- O Estado de S. Paulo
O jeito encontrado para aprovar reformas requer gastos adicionais com a classe política
Presidentes brasileiros pós-ditadura se sustentam no tripé apoio popular, apoio parlamentar e apoio empresarial. Quando um verga, os outros precisam estar firmes para o governante se sustentar. Se o segundo dobra, o terceiro não aguenta, e o governo cai. Dilma Rousseff e Fernando Collor perderam primeiro sua popularidade, depois, o Congresso e o empresariado – não necessariamente nessa ordem. Impopular, Michel Temer se sustenta nos dois últimos. O apoio dos deputados, porém, bambeia.
Ex-presidente da Câmara dos Deputados e bancado pelo maior partido do Congresso, Temer começou seu mandato com uma base parlamentar gigantesca. Nas primeiras 25 votações nominais da Câmara após ele substituir Dilma, o peemedebista obteve 93% de apoio e o voto de 402 deputados 90% das vezes ou mais. Nas 25 últimas votações nominais até antes da votação da reforma trabalhista, o apoio caiu para 67%, e o núcleo duro do governismo encolheu para 235 deputados.
A perda de 26 pontos porcentuais na taxa média de governismo é significativa porque confirma uma tendência de queda que se acentuou em 2017. Sua origem é a impopularidade crescente do governo e das medidas que ele se propõe a aprovar. Não é crítica para sua sustentação nem chega a ser incapacitante – por ora. O núcleo duro do governo ainda tem maioria relativa para aprovar, com maior ou menor dificuldade, mudanças infraconstitucionais e aplacar tentativas de impeachment contra o presidente.
O custo, todavia, é cada vez mais alto. Para virar apenas um voto na Câmara e conseguir aprovar o regime de urgência na reforma trabalhista, Temer cedeu a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas para um indicado do deputado Kaio Maniçoba (PMDB-PE) – segundo relato do repórter Igor Gadelha.
Cargos púbicos não são o único preço a pagar à base movediça no Congresso. O governo liberou mais verbas para executar emendas parlamentares ao orçamento e passou a destinar dinheiro de propaganda oficial a rádios e TVs indicadas por parlamentares.
O jeito encontrado para aprovar reformas que buscam economizar em serviços para a população requer gastos adicionais com a classe política. É o tipo de ação que pui a esgarçada imagem do governo, diminui sua popularidade, aumenta o preço cobrado pelo fisiologismo e assim se realimenta, em um ciclo de vícios e desgastes das instituições e, no limite, da democracia.
Nada disso é exceção dentro do modelo político-partidário no qual o Brasil vem tropeçando nas últimas décadas. Mas se torna um problema se o propósito autoinstituído pelo governo é reformar a Constituição. Para isso, Temer precisa de 308 votos, o apoio de três de cada cinco deputados. Ele não tem isso hoje.
Antes de a reforma trabalhista ir a voto, as últimas vezes que Temer obteve mais de 3/5 da Câmara foram em votações nas quais até o PT ajudou – sobre temas inodoros, como tramitação de recursos na Justiça. Antes disso, só na aprovação do novo regime fiscal (o teto de gastos públicos), em 25 de outubro de 2016.
Desde então, a base governista só sofreu defecções. Perdeu quase todo o PDT, a maioria do PSB e, por omissão, fatias expressivas do próprio PMDB, do PR, do PSD, do PTB e do SD, entre outros.
A falta de entusiasmo dos deputados com uma agenda que é mais do PSDB e do DEM do que de quaisquer outros partidos é compreensível: ela encarece o custo para se reelegerem e ameaça suas ambições para outros cargos que dependem de voto.
Como consequência, para chegar aos 308 votos e aprovar a reforma da Previdência, o governo cede ao limite de torná-la inócua a olhos empresariais. Se virar um desgaste sem contrapartida será um chute nos dois pés que ainda o sustentam.
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