quinta-feira, 22 de outubro de 2020

Bruno Boghossian – Nova aliança de Bolsonaro

- Folha de S. Paulo

Aprovação para STF e guerra da vacina mostram como presidente se equilibra entre dois grupos

A quarta-feira mostrou a cara do novo núcleo político que sustenta Jair Bolsonaro. Pela manhã, o presidente abasteceu a ala ideológica do governo e vetou o acordo para comprar a vacina chinesa contra a Covid-19. Depois, ele contou com a boa vontade do centrão para aprovar o nome de seu indicado para o STF.

Ainda que muita gente prefira acreditar que Bolsonaro se tornou um presidente moderado ao abraçar os velhos caciques, está cada vez mais claro que o governo se equilibra numa aliança entre as cortesias da política tradicional e o radicalismo que o projetou para a fama.

Desde que deu início à reforma de sua coalizão e parou de xingar o Congresso, o presidente descobre aos poucos até onde pode ir para manter o apoio desses dois grupos. Se acha que chegou longe demais, ele sempre pode entregar um cargo ao centrão ou lançar uma nova teoria conspiratória nas redes.

A primeira etapa da refundação desse pacto foi concluída no confortável processo de aprovação de Kassio Nunes para o Supremo. Embora o indicado de Bolsonaro tenha recebido o aval de governistas e oposicionistas, as maiores amabilidades partiram dos chefes do centrão. A certa altura, o novo ministro se disse emocionado com as palavras de Ciro Nogueira, presidente do PP.

Seria um dia amargo para os apoiadores que acusavam Bolsonaro de traição na escolha daquele juiz para o STF, mas eles não foram esquecidos. Ao anular o acordo para a distribuição da CoronaVac, o presidente deu dois presentes a esse grupo: alimentou seus delírios antichineses e desgastou um ministro da ala militar, que disputa espaço com o núcleo ideológico do governo.

Bolsonaro trabalha pela união porque enxerga benefícios nessa sociedade. A manutenção dos laços com sua antiga base política preserva o vigor de uma militância que é útil ao presidente nos embates com adversários. Já o vínculo com o centrão blinda seus aliados e protege o governo de investidas que poderiam derrubá-lo do cargo.

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