Show
de demagogia desvairada de Bolsonaro é o de sempre, mas um dia a casa cai
Da
longa lista de produtos que importa da China, plataforma de petróleo é aquele
em que o Brasil gasta mais. Depois, vêm telefones celulares. Em 2019 gastamos
também US$ 70 milhões em “edredons, almofadas, pufes e travesseiros” chineses.
Qual
o maior fornecedor estrangeiro de antibióticos para o Brasil? A China, que
aliás aparece em terceiro lugar nas vendas de produtos de beleza, por exemplo.
Não
dá problema, por ora, porque basicamente quase ninguém sabe alguma coisa de
comércio internacional, porque um governador desafeto de Jair Bolsonaro não
disse que vai importar antibióticos ou pufes e porque a milícia digital
bolsonarista não se ocupou do assunto.
Até
o ano passado, o Brasil comprava pouca vacina e produtos imunológicos prontos
da China. As importações maiores tradicionalmente vinham de Alemanha, Suíça,
Estados Unidos e Bélgica, com Irlanda, Itália, Reino Unido e França logo atrás.
Neste ano, a China começou a aparecer entre os quatro maiores.
Mas
nada disso importa no nosso ambiente de selvageria lunática. Além do mais, o
Brasil fabrica o grosso de suas vacinas, por vezes com matérias primas
importadas de vários países, como aliás é o caso de tanta mercadoria. Até de um
simples lápis de grafite.
Bolsonaro
sabia o que Eduardo
Pazuello andava fazendo com a “vacina chinesa”. Mas a reação dos
milicianos digitais, os discursos vitoriosos de João Doria e a baixa vaidade
presidencial, de valentão provinciano ou síndico maníaco, provocaram o chilique
(“eu é que mando!”). O general-chefe do almoxarifado da Saúde é menos que um
ajudante de ordens do capitão, é uma ordenança.
Já
vimos esse show ruim antes, essa “stand up tragedy”. Os problemas maiores e
também já muito sabidos são outros: um desastre diplomático, perigoso para a
segurança e economia nacionais, e alguma demagogia destrutiva em geral, como
uma decisão econômica tresloucada.
Bolsonaro
tem mostrado bom instinto de autopreservação. Tem conseguido jogar para sua
plateia desvairada e, pelo menos, não tem tomado decisões que afastem de modo
terminal os donos do dinheiro grosso ou a média do eleitorado, até agora. Na
prática, a destruição das instituições é homeopática, por enquanto, para o que
a maioria não dá a mínima. Quanto tentou um veneno em dose cavalar, com os
comícios golpistas, foi travado pelo risco de que sua capivara tivesse
consequências imediatas. A ficha corrida de parentes e amigos por enquanto
contém o projeto de golpe.
Mas
não temos como saber se assim será e se, depois de um envenenamento contínuo, o
país, sua democracia e as instituições chegarão a uma desgraça irreversível.
Não
sabemos até onde pode ir o conflito com a China, por enquanto mais voçoroca de
redes insociáveis e propaganda do que embate concreto. Não sabemos o que
Bolsonaro pode aprontar com os vizinhos. Que tal um tiroteio na fronteira,
perto de uma eleição?
A
China é paciente e pragmática. Quatro ou oito anos de um governo adversário de
país fornecedor de matérias primas podem ser suportáveis. Por ora, de resto,
Brasil e China dependem um do outro, embora um dia os chineses possam dar um
basta e começar a, sei lá, a financiar plantações de soja em alguma savana da
África.
O alerta, que já deveria estar ligado faz muito tempo, desde 2018, é que Bolsonaro não tem limite algum. Os bobalhões que louvaram sua adesão às reformas mal começaram a prestar atenção. Daqui a pouco, o capitão pode dar um tiro no teto de gastos que abriga essa gente mercadista.
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