Já
não há espaço para remédios improvisados, são necessárias medidas inovadoras e
corajosas
A
pandemia tem aumentado o esgarçamento da educação no Brasil, tanto pública
quanto privada, mas também vem ampliando a oportunidade para uma agenda social
com políticas educacionais inovadoras. Com a paralisação parcial da atividade
econômica, milhares de jovens perderam o emprego e a renda para bancar os
estudos. Muitos estabelecimentos de ensino paralisaram as aulas presenciais
para evitar a proliferação do vírus, o que afetou, sobretudo no ensino público,
estudantes das famílias de baixa renda.
A
situação da educação no Brasil é tão grave quanto desigual. No ensino infantil
faltam creches para 86% das crianças mais pobres. Já entre os 20% de famílias
com renda mais alta no País, a falta de creches atinge apenas 6,9% das crianças
entre 0 e 3 anos.
Os
números que retratam o ensino médio são igualmente alarmantes: nossa taxa de
conclusão do ensino médio antes de completar 25 anos é de apenas 58%.
Comparando com taxas de conclusão de 86,1% no Chile e 79,1% nos países da
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o quadro é
dramático. Quanto à metade dos estudantes que conclui o ensino médio, segundo
dados do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb), cerca de 70%
apresentam resultados considerados insuficientes em Matemática e Português,
requisitos hoje mínimos para sua empregabilidade, mesmo em funções modestas.
A
formação educacional superior também vai mal, principalmente no ensino
tecnológico. As universidades e escolas superiores privadas, que representam
cerca de 75% a 80% das matrículas, enfrentam perdas consideráveis, tanto em
evasão quanto em inadimplência. Com base em amostra nacional, a Associação
Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES) estima que em julho deste
ano apenas 14% da amostra pretendia continuar matriculada no segundo semestre,
ante 40% que só retomariam em 2021 e outros 38% apenas quando a situação se
normalizasse. Perguntados sobre o que mais estava afetando sua decisão, 80%
apontaram perda de renda da família ou do emprego.
O
primeiro passo para enfrentar esse quadro é encarar o problema como um desafio
federativo. A responsabilidade pela educação é compartilhada pelos três níveis
de governo.
O
governo federal é o principal responsável pelo financiamento do ensino superior
público, sendo uma pequena parcela das despesas destinada à assistência
financeira a alunos de instituições privadas. O ProUni concedeu este ano 252
mil bolsas totais ou parciais, ante um total de 6,3 milhões de matrículas no
ensino superior privado, menos de 4% dos alunos. Quanto ao crédito estudantil
subsidiado (Fies), o governo federal beneficiou cerca de 1 milhão de alunos,
metade dos quais está inadimplente!
Os
governos estaduais são responsáveis pelo ensino médio e os municípios assumem o
grosso do financiamento do ensino fundamental. Mesmo com todas as limitações
fiscais do País, inovações na gestão escolar em alguns Estados brasileiros
merecem destaque, assim como experiências internacionais bem-sucedidas.
No
Ceará, os mecanismos de incentivo baseados na distribuição do ICMS, estadual,
de acordo com o índice de qualidade da educação do município mostraram-se
efetivos para melhorar os resultados de aprendizagem. No Amazonas os
professores são avaliados por meio de cursos online obrigatórios,
cuja avaliação final é requisito para a conclusão do estágio probatório.
A
Austrália foi a primeira a implementar um sistema de crédito estudantil
condicionado à renda (Income Contingent Loan), depois adotado no Reino Unido,
na Nova Zelândia, na Hungria, nos Países Baixos e na Coreia do Sul. Nesse
sistema, o acesso ao ensino superior é gratuito e o egresso reembolsa o crédito
se e quando atingir um patamar mínimo de renda (US$ 40 mil na Austrália e US$
30 mil no Reino Unido), sujeito a um teto de reembolso. Modelo similar se
aplica na Universidade da República do Uruguai, pública e gratuita, que cobra
de todos os seus diplomados uma porcentagem específica do Imposto de Renda para
financiar o ensino universitário.
O
Congresso Nacional tem dado prioridade a uma agenda social voltada para a
educação. Recentemente foi aprovada a Emenda Constitucional n.º 108, que torna
permanente o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb)
e aumenta suas verbas. O presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, tem
defendido um programa de poupança para estimular o jovem brasileiro a cursar o
ensino superior – ideia análoga ao Programa Criança com Futuro, proposto no PL
4.698/19 do Senado.
Diante
dos efeitos de longo prazo da pandemia, que se estenderão para além de 2021, já
não há espaço para remédios improvisados e de curtíssimo alcance, pois isso
implicaria submeter a maioria do povo brasileiro – famílias de renda média para
baixo – a sofrimentos que não se limitam à perda de emprego e renda já ocorrida
e a ocorrer ao longo deste ano.
A
deterioração da formação educacional das crianças e dos jovens brasileiros
precisa de medidas inovadoras e corajosas.
*Senador (PSDB-SP)
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