terça-feira, 20 de julho de 2021

Joel Pinheiro da Fonseca - Não ao fundão eleitoral de R$ 6 bi

Folha de S. Paulo

Cabe à pressão popular tentar reverter mais esse retrocesso

Campanha eleitoral precisa acontecer. Sem ela, ninguém conheceria os candidatos. E campanha custa dinheiro. Portanto, precisará ser financiada de alguma forma. As questões são duas: de onde deve vir esse dinheiro e qual o montante total a ser gasto.

O financiamento exclusivamente privado dá poder em demasia para os mais ricos. O partido que agradasse alguns bilionários teria vantagem sobre o que tivesse uma multidão de pobres. Já o financiamento estatal, apesar de um inevitável pendor conservador —beneficia a estrutura de poder vigente, quem é maior ganha mais, quem é menor ganha menos—, garante alguma equidade e retira um pouco do peso do poder econômico. É justo que seja preponderante.

Dentre as muitas possibilidades, a que temos não é ruim: financiamento público com possibilidade de doações individuais limitadas. No que diz respeito às regras, nosso sistema é razoavelmente equitativo e abre espaço para legendas novas mas populares conseguirem recursos.

Ainda não entramos, todavia, na questão principal: quanto dinheiro a sociedade destinará às campanhas?

Campanha eleitoral é corrida armamentista: não importa muito o quanto se gaste, e sim que seja mais (e melhor) do que o adversário. Se meu adversário gasta R$ 100 mil, minha campanha de R$ 1 milhão está de bom tamanho. Se ele gasta R$100 milhões, o meu milhãozinho é um trocado inútil.

Do ponto de vista do candidato, gastar mais é sempre desejável. Como o político eleito no Brasil tem muito poder nas mãos para ditar os rumos da economia, grandes empresas também têm motivos para entrar na corrida. O gastos são potencialmente sem limites. Em 2014 essa lógica nos levou à corrida mais cara de nossa história: R$ 5,8 bilhões no primeiro turno.

Na época, fui contra proibição de doações empresariais decidida pelo Supremo em 2015, mas hoje reconheço seu mérito. Saímos da campanha mais cara da história para uma eleição bem mais barata em 2018: R$ 2,9 bilhões. Um ganho social considerável.

O gasto de campanha, do ponto de vista social, é basicamente inútil. Não aumenta a satisfação das pessoas durante a campanha nem deixa um legado positivo para o futuro.

Seus defensores dizem que ele beneficia a sociedade divulgando conhecimento político. Analisando as campanhas vitoriosas das últimas eleições, contudo —a farsa pantagruélica de Dilma em 2014 e a enxurrada de fake news bolsonarista em 2018—, fica difícil sustentar isso. Para além de informações básicas sobre os candidatos (seus nomes, números e pílulas pelas quais querem ser lembrados), o resto é puro marketing.

Agora, a redução de gastos vai sendo perdida pelo aumento do fundão eleitoral, que, se for mantida a LDO, será de R$ 5,7 bilhões em 2022. Empresas não podem doar? Então que o Estado complete o que os cofres partidários perderam.

Vivemos ainda as consequências da crise econômica iniciada em 2014, que foi agravada pela pandemia. O desemprego perto de 15%. Todo mundo aperta os cintos. Além disso, a tecnologia de produção de conteúdo e de divulgação avançou muito. Bolsonaro se elegeu numa campanha comparativamente barata. Por tudo isso, o montante de dinheiro público gasto com campanhas no Brasil —gasto justo e necessário— deveria cair e não aumentar.

Previsivelmente, o governo Bolsonaro, eleito com a promessa fajuta de acabar com a velha política, revelou-se seu exemplar mais descarado e fisiológico. Cabe à pressão popular —inclusive daqueles que um dia confiaram no presidente— tentar reverter mais esse retrocesso.

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