Por
ser um instrumento criado para as minorias fiscalizarem governos, nenhuma CPI
deixa de sofrer tentativas de esvaziamento. O método mais usual é convencer
parlamentares a retirar o apoio à comissão. No caso da proposta pelo senador
Randolfe Rodrigues (Rede-AP), a manobra não deu certo. O governo passou então a
usar outras.
A
segunda tentativa foi inviabilizar a CPI pelo tumulto, objetivo aparente do
vazamento da conversa entre Bolsonaro e o senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO).
Nela, Bolsonaro pede que o Senado aceite pedidos de impeachment de ministros do
STF. Tudo para tumultuar. Não bastassem ser pedidos descabidos, foi uma
tentativa absurda de intervenção noutro Poder.
A terceira tentativa é ampliar o campo de investigação, incluindo governadores e prefeitos. Surgiu uma petição, do senador Eduardo Girão (Podemos-CE), para formar outra CPI, mais ampla, como insistem os governistas. Mas a Secretaria do Senado, com base no regimento interno, contestou a inclusão de estados e municípios na pauta da CPI, por desviar do objetivo. O máximo que conseguiram foi estabelecer a fiscalização de “recursos da União repassados aos demais entes federados para combate da pandemia”. O governo celebrou.
A
ideia de fiscalizar estados e municípios não tem pé nem cabeça. Governadores
sobre os quais há denúncias relativas à pandemia já estão sob investigação. Há
até dois com processo de impeachment em curso: Wilson Witzel (RJ) e Carlos
Moisés (SC). O governador do Pará, Hélder Barbalho, já foi alvo de ações da PF
que investigam fraudes na compra de respiradores, assim como Wilson Lima, do
Amazonas. O que falta é investigar os responsáveis pelos erros e pela omissão
do governo federal no combate ao coronavírus.
Na
sessão de ontem para a abertura da CPI, ganhava corpo a quarta tentativa: adiar
a CPI até que o Senado retome as sessões presenciais. Nestes tempos de
pandemia, é outra sugestão descabida. As sessões podem ser feitas de forma
semipresencial, como já ocorre nas comissões do Congresso. Uma CPI não é um
processo judicial, com direito a ampla defesa. É uma investigação pública. A
tecnologia disponível é mais que suficiente para permitir o grau de sigilo que
se deseje dar às sessões.
Cabe aos senadores conscientes da tragédia em que o país se encontra rechaçar essas manobras. Quem atua para inviabilizar a comissão quer encobrir os responsáveis por mais de 358 mil mortes. É preciso jogar luz em toda a cadeia de comando que resultou na escassez de vacinas, na falta de oxigênio em Manaus e noutras cidades, na distribuição criminosa de remédios ineficazes contra a Covid-19 e assim por diante. São necessários depoimentos e provas para dar sustentação a um enredo já conhecido em parte, mas não na profundidade que a sociedade e a História exigem. É o mínimo que o país deve à memória de quem se foi.
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