quinta-feira, 27 de abril de 2017

Senado aprova fim do foro privilegiado

Senadores reagiram à possibilidade de o STF mudar o benefício; texto sobre abuso de autoridade é amenizado após pressão

Em reação à possibilidade de o STF restringir o benefício de políticos em votação marcada para maio, o Senado aprovou em primeiro turno, por 75 votos a zero, o fim do foro especial para todas as autoridades públicas, inclusive as do Judiciário. Apenas os presidentes dos três poderes manterão o foro no STF. Sob pressão da opinião pública, o Senado amenizou e também aprovou, por 54 votos a 19, o projeto que trata do crime de abuso de autoridade. O juiz Sergio Moro, que criticara a proposta do relator, elogiou o resultado final. O projeto ainda terá de passar pela Câmara.

Foro mais perto do fim

Senado aprova em 1º turno proposta que acaba com privilégio para 35 mil autoridades

Maria Lima e Catarina Alencastro | O Globo

-BRASÍLIA- Por 75 votos a zero o Senado se antecipou ao Supremo Tribunal Federal (STF) e aprovou ontem, em rito sumário, o primeiro turno da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que acaba com o foro privilegiado para cerca de 35 mil autoridades no país. O projeto de autoria do senador Álvaro Dias (PV-PR), que dormia nas gavetas do Senado desde 2013, foi colocado subitamente na pauta da Comissão de Constituição e Justiça e, por decisão do presidente da Casa, Eunício Oliveira (PMDB-CE), acabou tendo sua primeira votação em plenário ontem mesmo.

A pressa em torno do projeto que até pouco tempo desagradava os parlamentares, que perdem o privilégio de responder a processos no STF, deve-se a uma pressão externa. Após a divulgação das delações de executivos da Odebrecht envolvendo mais de uma centena de autoridades, a presidente do STF, Cármen Lúcia, marcou para maio a votação de uma proposta do ministro Luís Roberto Barroso que acabaria com o foro privilegiado para crimes comuns de políticos em diversos casos. Os senadores decidiram então se antecipar e acabar com o foro para todas as demais autoridades também.

RISCO DE EMENDAS QUE DESFIGURAM PROJETO
Hoje, não apenas parlamentares, mas também ministros, juízes, governadores, prefeitos, procuradores, promotores e outras autoridades têm direito de serem julgados em instâncias privilegiadas. Pelo relatório aprovado ontem, só será mantido o foro para os presidentes da República, da Câmara, do Senado e do Supremo.

No substitutivo, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) rejeitou todas as emendas que propunham a criação de uma vara especial para julgar parlamentares, governadores ou ministros. Também rejeitou a emenda que vinculava a aceitação da abertura de processos para parlamentares, mira nistros e outras autoridades ao crivo do STF.

— Acho que o que mais pesou para a votação da PEC hoje foi o Supremo Tribunal Federal anunciar que irá decidir sobre quem manterá foro. Isso foi uma espada de Dâmocles (referência da mitologia grega a personagem que foi servido em banquete como rei com uma espada pendurada sobre sua cabeça, com apenas um fio de rabo de cavalo) — disse Randolfe.

O coordenador da Lava-Jato, procurador Deltan Dallagnol, comemorou:

— Esse passo na direção do fim do foro é uma feliz notícia.

A avaliação reservada entre os líderes da Casa é que, ao votar o relatório do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) com uma tramitação relâmpago, sem nenhum orador na última sessão, surpreendendo até mesmo o relator, o Senado fez uma “revanche” ao Ministério Público e à magistratura, acabando com o foro para todos, já que foram obrigados a desidratar o projeto de abuso de autoridades para atendê-los.

Na presidência da Mesa, o senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), ao final da aprovação do fim do foro, logo após a aprovação do projeto de abuso de autoridade, disse que o dia de ontem marcaria a história do Senado.

— O dia de hoje marca um grande avanço institucional. Com a aprovação do projeto de abuso de autoridade acabamos com uma excrescência, o fim da carteirada, das prisões injustas, dos maus tratos nas delegacias e com os vazamentos. E a aprovação desses dois projetos não foi a toque de caixa, foram exaustivamente discutidos. Presidir essa sessão história foi uma honra para mim — discursou Eunício.

O relator, Randolfe Rodrigues, e autor da PEC, Álvaro Dias, comemoraram a aprovação.
— Foi um pequeno passo para esse país se tornar uma República. Agora temos que conseguir derrubar as emendas que desfiguram a PEC e aprovar o segundo turno no Senado antes de ir paa Câmara. Vamos nos armar para a segunda batalha — disse Randolfe.

Por se tratar de uma proposta de emenda constitucional, o texto precisará passar por nova votação no Senado e por mais duas na Câmara antes de ser promulgada. O segundo turno da PEC do fim do foro acontecerá após a realização de três sessões de discussão no plenário, com possibilidade de apresentação de emendas.

POR ORA, CÂMARA NÃO TEM PRESSA PARA VOTAÇÃO 
Apesar de ter sido aprovada por unanimidade, gerando desconfiança sobre os 75 a zero cravados, alguns senadores da oposição criticaram duramente a PEC que acabaram de votar pela aprovação.

— Havia aqui no Senado o sentimento de que o STF ia acabar o foro para ministros e parlamentares, aí decidiram acabar para todo mundo. Mas você já imaginou se isso vingar? Um juiz de primeira instância vai poder prender ministro e governador. Parlamentar não, porque o Congresso tem que autorizar, mas ministro pode. Tem juiz aí prendendo em fase de instrução de inquérito — comentou um senador da oposição logo após a votação.

Líderes na Câmara disseram ao GLOBO que em tese são favoráveis ao fim do foro privilegiado, mas que a prioridade na Câmara é a aprovação das reformas. Lembram que a proposta precisa passar pela Comissão de Constituição de Justiça e depois por uma comissão especial, antes de ir a plenário. Na comissão especial, a pressa vai depender de um acerto político. O líder do DEM na Câmara, deputado Efraim Filho (PB), disse que será o relator da PEC na CCJ, porque já relator de outras PECs sobre o tema na comissão.

— Serei o relator da questão do foro na CCJ. Mas depois há uma tramitação em comissão especial, que pode levar 180 dias. Temos que analisar. Mas a Câmara não pode pecar por inércia ou omissão — disse Efraim Filho. (Colaborou Cristiane Jungblut)

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