Por Leila Souza Lima | Valor Econômico
SÃO PAULO - Ex-presidente do Banco Central e sócio fundador da Gávea Investimentos, o economista Arminio Fraga disse nesta quarta-feira (15) que não há como o Brasil escapar de entrar em nova e profunda recessão. “Vamos ter uma recessão profunda, infelizmente. Contas preliminares que tenho feito com colegas sugerem que o PIB pode cair 6%, até 8% este ano. Isso é recorde, não há registro histórico de uma queda tão grande. A única esperança é que, na medida em que a saúde volte, a recuperação ocorra num espaço não muito longo de tempo”, afirmou.
Para Arminio, é impossível uma recuperação em “V”, na qual a retomada é tão rápida quanto a queda, pois o país vai conviver com muita incerteza durante bom tempo, o que deprime demanda e investimentos. Tal perspectiva exigirá que o governo gaste muito para manter de pé, principalmente, os segmentos mais vulneráveis, micro e pequenos empresários, além de trabalhadores informais, analisou o economista. São medidas importantes para se ver alguma luz ao fim do túnel quando a crise pandêmica começar a se suavizar.
As afirmações foram feitas por Arminio enquanto participava de live agora à noite – como representante do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (Ieps), presidido por ele – sobre a pandemia do novo coronavírus.
Na visão do economista, as incertezas científicas quanto ao novo agente infeccioso, por exemplo em torno da imunização, indicam que a pandemia vai durar muito tempo no Brasil. “As chances de acontecerem outras ondas são muito grandes. Esse vírus infelizmente é muito eficiente, se espalha rapidamente.”
Para o ex-presidente do Banco Central, o quadro é bastante preocupante tanto do ponto de vista da saúde, quanto da economia. “Há uma probabilidade alta de que tudo isso só acabe quando houver vacina e tratamento. E a expectativa otimista é que só comece a ser distribuída [a vacina] daqui a um ano.”
Ele reforçou a importância das medidas de isolamento social, higiene, esforço de equipar o sistema de saúde e testar a população como meios eficientes para conter o avanço da pandemia. Mas citou a vulnerabilidade da população brasileira e o grande percentual de pessoas com doenças crônicas como obstáculos.
Ponderou ainda que não há como pensar em crise de saúde e economia de forma isolada. “Não vejo milagre em nenhuma das direções. As duas [soluções] vão ter que chegar juntas. Não existe isso, de sacrificar vidas para salvar economias”, pontuou Arminio, destacando que falta ainda uma estratégia organizada por parte do governo que faça com que as pessoas se sintam mais confiantes no futuro.
O presidente do Ieps ressaltou que a pandemia chega ao Brasil num momento de profunda fragilidade socioeconômica, com um pano de fundo diferente da situação de outros países, e em paralelo ao aprofundamento das crises financeiras dos Estados. “O Brasil, em 2014 e 2015, mergulhou numa profunda recessão e nunca se recuperou para valer. Não é uma situação normal de ciclo econômico”, disse.
“Eu, com minha cabeça de economista, passei a pensar em achatamento [da curva de transmissão pandêmica] não só como estratégia para evitar mortes de pessoas que fiquem sem acesso aos tratamentos, mas também para ganharmos tempo.”
Ao avaliar as medidas fiscais e de socorro econômico que vêm sendo tomadas pelo governo, o economista ponderou que as contas terão que ser refeitas ao longo do tempo. “Os programas que estão sendo colocados em prática na minha leitura são bons. Usar o Bolsa Família e o Cadastro Único para fazer o dinheiro chegar na ponta é crucial.
Sendo bem feito, rapidamente vai atingir 70 milhões de pessoas, e com algum esforço para cadastrar mais gente, pode chegar a 100 milhões, o que é quase a metade da população. Mas tenho dúvida sobre se o que já foi proposto é suficiente, acho que não.”
Segundo ele, o governo terá que usar seu balanço e os de seus bancos para irrigar segmentos que hoje estão fora do mercado bancário convencional. “Se o esforço fiscal ficar circunscrito aos grandes temas da crise: equipamentos, esforço de logística para evitar problemas de abastecimento, assistência social e a alguns setores, pequenas e médias empresas em particular, vamos acabar com uma dívida mais alta, que hoje está 77% do PIB, e vamos supor que vá para 90%. Mas dá para aguentar, desde que, quando a crise sanitária for superada, se tenha um horizonte de volta à normalidade.”
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