Depois
de Cidadania e Saúde, aliados cobiçam Educação
Há
meses não se via um movimento daqueles, em plena segunda-feira pandêmica, na
conhecida “rua dos restaurantes” da Asa Sul.
Localizado
a dez minutinhos do Congresso - de carro, claro, para enfrentar a precária
mobilidade urbana da capital federal -, o endereço tornou-se um destino
tradicional de parlamentares na hora do almoço ou depois das votações. Nos
últimos meses, contudo, os carros oficiais viraram objeto raro na paisagem.
Uma
exceção foi justamente a última segunda-feira. A exigência legal de que as
eleições para as mesas diretoras da Câmara e do Senado fossem realizadas
presencialmente deu um alívio não só para os caixas dos restaurantes ali
instalados, como ajudou também quem foi atrás de informação.
Motoristas
à espera, deputados e dirigentes partidários comendo, confabulando.
Preparavam-se para as sessões que dali a algumas horas definiriam a nova cúpula
do Legislativo. O maior distanciamento entre as mesas não prejudicava quem
tentava aproveitar o descuido de alguma excelência um pouco mais incauta.
À frente, um dirigente partidário falava baixo com seu interlocutor. Nada feito. Ao lado, guarda baixa. E o assunto era um só: a perspectiva de vitória dos candidatos governistas, que se confirmaria em breve.
“Bolsonaro
vai fazer barba e cabelo. Só não vai fazer o bigode porque não tem uma terceira
Casa. Se tivesse bigode, faria também”, falava em voz alta um deputado do
Nordeste aos companheiros de mesa. Ele dizia possuir uma lista dos colegas da
bancada estadual que, embora tivessem sinalizado apoio a Baleia Rossi (MDB-SP),
votariam com ele em Arthur Lira (PP-AL). Inclusive de siglas de esquerda. “Este
aqui só disse que vai no Baleia para não perder a chance de ser líder do
partido dele, para não perder apoio interno.”
Um
dos interlocutores creditou a vitória à experiência acumulada pelo presidente
Jair Bolsonaro em seus quase 30 anos como deputado federal: alguém que, nas
suas palavras, foi do baixo clero, sabe o que a massa de deputados quer e
espera receber do governo. Qualquer governo. E de fato Bolsonaro usou as armas
que estavam disponíveis no paiol da Secretaria de Governo, distribuição de
emendas e cargos, para emplacar dois parlamentares próximos no comando do
Congresso.
Mesmo
assim, no Executivo existe a consciência de que fidelidade, nesse tipo de
relação, sobretudo com partidos do Centrão, vai até certo ponto. Esta foi a
dura realidade enfrentada por governos anteriores, mas na ótica de autoridades
do atual governo era o preço a ser pago para que o poder da Presidência da
República pudesse ser exercido com amplitude. Contou também, claro, a
necessidade de reduzir os riscos de um processo de impeachment ser acolhido.
No
governo, há um sentimento de relativa frustração com a demora no avanço das
pautas defendidas na campanha de 2018, tanto na área econômica como na agenda
de costumes ou de flexibilização no acesso a armas e munições, para citar
alguns exemplos caros ao presidente e ao seu eleitor mais fervoroso. Passada a
disputa pelo comando do Parlamento, portanto, não haveria mais por que esperar
para destravar uma série de votações que vinha sendo postergada por causa da
disputa política pelo comando da Câmara, pelas eleições municipais e, depois,
pelo recesso.
Aliados
do novo presidente da Câmara dos Deputados reconhecem a importância do Planalto
nas articulações que levaram à vitória de Arthur Lira, mas destacam o trabalho
feito meses a fio pelo próprio candidato e seu grupo. Entre eles, existe a
convicção de que a vitória ocorreu a despeito da imprensa, dos formadores de
opinião, e que o mercado financeiro precisaria aceitar o resultado do pleito,
qualquer fosse ele, para então necessariamente construir uma boa convivência -
e interlocução - com o sucessor de Rodrigo Maia (DEM-RJ).
Durante
a campanha, eles reconheciam que Maia sempre teve um melhor diálogo com os
principais agentes do mercado. O agora ex-presidente da Casa fala a mesma
língua do ministro da Economia, Paulo Guedes, o que permitiu, inclusive, que
eventuais desentendimentos entre os dois pudessem ser superados em determinados
momentos. No entanto, às vésperas da eleição integrantes do grupo de Lira passaram
a dizer que consideravam incabível o fato de parte do setor privado ver na
candidatura adversária mais previsibilidade para a economia, até porque Baleia
Rossi havia formado seu bloco com partidos de esquerda.
No
Senado, a eleição de Rodrigo Pacheco (DEM-MG) contou com o já conhecido impulso
vindo do Palácio do Planalto, mas também foi construída com o apoio de
parlamentares que se opõem a algumas das pautas que visam a redução do tamanho
do Estado.
Isso
não quer dizer que Lira e Pacheco ignorarão o que a equipe econômica disser.
Pelo contrário. Ambos pretendem construir saídas conjuntas com Guedes e
prometem respeitar o teto de gastos. É provável, entretanto, que ouçam mais a
ala política do governo e busquem mais convergências com o próprio presidente.
O
ministro Luiz Eduardo Ramos tende a sair fortalecido do processo eleitoral.
Depois de ser alvo de insistentes especulações sobre uma eventual exoneração, o
chefe da Secretaria de Governo, articulador político do Planalto, pode colocar
no currículo sua participação no estado maior dessas duas campanhas vitoriosas.
Onyx
Lorenzoni deve mesmo deixar o Ministério da Cidadania para retornar ao núcleo
decisório do Planalto. Se conseguir manter a Subchefia para Assuntos Jurídicos
sob a Secretaria-Geral, terá controle sobre todo e qualquer ato publicado no
“Diário Oficial da União”. A SAJ historicamente foi um braço da Casa Civil, mas
foi realocada na atual administração. É um instrumento poderosíssimo e coloca
seu detentor muito próximo ao presidente.
A sinalização de Bolsonaro de que não haverá recriação de ministérios já fez com que os interesses da base se voltassem para as pastas da Saúde e da Educação. Agora que ele adotou para valer o presidencialismo de coalizão, será a vez do Centrão fazer barba, cabelo e bigode, até que se defina a pauta que será tocada até o fim de 2022.
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