- O Globo
Refugiados no túnel do tempo, partidos e candidatos dissimulam a incapacidade de entender o eleitorado, que enxerga um confronto entre o Estado e os cidadãos
Três partidos foram ao Supremo Tribunal Federal pedir música na campanha eleitoral. “Não é apenas entretenimento” — argumentam PT, PSOL e PSB na ação (ADI 5970) —, “mas um legítimo e importante instrumento para manifestações de teor político”.
Desejam voltar à era dos showmícios, quando candidatos atraíam o público às praças com a magia musical e, nos intervalos, vendiam alegres utopias, logo desmentidas pela realidade. Quem mais abusou do artifício foi Fernando Collor, na campanha em que derrotou Lula 29 anos atrás.
Na essência, esse bloco partidário que se autodenomina de esquerda protocolou no
_ Supremo uma confissão de impotência para renovar para se candidatar à Presidência da República seu projeto, lideranças, meios de se comunicar (Campos morreu num acidente aéreo). e a própria mensagem. Na oposição está Marília, 34 anos, neta de Arraes.
O refúgio no túnel do tempo ajuda a dissimular a Vereadora no Recife, rompeu com os primos do incapacidade de entender as ansiedades do eleitorado, PSB e migrou com o sobrenome para o PT. É candidata que não vê uma cisão entre “trabalhadores” e ao governo contra a vontade da burocracia petista, “burguesia”, mas enxerga com nitidez um confronto que deseja sua renúncia. Motivo: uma aliança entre Estado e cidadãos, entre a sociedade e seus com o PSB aumentaria em 51% o tempo de propaganda governantes — como demonstram pesquisas do PT eleitoral do PT (de 171 para 258 minutos). na periferia de São Paulo. Paulo e Marília também cultuam Lula, pernambucano
Em Pernambuco tem-se outro exemplo dessa do agreste, há mais de cem dias fuga nostálgica. Partidos e candidatos se transformaram cumprindo pena em Curitiba por corrupção e em reféns de dois personagens — um lavagem de dinheiro. Ao ritual juntou-se um terceiro mito e um encarcerado. candidato a governador, Armando Monteiro
Morto há 13 anos, o ex-governador Miguel Arraes paira sobre a cena estadual em que se tornou mítico, depois de dominá-la por mais de cinco décadas. Dois dos três candidatos ao governo estadual disputam sua memória nessa eleição.
De um lado está Paulo Câmara, governador em busca da reeleição pelo PSB. Burocrata do Tribunal de Contas, foi ungido por Eduardo Campos, neto de Arraes, quando deixou o governo em 2014 (PTB), cuja origem remonta às usinas de açúcar e ao sistema financeiro.
À sombra do mito e do cárcere criou-se um impasse entre o PSB dos Arraes e o PT de Lula. Derivou na imobilização de quatro partidos (PCdoB, PDT, Pros e Rede). No fim de semana, o PT adiou suas convenções no Amazonas, Amapá, Maranhão, Minas Gerais, Paraíba, Tocantins e Rondônia.
Outros candidatos também preferem o gueto da ilusão e da saudade. Jair Bolsonaro (PSL) transformou sua campanha presidencial em homenagem à tortura e à matança dos adversários, na efusão de sangue patrocinada pela ditadura militar. É o mesmo regime que o julgou por traição à farda, acusando-o como autor de um plano para explodir quartéis no Rio dos anos 80.
Embriagados de nostalgia, eles se abstraem do debate de alternativas reais às agruras do presente compartilhado por 175 milhões de dependentes da combalida rede pública de saúde, e por 13,5 milhões de desempregados que perambulam no inverno das maiores cidades.
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