew Taylor.
O professor acredita que o governo americano vai evitar qualquer interferência sobre a situação política brasileira e o impeachment. "O governo dos Estados Unidos não deve se intrometer, já que sabe que qualquer sinal de favoritismo poderá acarretar impacto de longo prazo nas relações bilaterais", disse. "O governo americano demorou para apreender, mas ao longo das últimas duas décadas, a política externa americana tem procurado não dar a impressão de excessiva intervenção na autonomia dos sistemas políticos latino-americanos, especialmente nos países de grande porte", continuou o professor. Ele se declarou cético quanto ao impacto da viagem. "Se, de um lado, a imagem da presidente como líder global discursando em Nova York pode ajudá-la a mudar o foco das atenções dentro do Brasil, do outro lado, acho que um discurso qualificando o impeachment como golpe em nada ajudará a presidente no plano internacional e pode até repercutir mal na imprensa brasileira", justificou Taylor.
Após a Assembleia da ONU, a presidente deverá fazer uma ofensiva junto à imprensa americana, concedendo entrevistas para contestar o que qualifica como um "golpe". De maneira geral, os jornais dos Estados Unidos estão adotando uma postura crítica ao fato de o processo de impeachment ter sido conduzido pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que é réu no Supremo Tribunal Federal (STF) onde responde a duras acusações de envolvimento em episódios de corrupção na Petrobras e de outros parlamentares suspeitos terem votado contra Dilma. Por outro lado, a imprensa americana também publicou declarações de ministros do STF de que o processo de impeachment segue ditames da Constituição e ressaltou o fato de a Corte ter indicado um rito que está sendo seguido pelo Congresso.
O vice-presidente Michel Temer também iniciou uma ofensiva a jornais estrangeiros e concedeu entrevista ao "The Wall Street Journal" para dizer que "cada passo do impeachment está de acordo com a Constituição".
Dilma fará um discurso na Assembleia da ONU sobre mudanças climáticas em sessão que será iniciada às 9h30, horário de Brasília. Depois, participará da assinatura do acordo do clima, que foi acertado em Paris, em dezembro, e terá um almoço com chefes de Estado.
O acordo poderá ter a maior adesão de um tratado internacional na história das Nações Unidas. A ONU espera representantes de mais de 160 países e mais de 60 chefes de Estado e de governo na Assembleia.
O evento deverá marcar a última viagem internacional de Dilma como presidente, caso o impeachment seja confirmado pelo Senado. Dias antes da votação do processo na Câmara, a expectativa era a de que o Brasil seria representando pela ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, e que Dilma não iria a Nova York por causa da crise política em Brasília.
O acordo, que pretende colocar as economias mundiais na trilha do baixo carbono, só entra em vigor quando se tornar lei em 55 países que signifiquem 55% das emissões mundiais de gases-estufa. No caso brasileiro, tem que passar pelo Congresso.
Se por um lado o governo brasileiro se empenhou em atuar diplomaticamente para que o texto pudesse ser fechado em Paris, o acordo pode não se tornar prioritário na agenda do Legislativo, onde tem ocorrido duros embates em pautas ambientais. O Protocolo de Nagoya, criado em conferência internacional em 2010, no Japão, e que versa sobre o acesso a recursos genéticos e repartição de benefícios da biodiversidade, ainda não foi ratificado pelo Brasil por oposição da bancada ruralista.
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