Mesmo com sua aversão pelo multilateralismo, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, encontrou aliados poderosos, como a União Europeia e o Japão, para tentar fazer uma barreira contra um adversário cada vez mais poderoso na arena global - a China. No plano diplomático, a aproximação ocorreu em reuniões paralelas na cúpula da Organização Mundial do Comércio em Buenos Aires, com uma declaração conjunta que pode resultar em ações em futuro próximo. Isoladamente, Trump, ao anunciar na segunda-feira sua estratégia para a segurança nacional, classificou a China de "competidor estratégico", que "dá forma a um mundo antitético aos valores e interesses dos EUA".
Ao atingir o posto de segunda maior economia do mundo, reforçar seu poderio militar e espalhar sua influência por todos os continentes, a China enfrentará agora mais dificuldades do que antes para avançar. Como ator global, tornou-se grande demais para que suas políticas não incomodem outras potências, em primeiro lugar no plano comercial, no qual a ameaça de uma guerra comercial, berrada por Washington, encontrou algum eco na Europa e Japão.
A percepção da evolução chinesa do populista Trump parece ter sido parcialmente aceita por parceiros do outro lado do Atlântico e em Tóquio. O presidente americano apontou que a esperada convergência gradual da China aos valores da democracia e do livre mercado, que justificava uma cooperação sem maiores críticas públicas, não se realizou nem deve ocorrer.
Com isso o que era evidente, mas convenientemente deixado de lado, tornou-se motivo de reclamações em tom crescente. EUA e União Europeia não reconhecem a China como uma economia de mercado - ela de fato não é - e os europeus, com base nessa concordância, tentam amainar as posições radicais de Washington e convencer os americanos de que a OMC é no mínimo uma arena conveniente para levar a cabo contendas comerciais com os chineses.
A declaração de Buenos Aires, por exemplo, criticou com atraso a transferência forçada de propriedade intelectual das empresas estrangeiras que operam na China e vários tipos de subsídios ilegais pelos quais as mercadorias chinesas ganham desleal vantagem competitiva.
Já Trump associou comércio e domínio político, dupla antiga no ideário do velho imperialismo americano, algo que Pequim agora também põe em prática com desenvoltura. A estratégia americana aponta um mal-estar com a tentativa chinesa de "colocar a América Latina em sua órbita", comprando os países do continente "com dívidas que não são sustentáveis". Além disso, a China estaria tentando conquistar posições importantes no mercado europeu, cobiçando indústrias chaves, tecnologia sensível e infraestrutura. Na visão do governo americano, a China em primeiro plano, e a Rússia depois, "desafiam o poder, influência e interesses dos EUA, tentando erodir a segurança e a prosperidade americana".
Europa e EUA sabem do que estão falando, porque ao contrário de sua atitude em relação à então União Soviética, durante a Guerra Fria, colaboraram economicamente - e lucraram bastante - construindo a economia de um país que agora indica que está prestes a não precisar mais deles. O ambiente de negócios na fechada China, após delinear planos de colocar-se como potência tecnológica em 2025, piorou para as empresas ocidentais. Segundo a OCDE, entre 62 países estudados a China é o quarto com mais restrições ao investimento externo.
O excesso de capacidade de produção de aço da China é o alvo mais visível de uma ofensiva conjunta de UE e americanos, que não se limitará a esse produto. Os EUA pretendem usar arsenal protecionista contra o déficit comercial com os chineses, enquanto que no âmbito político os serviços de inteligência da Alemanha e Nova Zelândia detectaram as tentativas mais claras de chineses influírem na condução da política e dos negócios na Austrália, por exemplo.
Admitida como um gigante no cenário global, a China, com, sua ditadura, procura atrair para seu lado os aliados e negócios que puder, sem abrir mão de seu sistema. A reação contrária por parte dos blocos rivais tende a ser agora mais contundente e menos diplomática.
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