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O que se viu, ontem, no Leblon foi a perfeita adequação dos figurantes à lembrança de quem deu nome ao cenário. Batizada de Delfim Moreira em homenagem ao único louco que se tornou presidente da República do Brasil, a avenida, fechada ao trânsito, foi ocupada por uma multidão de descuidados com a própria saúde que desfilaram indiferentes ao risco da morte pelo coronavírus.
Este país já teve uma Rainha Louca, Maria I, Rainha do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves. E presidentes considerados loucos por seus desafetos. Mas Delfim Moreira, que governou entre 1918 e 1919, foi o único até agora a ser clinicamente considerado louco. Vice-presidente, sucedeu Rodrigo Alves, uma das 35 mil vítimas mortais da gripe Espanhola por aqui.
Delfim Moreira era um louco manso. Jamais ousou fazer a apologia de qualquer remédio contra a gripe que matou entre 17 milhões a 50 milhões de pessoas no mundo. Às vezes colocava seu fraque e suas condecorações para ir a uma solenidade que não havia. Certa vez, conta a lenda, foi visitado por Ruy Barbosa, mas ficou olhando atrás da porta, abrindo-a e fechando.
O Covid-19 já infectou pouco mais de 2.733.000 pessoas no Brasil. Cinco meses após o primeiro caso de infectado, a presença do vírus foi detectada em 98% do total de municípios, segundo o Ministério da Saúde. Ou seja: em 5.442 cidades. Apenas 128 ainda estavam a salvo do vírus até o último fim de semana. Nesta, está prevista a ultrapassagem da marca dos 100 mil mortos. Uma tragédia.
O que se viu na Avenida Delfim Moreira e nas areias interditadas da praia do Leblon não foi diferente do que se vê no resto do país, o único do mundo onde, há 5 meses, morrem mais de mil pessoas por dia, segundo Tânia Vergara, presidente da Sociedade de Infectologia do Estado do Rio. A maioria dos brasileiros passou ao modo “E daí?” e decretou na prática o fim da pandemia.
E, no entanto, os números mostram que ela avança pelo interior do país, embora não tenha abandonado os grandes centros urbanos, nem mesmo a cidade do Rio, onde há sinais de que uma segunda onda poderá se abater. No Distrito Federal, o vírus está em alta. Em comum, a maioria das cidades ainda sem registros da doença têm menos de 10 mil habitantes. E carece de hospitais e de UTIs.
No futuro, quando se fizer o balanço final dos erros cometidos no combate ao Covid-19 e se procurar os culpados, eles não estarão apenas no topo das autoridades públicas que se omitiram ou que cederam a pressões para relaxar antes do tempo as medidas de isolamento social e salvar a economia. Parte gigantesca da coletividade também terá sua parcela de responsabilidade.
Nada será apurado sobre o relatório a respeito de servidores antifascistas
À espera que cesse o barulho
O ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, tem uma vantagem e uma desvantagem. A vantagem: é bom de bico. Seu vocabulário é vasto, coisa rara entre muitos dos seus colegas de governo. E ele sabe usá-lo sem demonstrar qualquer esforço. A desvantagem: com frequência, quando se aplica na defesa do governo como um “servo fiel”, é pouco convincente.
Mendonça anunciou que não admitirá “perseguição a grupo de qualquer natureza”. E acrescentou, enfático: “Isso não é aceitável num estado democrático de direito”. Bravo! Mas não negou, nem confirmou a existência de um relatório de inteligência produzido por uma secretaria do seu ministério sobre 579 pessoas identificadas como simpáticas a movimentos antifascistas.
Por negar-se a reconhecer que o relatório existe, poupou-se de fazer comentários a respeito. Disse que mandou abrir uma sindicância para apurar o caso. Para quê sindicância? Se quisesse, com o disparo de um único telefonema, ficaria sabendo que o relatório existe. A sindicância poderia servir para apurar por que o relatório foi feito, quem mandou fazê-lo, e com que objetivos.
O relatório foi produzido pela Secretaria de Operações Integradas do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Lista servidores públicos federais que teriam posições contrárias ao presidente Jair Bolsonaro. E que em algum momento em suas contas particulares nas redes sociais se declararam antifascistas. Lei alguma criminaliza o antifascismo. Nem o seu oposto.
“A questão não é ser antifascista ou não. Não é um rótulo que vai dizer o conteúdo de um eventual grupo que se manifesta pelo antifascismo […] Não estou nem qualificando e nem desqualificando”, embromou Mendonça. No país do “nada foi apurado a respeito”, essa será a conclusão da sindicância que o ministro mandou abrir. Aposte. É só deixar que o caso esfrie.
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