Depois do amigo
dos filhos na Saúde, Bolsonaro quer seu próprio amigo almirante no Itamaraty
O ministro das Comunicações, Fábio Faria, é um dos enviados do Planalto para sondar
os parlamentares sobre duas saídas para a crise aguda na política externa: a
ida do almirante da ativa Flávio
Rocha para o Itamaraty e a remoção do chanceler Ernesto Araújo para uma embaixada vistosa
– algo que depende da aprovação do Senado.
Quanto a Rocha, os políticos não dizem sim nem não, pois desconhecem as credenciais dele e estão mais empenhados em tirar Ernesto Araújo do que em fazer o sucessor. Rocha fala cinco línguas, é um dos raros pragmáticos e de bom senso no governo e, além de interagir com setores sensíveis do empresariado nacional, já vem assumindo missões no exterior em nome do presidente Jair Bolsonaro, inclusive na China. Mas um militar no Itamaraty?
Já quanto ao prêmio de consolação para Ernesto Araújo, pelos péssimos serviços prestados à Nação, políticos de variados matizes, até do Centrão, têm dito um sonoro não a Fábio Faria e a quem mais venha com essa conversa. A presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, Kátia Abreu, resume, “sem frescura e mimimi”, como gosta Bolsonaro diante da pandemia: “Isso, não!”
Assim como o Senado matou na origem a pretensão
tragicômica do deputado e hamburgueiro Eduardo Bolsonaro para ser embaixador em
Washington, está na fase do “quem avisa amigo é”: se o presidente insistir no
nome de Araújo para países relevantes, como EUA, ou aprazíveis, como França,
eles – presidente e chanceler – vão correr sério risco de derrota.
Como nomear Araújo para os EUA, depois da sabujice
para Donald Trump e da implicância com Joe Biden? E para a China, depois das
caneladas ideológicas e nada diplomáticas contra o maior parceiro comercial do
Brasil? E para a Índia, depois de votar com Trump contra um projeto sobre
vacinas de interesse dos emergentes? E para Alemanha, França ou Noruega, com
Araújo desdenhando o “ambientalismo” como meio do comunismo para destruir o
Ocidente?
Sobrariam Hungria e Polônia, alvos de Trump e Steve
Bannon para uma revolução mundial da extrema-direita terraplanista, ou a
Turquia de Erdogan, quem sabe Coreia do Norte ou Venezuela? Mas, se Ernesto
Araújo acha bacana o Brasil ser pária internacional, não deve gostar tanto de
ser pária ele próprio.
O fato é que o Congresso aderiu à multicolorida
frente nacional contra uma política externa nociva aos interesses nacionais. Na
reunião sobre a pandemia no Planalto e, horas depois, na cadeira de presidente
da Câmara, o deputado Arthur Lira mirou Ernesto Araújo: atacar a maior potência
do planeta e os maiores produtores de vacinas e medicamentos do mundo, não dá.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, bateu na mesma tecla – e no mesmo alvo
– dois dias seguidos.
Bolsonaro se encontrou com Lira na quinta-feira e,
na sexta, saiu da comemoração dos 30 anos do Mercosul, às pressas, para se
reunir com Pacheco e repetir o ritual da demissão do general Eduardo Pazuello
da Saúde: elogios e manifestações de amizade à “vítima”, enquanto as
articulações correm soltas para encontrar o substituto.
O Centrão não cobiça o Itamaraty, prefere a rica
Agricultura numa dança de cadeiras. Mas, assim como a Saúde foi para um
cardiologista amigo dos filhos do presidente, o provável é que o Itamaraty vá
para um amigo do próprio Bolsonaro. Não imposto pelo Centrão, por Lira e
Pacheco, muito menos por diplomatas. Uma escolha “in pectore”, como seria o
almirante Rocha.
É assim que os paus-mandados de Bolsonaro vão sendo jogados ao mar. Ou o timoneiro Bolsonaro não manda mais nada no próprio barco, ou governo, ou finge que virou um outro Bolsonaro para salvar o pescoço, mas pronto para dar o bote na hora certa. Que bote? Vá se saber...
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