A vitória sobre a candidata da extrema-direita, Marine Le Pen, foi folgada, mas nem por isso Emmanuel Macron tem uma tarefa fácil pela frente. Diante de uma abstenção recorde, ele pediu apoio aos franceses para garantir maioria nas eleições legislativas de junho, sem as quais não poderá tocar medidas como a reforma trabalhista, e prometeu proteger a República face ao extremismo.
De olho nas legislativas
Com vitória folgada sobre Le Pen, Macron tem o desafio de obter maioria no Parlamento
Fernando Eichenberg | O Globo
PARIS - A França dissipou o temor de um governo de extrema-direita nacionalista e antieuropeu, e elegeu como seu presidente pelos próximos cinco anos o centrista Emmanuel Macron, do movimento Em Marcha!. O ex-ministro da Economia de François Hollande, próEuropa e defensor da abertura econômica bateu a rival extremista Marine Le Pen, da Frente Nacional (FN), por 66,06% a 33,94%. Aos 39 anos, Macron se torna o presidente mais jovem da História republicana do país, e terá como primeiro desafio obter maioria parlamentar na Assembleia Nacional, nas eleições de junho, para ter condições de aplicar as principais medidas de seu mandato, principalmente a reforma trabalhista.
A nomeação de seu primeiro-ministro e a composição do ministério darão as primeiras indicações dos rumos do novo governo, liderado por um presidente que, há menos de um ano, poucos acreditavam que poderia conquistar o Palácio do Eliseu nesta eleição.
O resultado do pleito francês é considerado um refluxo de recentes tendências eleitorais ilustradas pela vitória de Donald Trump, nos EUA, e a saída do Reino Unido da União Europeia. Macron escolheu um local emblemático de Paris para celebrar a vitória junto a seus eleitores: a esplanada do Museu do Louvre, originalmente construído como o palácio do rei, e sua pirâmide de vidro, inaugurada sob a Presidência do socialista François Mitterrand. O candidato centrista saiu vitorioso mesmo após o ataque de hackers à sua campanha às vésperas do segundo turno das eleições, ontem.
— A tarefa que nos espera é imensa, e ela começará a partir de amanhã (hoje). Ela impõe moralizar a vida pública, defender nossa vitalidade democrática, reforçar nossa economia, construir as novas proteções deste mundo que nos envolve, dar um lugar a cada um, refundar nossa Europa e assegurar a segurança de todos os franceses — disse em seu discurso, sob o tema de Ode à Alegria, último movimento da Nona Sinfonia de Beethoven, que é também o hino europeu.
O pleito legislativo será fundamental para o futuro do novo governo. O presidente eleito manifestou a intenção de implementar até o final do ano uma reforma constitucional para estabelecer eleições baseadas no sistema proporcional no país e reduzir em um terço o número de deputados na Assembleia Nacional. Suas anunciadas reformas do código do trabalho, do seguro-desemprego, do sistema de saúde e da aposentadoria também dependerão, em grande parte, de sua margem de manobra no Parlamento. Macron apelou, ontem, para que os franceses lhe deem nas legislativas os instrumentos necessários para governar:
— Nossa tarefa é imensa, e imporá construir uma maioria (parlamentar) forte. Esta maioria da mudança é aquela que espero de vocês em seis semanas, pois ainda preciso de vocês.
O presidente eleito não terá um estado de graça no início de seu governo. Sua confortável vitória registrou, por outro lado, taxa recorde de abstenção — entre 25,3% e 27%, podendo ser a maior desde 1969 — e de votos nulos e brancos — em torno de 12%, índice superior aos 5,82% do pleito de 2012. Além disso, segundo a pesquisa Ipsos/ Sopra Steria, divulgada ontem à noite, 61% dos franceses afirmaram não desejar que o líder do Em Marcha! possua uma maioria parlamentar, e 43% disseram ter votado para manifestar sua oposição a Le Pen. Os números sugerem que o novo presidente pode ter dificuldade de conquistar apoio popular para aprovar as suas pautas. Macron também se dirigiu a estes eleitores:
— Quero também dizer aos franceses que votaram em mim sem compartilhar das nossas ideias, que votaram simplesmente para defender a República face ao extremismo: conheço nossas discordâncias, eu as respeitarei, mas permanecerei fiel a este engajamento assumido, eu protegerei a República.
LÍDER REFORÇARÁ DISCURSO PRÓ-EUROPA
Como o mandato de François Hollande se encerra à meia-noite do dia 14 próximo, a posse do novo presidente ocorrerá antes desta data. Duas viagens já estão programadas. Para reforçar seu discurso por uma Europa forte e a importância da aliança franco-alemã, viajará a Berlim onde se encontrará com a chanceler Angela Merkel. E para afirmar sua posição de chefe das Forças Armadas e sua preocupação com a segurança dos franceses face ao terrorismo, fará uma visita às tropas nacionais em operação no exterior.
Foi a primeira eleição presidencial disputada no país sob o estado de emergência e com forte mobilização policial. Hoje, 8 de maio, comemoração da capitulação alemã na Segunda Guerra, o presidente eleito estará ao lado de Hollande na tradicional cerimônia junto ao túmulo do soldado desconhecido, sob o Arco do Triunfo. Macron assume o risco de que um fracasso de seus cinco anos de mandato faça crescer as chances de uma vitória da extrema-direita no país no pleito de 2022.
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