- Folha de S. Paulo
No serviço público há focos de resistência à transparente objetividade da moeda
Um dos momentos decisivos da história é o da criação do dinheiro. Partindo de miçangas e metais coloridos, desenvolvemos uma realidade imaginária, abstrata, que funciona como meio de troca universal, com o qual todos os membros de uma sociedade podem intercambiar as coisas que produzem e os serviços que prestam por aqueles de que têm necessidade.
Nos tempos do escambo, um fabricante de tachinhas que desejasse um filé-mignon precisaria encontrar um açougueiro que estivesse em busca de tachinhas naquele momento. Ou seja, teria grande chance de morrer de fome, o que teria nos condenado a um mundo sem tachinhas e outras inovações relevantes, mas não indispensáveis.
Mais do que isso, a moeda, por ter expressão numérica objetiva, permite que informações importantes encapsuladas em preços e salários sejam comparáveis e circulem de forma relativamente transparente. Se o preço do tomate sobe, eu me livro dos meus depreciados pés de jiló e passo a plantar tomateiros. Se o salário de juiz fica atraente, convenço meu filho a prestar vestibular para direito.
Assim, não surpreende que o dinheiro tenha sido adotado quase universalmente. No serviço público, porém, encontramos focos de resistência à transparente objetividade da moeda. Eles assumem a forma de mordomias, auxílios e outros penduricalhos, que escondem vantagens que deveriam estar claramente expressas no salário pago às autoridades. Adquirem, assim, um caráter bem antirrepublicano.
O ideal seria acabar com o máximo possível dessas mamatas, incluindo verbas de gabinete parlamentares e auxílios-moradia judiciais, e computar todos os benefícios como salário, sujeito ao teto e ao fisco. Fazê-lo nem é tão exótico assim. Basta lembrar que, nos EUA, tirando banquetes oficiais, o presidente paga do próprio bolso por todas as refeições que faz na Casa Branca.
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