Muitos
erros da política econômica ficam evidentes nesse episódio da Ford. Falhas da
empresa e equívocos do governo. A indústria automobilística está mudando no
mundo, migrando para motores elétricos, de menor impacto no meio ambiente.
Algumas empresas estão sendo mais ágeis. No Brasil, as montadoras sempre foram
dependentes de subsídios fiscais, empréstimos baratos e barreiras contra o
produto importado. Inclusive no governo Bolsonaro, que só em 2019 deu R$ 6,6
bilhões de subsídios ao setor. No caso da Ford, a história dos erros é antiga.
Quando
a Ford veio ao Brasil, na década de 20, foi perseguida a ideia de Henry Ford de
implantar uma cidade no meio da floresta, removendo, claro, a floresta. A
Fordlândia deu errado mas ela se assentou sobre um milhão de hectares doados à
empresa pelo governo no Pará. Produziria borracha para os pneus. Depois foi
transplantada para 100 quilômetros adiante, em Belterra, também no Pará. A
história mostra a arrogância do capitalista e o erro dos governos brasileiros
em relação a Amazônia.
A indústria automobilística só cresceu no Brasil à base de muito subsídio, empréstimos com juros baixos, doação de terrenos, estímulo à guerra fiscal entre os estados. Exploraram até o nacionalismo, era o “produto nacional” contra a concorrência externa. Só o governo Collor reduziu as tarifas de importação, mas são ainda muito altas.
A
Ford errou no mix de produtos. Ela já foi uma das maiores no país e hoje está
em sexto lugar em vendas com 7,3% de market share, perdendo para a GM, Fiat,
VW, Hyundai, Renault. No ano passado, por causa da pandemia, houve uma queda de
28% no licenciamento de carros. Na Ford, a queda foi de 39%. Todos entraram em
crise mas ela caiu mais pela falta de produtos atraentes.
A
Ford suspendeu também a produção na América do Norte, com a exceção do Mustang,
“em favor de picapes e utilitários mais rentáveis”, conta o “Financial Times”.
Na Europa e nos Estados Unidos, a empresa cortou 12 mil empregos e há duas
semanas parou os planos de uma joint venture na Índia com a Mahindra, diz o
jornal inglês.
Existe
uma crise que é da Ford e uma crise da indústria automobilística. Há ainda a
transição para um novo modelo sustentável que não se baseie nos atuais motores
à combustão. O presidente Bolsonaro disse ontem que a Ford está indo embora
porque ele não quer dar subsídios como outros governos. Não é verdade. Ele
herdou o programa de subsídio, o Rota 2030, aprovado no governo Temer, mas não
fez nada para que fosse reduzido. Pelo contrário, o valor total do subsídio ao
setor saiu de R$ 5,3 bilhões em 2018 para R$ 6,6 bilhões em 2019.
O
modelo de subsídio floresce no Brasil por causa do lobby, mas também pela
estrutura complexa e cara de impostos, um dos itens mais fortes do custo
Brasil. E o que a equipe econômica liderada por Paulo Guedes fez a propósito
disso? Nada. A proposta de reforma tributária avançou no Congresso porque foi
pensada pelo economista Bernard Appy, encaminhada pelo deputado Baleia Rossi
(MDB-SP), e o pouco que andou foi graças ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia
(DEM-RJ). O governo ignorou o projeto e depois apresentou uma proposta de
fundir apenas dois impostos federais, PIS e Cofins, aumentando a taxação sobre
itens como livros, mas mantendo subsídio aos carros.
A
reforma tributária é a mudança mais importante para melhorar o ambiente de
negócios não apenas para a Ford ou a indústria automobilística, mas para todas
as empresas no Brasil, para favorecer a nova economia.
No
mesmo dia em que a Ford anunciou a suspensão da sua atividade industrial no
país, que vai levar a 5.000 demissões, o Banco do Brasil também avisou que vai
demitir 5.000 funcionários, só que o fará incentivando a saída, ou seja, dando
indenizações e bônus extras para os desligados. Numa mesma tarde de
segunda-feira, duas empresas, uma estatal e uma multinacional, anunciaram o
fechamento de 10 mil postos de trabalho.
A ampliação do emprego só será possível com uma reforma do ambiente de negócios no Brasil profunda e atualizada com as novas tendências do mundo. Bolsonaro achava que com a vitória da esquerda na Argentina as empresas fechariam lá para ficar abertas aqui. Na Ford, ocorreu o contrário. Ela continuará produzindo lá. Com a saída da montadora, pode-se fazer um estudo de caso dos erros da política industrial no país.
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