O Programa de Regularização Tributária, que estabelece parcelamento de dívidas com o fisco, é um Refis concebido para acabar com novos Refis. O refinanciamento foi recriado - após seis outros desde 2000 - por pressão de parlamentares, apoiados, porém, no fato de que a crise econômica foi muito mais severa que todas as outras do passado republicano e encontrou as empresas e contribuintes altamente endividados. A equipe econômica desta vez fechou as brechas às malandragens que permitiam às empresas obter uma certidão negativa de débitos para deixar de pagar o restante das dívidas e se candidatar ao próximo programa de alívio tributário.
Como não é esse o jogo a que os partidos estavam acostumados pela simples repetição, quase ano após ano, de programas desse tipo, os congressistas consideraram as condições muito duras e já se preparam para desfigurar o PRT e devolver-lhe a fisionomia do Refis de sempre, a ser descumprido em seguida.
Os pontos principais do projeto estão na mira das emendas apresentadas - mais de 300. Um deles é que desta vez não há desconto de juros nem multas, "apenas" o parcelamento de débitos em prazos que variam, conforme o caso, de 7 a 12 anos. Há emendas que propõe descontos de 20% a 100% das punições.
Poderão ingressar no programa dívidas de natureza tributária ou não tributária vencidas até novembro de 2016, mesmo aquelas que já foram objeto de parcelamento. Ou seja, estão aptas a aderir ao PRT todas as empresas que, por motivos sérios ou não, deixaram de pagar seus débitos nas sucessivas versões de refinanciamento ao longo do tempo.
No que tem de essencial e moralizador, a MP 766, que define o programa, estabelece em seu artigo 3º, inciso III, a "vedação dos débitos que compõem o PRT em qualquer outra forma de parcelamento posterior". Quem entrar nesse refinanciamento não poderá entrar nos próximos - e a frequência dos Refis deu aos maus pagadores a certeza de que melhor que o programa em que ingressavam só o próximo.
O mau hábito de deixar de cumprir obrigações à espera de condições mais vantajosas de fazê-lo no futuro recebeu um incentivo extra de novos parcelamentos a que o governo federal (como os Estados) lançou mão para melhorar resultados fiscais com receitas não recorrentes, cada vez mais importantes quanto maior se tornava o aumento das despesas.
A melhoria das contas públicas, baseada na proposta de teto de gastos limitados à inflação, dependerá agora basicamente do aumento das receitas para trazer de volta os superávits fiscais. Gambiarras como a do Refis são contraproducentes, tanto pelo péssimo exemplo para os bons pagadores, como por seus efeitos fiscais, que são declinantes após o pico de abertura de refinanciamentos. O Refis original, de 2000, arrecadou R$ 189 milhões em 2015 e R$ 241 milhões em 2016, e tanto o Paes, de 2003 como o Paex, de 2006, exibem valores não muito superiores a eles, segundo dados da Receita. O parcelamento de 2009 teve um pico de R$ 21 bilhões em 2011, reduzidos a R$ 6 bilhões no ano passado. O de 2013 começou com R$ 21,7 bilhões de outubro a dezembro e despencou em seguida, para R$ 3,3 bilhões em 2016. O refinanciamento de 2014 começou com R$ 13 bilhões e arrecadou R$ 6,9 bilhões no exercício fiscal passado.
O PRT permite o parcelamento de multa de 10% do FGTS vencidas e o uso, com restrições, do estoque de créditos de prejuízo fiscal e outros créditos com a Receita, agora estendido a controladas. No Refis da crise era possível usar esses créditos para reduzir juros e multas da dívida, inclusive no âmbito da PGFN e não somente no da Receita. Ou seja, o PRT dá menos vantagens para quem levou a disputa tributária ao Judiciário. Os parlamentares querem mudar isso.
Dada a natureza distinta da crise atual, com forte componente de alavancagem privada, é defensável um programa de alívio da carga de quitação de tributos - os primeiros a cair fora da lista de compromissos financeiros de empresas com aperto de caixa. O PRT se cercou de cuidados básicos, que faltaram aos programas anteriores, para dar uma ajuda modesta quando as receitas estão em queda e a economia amarga uma recessão que completará três anos. Com ele, o governo sinaliza que não quer mais recorrer a esse expediente. O Congresso deveria aprovar os pontos essenciais e pôr um ponto final na lamentável e repetitiva história dos Refis.
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