Valor Econômico
Desde o ‘boom’ de 2008, foram criadas
barreiras para importar aço
Em 2008, quando a economia brasileira vivia
momento de forte expansão, o consumo de aço usado pela construção civil
aumentou de maneira significativa. O que decidiu fazer, então, o governo
federal no ano seguinte? O impensável: elevar de zero para 12% a 14% as
alíquotas do Imposto de Importação incidente sobre os aços longos, justamente
os usados como insumo na construção.
É evidente que taxar o produto importado no
momento em que a demanda está aquecida não faz sentido nem aqui, na Ilha de
Vera Cruz, nem alhures. O Imposto de Importação é um tributo regulatório.
Trata-se de um mecanismo à disposição dos gestores macroeconômicos para regular
o funcionamento de segmentos da economia em momentos de choque de oferta.
Qualquer alteração da natureza desse imposto fora dessa premissa só serve aos interesses de grupos privados com influência em Brasília. Se a demanda por um produto é crescente, a ponto de a capacidade de a indústria nacional não conseguir atendê-la integralmente, taxar as importações significa chancelar a elevação dos preços domésticos daquele insumo.
Em outras palavras, ao agir dessa maneira,
a autoridade estará concordando em elevar a margem de lucro de um determinado
setor, em detrimento não do segmento seguinte daquela cadeia produtiva, mas da
população. Por quê? Porque a conta do aumento dos preços virá pela alta da
inflação, o mecanismo mais perverso de distribuição de renda que se conhece.
No caso em questão _ construção civil _, em
2010, portanto, dois anos após o início do "boom" da construção civil
e um ano depois da inacreditável taxação das importações de aço, o Inmetro
(Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia) baixou normas para
regular a importação de aço por meio da Portaria 73/2010. Coincidência?
A coisa passou a funcionar assim: se você é
dono de uma construtora e precisa ou deseja importar aço longo, por exemplo, o
vergalhão usado pela construção em obras de edificação, precisa certificar o
importador e o exportador do produto que pretende trazer do exterior. Ambos
precisam ser rigorosamente enquadarados segundo os parâmetros determinados pelo
Inmetro. Isso pode fazer sentido? Pode, afinal, imaginemos que uma construtora
importe produtos de baixa qualidade que comprometam a qualidade de edificações
no país, colocando em risco a segurança dos usuários.
Mas, neste país a que chamamos de Brasil, o
inferno _ e não apenas o pobre do diabo _ está nos detalhes. O problema começa
quando a construtora constarta que só existem duas empresas certificadoras de
qualidade de aço autorizadas pelo Inmetro. Duas são duas, não são dez nem 20.
Duas cobram mais para fazer o serviço do que dez ou 20 cobrariam porque, como
estamos vendo, tudo é uma questão de oferta: quanto mais atores oferecem um
serviço, maior é a competição entre eles, menor será o preço médio cobrado
naquela atividade.
Contratada a certificadora, esta analisa as
condições do importador no Brasil e, principalmente, a qualidade do produto do
exportador. A construtora precisa identificar o seu fornecedor lá fora e,
então, a certificadora vai até lá e traz mostras do produtor para realizar
testes aqui. São realizados 11 testes, não são três, cinco ou dez, mas, sim, 11
testes para atestar se a qualidade do aço produzido no exterior é comparável à
do produto "made in Brazil".
Digamos que tudo corra bem e o aço
importado seja aprovado segundo as condições fixadas pelo Inmetro, o importador
recebe licença de quatro anos para comprar aquele produto. Sensacional! Quatro
anos é um prazo razoável para o planejamento de uma construtora. Sim, mas,
veja, o Inmetro exige que, a cada seis meses _ seis meses são seis mkeses, não
dois ou três anos dentro da janela de quatro anos dada pela certificação
original _, seja feita a "manutenção" do certificado.
Do que se trata a "manutenção"?
Ora, fazer com a empresas certificadora vá ao país exportador para colher
amostras daquele aço e realizar, novamente, a bateria de 11 testes de qualidade
do produto. Desde 2010, quando a portaria 73 foi baixada, apenas cinco empresas
receberam certificação para importar aço longo no Brasil. Coincidência?
A odisseia do importador de aço, claro, não
termina aí. Logo na sequência da taxação do aço importado e da edição da
Portaria 73/2010 do Inmetro, a Receita Federal criou um negócio chamado
“radar”. Para obter o “radar”, a empresa importadora precisa comprovar que tem
condições financeiras de pagar ó que pretende importar, do contrário, nada
feito. A suposta preocupação do Fisco é que a companhia não tenha recursos para
pagar os impostos devidos no momento do desembaraço das mercadorias no porto ou
no aeroporto.
O “radar” funciona também como um controle
do que uma empresa nacional pode importar. Acima de um volume de US$ 500 mil, a
autorização para importar é ilimitada. Fantástico, certo? Não! Estamos no
Brasil, não nos esqueçamos. A regra diz que, se a empresa não importar nada
durante seis meses, o “radar” expira e, assim, a empresa é obrigado a obter uma
nova autorização, um novo “radar”, depois de seguir todos os trâmites
burocráticos, os mesmos já perseguidos na obtenção da primeira autorização.
Coincidência?
O ministro da Economia, Paulo Guedes, está
corretamente preocupado com isso porque, novamente, a construção civil vive um
“boom” e os preços do aço longo deram uma escalada no último ano - justiça seja
feita, o produto não subiu apenas no Brasil.
“O setor de construção entrou em um ‘boom’, com juros de um dígito e enxergando isso uma década à frente. O auxílio foi um fator adicional que estimulou a demanda. Então a construção saiu pedindo insumo, mas o alto-forno estava desligado no início. Quando a construção continuou bombando, o setor de aço começou a religar os fornos. Estou em contato com quem produz e com quem consome o aço”, disse Guedes ontem na “Live do Valo r”. “Do lado da construção, estou pedindo para reduzir os impostos de importação de aço. Do lado da produção, eles estão aumentando a produção e vendendo aqui dentro. As exportações estão caindo porque estão tentando organizar o setor interno.”
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