Correio Braziliense
O maior problema de Doria é o ex-governador
tucano Geraldo Alckmin, que o lançou na política como candidato a prefeito de
São Paulo, em 2016, e agora é seu desafeto
A cúpula do PSDB quer jogar o governador de
São Paulo, João Doria, ao mar. Essa é a tradução da entrevista do presidente da
legenda, Bruno Araujo (PE), na qual manifestou a disposição de a legenda abrir
mão da cabeça de chapa para construir uma candidatura de centro mais robusta e
capaz de chegar ao segundo turno: “Como é tradição desde sua fundação, o PSDB
trabalha sempre para ter nomes à disposição para servir ao país como candidato
à Presidência da República. Com as prévias, ofereceremos um nome absolutamente
capaz de liderar o Brasil. Mas, para isso, também devemos estar abertos ao
diálogo. Só pode receber apoios quem está disposto a apoiar”, disse.
A declaração pôs mais lenha na fogueira do
confronto entre o governador paulista e o deputado Aécio Neves (MG), principal
articulador da proposta de que a legenda não deva ter candidato a presidente da
República, para gastar suas energias e os recursos financeiros com a eleição de
deputados federais. O ex-governador mineiro, que disputou as eleições
presidenciais de 2014, sendo derrotado no segundo turno por Dilma Rousseff,
continua sendo um político influente na Câmara e no Senado, onde também exerceu
mandato. Doria acusou o golpe, ainda mais porque Aécio havia dito numa
entrevista na CNN que não o considera o melhor nome para disputar a Presidência
em 2022. Segundo o parlamentar mineiro, o governador tucano “perdeu as
condições de reeleição em São Paulo”.
Doria reagiu com virulência às declarações do parlamentar mineiro: “Aécio não gosta de eleição, gosta de conchavão, que foi o que ele fez com o governo Bolsonaro. Aécio não quer nenhum nome do PSDB como candidato à Presidência, ele quer é que o fundo eleitoral fique à disposição dele mesmo. Nanico é o pensamento de Aécio Neves. Nanico foi o que ele fez, após a derrota dele, ao pedir propina a um grande empresário brasileiro e está sofrendo agora oito processos. Tenho pena e lamento que ele ainda frequente o PSDB. Deveria ter pedido para sair.”
Isolamento
Aécio não está sozinho. Conta com aliados leais na bancada da Câmara e acordos
tácitos com outros pretendentes à vaga de candidato a presidente da República
do PSDB, nas prévias da legenda marcadas para novembro. O governador do Rio
Grande do Sul, Eduardo Leite, é o principal adversário de Doria. Nas avaliações
de bastidor, hoje, seria o mais votado. Também disputam as prévias o senador
Tasso Jereissati, ex-governador do Ceará, e o ex-prefeito de Manaus Arthur
Virgílio Netto. Mas o maior problema de Doria é o ex-governador tucano Geraldo
Alckmin, que o lançou na política como candidato a prefeito de São Paulo, em
2016.
Nas eleições de 2018, Doria se insurgiu
contra o acordo de Alckmin com seu vice, Márcio França (PSB), que assumiu o
governo paulista, concorreu à reeleição e perdeu. Doria compartilhou eleitores
no segundo turno com o presidente Jair Bolsonaro, para conquistar o Palácio dos
Bandeirantes. Agora, transferiu seu vice Rodrigo Garcia do DEM para o PSDB, o
que o agastou com os democratas, para que assumisse o governo e concorresse à
reeleição, em vez de apoiar Alckmin. É um caso típico de conflito entre criador
e criatura.
Acontece que a pandemia de covid-19 quase
engoliu o mandato de Doria completamente. Sem dúvida, foi o governante que mais
bem se preparou para enfrentá-la, graças aos investimentos do Instituto
Butantan na produção da vacina chinesa CoronaVac, mas as coisas não saíram
exatamente como planejava. Bolsonaro demitiu o então ministro da Saúde Luiz
Henrique Mandetta, que fazia parceria com Doria, e abriu uma guerra contra as
vacinas, em confrontos quase diários com o governador paulista. O desgaste foi
recíproco, apesar do negativismo de Bolsonaro. Doria é o grande responsável por
50% das vacinas aplicadas no Brasil, mas São Paulo sempre foi o epicentro da
pandemia, e isso retardou a imunização completa dos paulistas.
Agora, Doria enfrenta uma situação delicada:
Alckmin lidera com folga a disputa pelo governo paulista, em aliança com
França, seu antigo vice. O ex-governador não quer correr o risco de perder as
prévias do PSDB paulista e negocia sua transferência para o PSD, do ex-prefeito
paulista Gilberto Kassab. Além disso, perdeu seu principal aliado, o falecido
prefeito de São Paulo Bruno Covas. Ao mesmo tempo, Doria trava uma guerra em
duas frentes: as pesquisas mostram que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva é o favorito nos grandes centros paulistas, enquanto Bolsonaro mantém
seus redutos nas pequenas e médias cidades paulistas. O governador tucano foi
ensanduichado.
Quem acompanha a agenda de Doria verifica que sua prioridade é intensificar a vacinação em São Paulo e fazer entregas administrativas. Continua apostando no marketing dos imunizantes no plano nacional, mas trocou os bate-bocas diários com Bolsonaro pelos anúncios de criação de frentes de trabalho, reformas de estradas, entrega de creches, implantação do ensino integral, programas sociais para a população de baixa renda etc. Quem o conhece diz que não vai desistir facilmente da candidatura à Presidência. Como sempre largou em desvantagem nas pesquisas, acredita pode virar o jogo na campanha eleitoral, mais uma vez.
Nenhum comentário:
Postar um comentário