Cabos eleitorais do ex-prefeito do Rio entregam panfletos com apoio de petistas em Maricá
Sérgio Rangel | Folha de S. Paulo
RIO DE JANEIRO - O ex-prefeito Eduardo Paes (DEM) está pedindo voto para o petista Fernando Haddad em Maricá, cidade citada numa das maiores gafes políticas da sua carreira.
Na tarde de quarta (26), na reta final do primeiro turno, cabos eleitorais de Paes entregavam panfletos da aliança inusitada.
O folheto de quatro páginas estampava o rosto do ex-prefeito carioca na capa e a frase: “No meu governo, Maricá terá a atenção que merece”.
Em 2016, o líder nas pesquisas de intenção de voto no Rio desagradou os moradores de lá ao classificar o município como "uma merda de lugar" em conversa telefônica com o ex-presidente Lula, gravada com autorização judicial.
No panfleto, com tiragem de 100 mil exemplares, o carioca aparece também junto com os petistas Lindberg Farias, que tenta reeleição ao Senado, e Washington Quaquá.
Candidato a uma vaga na Câmara dos Deputados, Quaquá foi prefeito da cidade e presidente do PT fluminense. Desde que a conversa com Lula se tornou pública, os moradores da cidade, de cerca de 100 mil eleitores, não escondem o ressentimento com o político.
Distante 60 km do Rio, Maricá é um conhecido reduto petista no Rio. Em 2014, Dilma Rousseff venceu lá com 58,28% dos votos, 6,64% a mais que no restante do país.
Os panfletos têm registrado o CNPJ da campanha de Paes e também de uma gráfica que já recebeu R$ 900 mil do candidato nessa eleição.
Questionada sobre o apoio do ex-prefeito a Haddad, a assessoria de imprensa do candidato disse que “existem pessoas dos mais variados partidos e candidaturas presidenciais apoiando” Paes e informou “que vários cabos eleitorais têm distintas opções de candidatos e quando solicitam material o fazem de maneira variada”.
A assessoria encaminhou folhetos com o apoio de Paes a Geraldo Alckmin (PSDB), Jair Bolsonaro (PSL) e Henrique Meirelles (MDB).
Apesar de ter aliados fortes no município, como Quaquá e 11 dos 18 vereadores do município, Paes não consegue empolgar os eleitores da cidade.
“Ele não vai ter vida fácil aqui. Me senti humilhado quando ouvi aquela conversa dele com o Lula. O Eduardo tá tentando se desculpar, mas ele não tem coragem de pedir voto aqui na avenida. Se eu ver, eu jogo um maxixe, que é bem espinhoso”, disse o feirante Emir Aquino, 55, que trabalha numa barraca no centro da cidade.
Baiano de nascimento e morador do município há mais de 30 anos, Aquino diz que votará em qualquer candidato que tiver chance de derrotar o ex-prefeito carioca.
Pela última pesquisa do Datafolha, divulgada no dia 28, Romário (Podemos), 14%, e Anthony Garotinho (PRP), 15%, estão empatados tecnicamente em segundo lugar. Paes lidera, com 25% das intenções de voto.
Na conversa gravada com Lula, divulgada pela Polícia Federal em 2016, o candidato do DEM dizia que
Lula tinha "alma de pobre" por supostamente ter um sítio em Atibaia (SP). Ele também comparou a cidade paulista a Maricá, segundo Paes, uma "merda de lugar".
Paes pediu desculpas aos moradores da cidade logo após a divulgação da gravação . Nesta campanha, ele já visitou o município duas vezes, mas em eventos fechados. O ex-prefeito chegou até compor uma samba exaltando a cidade em parceria com Marquinhos de Oswaldo Cruz.
“Foi muita falta de educação. Na minha casa, ninguém vota nele. Ele vai ter que fazer muita coisa por aqui para mudar a nossa cabeça”, disse Marcus Daniel, 29, que trabalha entregando panfletos de uma clínica dentária pela cidade. Desempregado há quase dois anos, ele aceitou em maio ganhar R$ 180 por semana para “tentar ajudar em casa”.
A situação de Daniel não é muito diferente da realidade dos moradores de Maricá. De acordo com o IBGE, o salário médio mensal da população local era de 2 salários mínimos em 2016, sendo que 33,8% dos domicílios da cidade com rendimentos mensais registravam até meio salário mínimo por pessoa.
A cidade também sofre com a violência. Em março, um crime chocou os moradores de lá, quando cinco jovens foram assassinados dentro de um condomínio. Segundo a polícia, nenhum tinha envolvimento com o crime. Milicianos e traficantes travam uma disputa pela venda de drogas no município.
No folheto, Paes promete colocar em funcionamento o hospital municipal Che Guevara e criar um Batalhão da Polícia Militar na cidade da região dos lagos.
Apesar dos indicadores sociais não serem os melhores, o município é um dos maiores beneficiados com a produção de petróleo no campo de Lula, no pré-sal, o maior do país.
Até agosto, a cidade recebeu neste ano cerca de R$ 900 milhões, sendo R$ 310 milhões de royalties e R$ 610 milhões em participações especiais.
Mesmo sem poder para definir a eleição por causa da população pequena, Maricá ganhou atenção na disputa eleitoral por causa do diálogo de Paes com Lula.
Romário escolheu da cidade o seu vice, o deputado Marcelo Delaroli, ex-policial militar e deputado federal pelo PR.
O lançamento da parceria foi feita no melhor estilo adotado nos gramados pelo senador, cheio de provocações. O ex-jogador da seleção vestiu uma camisa com a frase: “Eu amo Maricá”.
Paes também tem apoiadores por lá. O aposentado Colatino Anacleto, 93, vai dar uma “segunda chance” ao ex-prefeito do Rio. Ele foi o único a defender o carioca durante o horário do almoço num bar na principal praça da cidade.
“Eu estou com ele. Aliás, quem não erra nessa vida?”, argumentou Anacleto, que gosta de ser chamado de “dinossauro do samba”, ao abrir a terceira cerveja do dia na companhia de dois amigos.
De chapéu, bermuda e camisa da Mangueira, ele elogiou “a capacidade administrativa” do candidato do DEM.
“Poderia nem votar mais. Foi uma frase infeliz. Vejo isso como um homem que brigou com a mulher. Depois do pedido de desculpa, o amor fica até melhor. Entendo disso. Sou bem casado há 63 anos. Acredito que ele vai fazer a cidade crescer nos próximos anos como um pedido de desculpa”, disse Anacleto, compositor de marchinhas de seis blocos da cidade.
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