O Globo
O bolsonarismo serviu um aperitivo do plano
para tumultuar a eleição de 2022. A tropa do governo tentou mudar a
Constituição e torrar R$ 2 bilhões para ressuscitar o voto impresso. Ao
constatar que seria derrotada, rasgou o regimento da Câmara e melou a votação.
A emenda do voto impresso é examinada por
uma comissão especial. O presidente e o relator da proposta são bolsonaristas
de carteirinha. Os dois se elegeram com apoio de movimentos de ultradireita do
Paraná. São investigados por ataques à democracia e disseminação de fake news.
Até meados de junho, o governo controlava 23 das 34 cadeiras da comissão. O cenário começou a mudar quando Jair Bolsonaro radicalizou as ameaças de golpe e a cúpula das Forças Armadas atacou a CPI da Covid.
Assustados com a escalada autoritária,
dirigentes de 11 partidos montaram um cordão sanitário em defesa do sistema
eleitoral. O movimento acabou com o domínio bolsonarista na comissão. A emenda
do voto impresso seria derrotada na sexta, mas os governistas viraram a mesa.
O presidente da comissão, Paulo Eduardo
Martins, inventou um novo prazo para o relator alterar a proposta. A oposição
protestou, mas ele desligou os microfones do plenário e declarou que a sessão
estava encerrada.
A transmissão da TV Câmara terminou com um
grito de “picareta”. A manobra também foi chamada de “banditismo” e
“molecagem”. Antes do fim abrupto, o sinal da sessão foi interrompido ao menos
três vezes. Martins culpou uma invasão de hackers, mas não convenceu ninguém.
Com o adiamento, a votação ficou para
agosto. O governo tentará usar o tempo extra para pressionar deputados e
estimular novas manifestações golpistas.
A cruzada contra o sistema eleitoral não
deve se esgotar com a provável rejeição da emenda. Bolsonaro continuará a
repetir que só perde se as urnas forem fraudadas. O capitão sabe que não
precisa de maioria para promover uma baderna em 2022. Basta contar com uma
minoria radicalizada e armada. Se possível, com a cumplicidade de generais.
Novilíngua bolsonarista
O capitão não está sozinho nas agressões ao
idioma. Seus aliados também gostam de torturar palavras para torcer seu
significado. Alguns exemplos em voga na capital:
Narrativa. Novo sinônimo de
mentira. “Mais uma narrativa!”, resmunga o senador Flávio Bolsonaro a cada
denúncia contra o governo do pai.
Comissionamento. Eufemismo para
propina no Ministério da Saúde sob intervenção militar.
Kit Covid. Conjunto de
medicamentos que não curam a Covid.
Voto auditável. Voto impresso,
instrumento de fraudes eleitorais desde os tempos do Império. O voto eletrônico
é mais seguro e já passa por dez etapas de auditoria.
Fala de internet. Toda bobagem dita pelo Mito, segundo a definição do general Pazuello. “Se tirarmos da figura do presidente da República o que ele chama de falas de internet, não sobra nada”, resumiu o professor Eugênio Bucci ao podcast O Assunto.
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