Folha de S. Paulo
As respostas à questão são imprecisas e
ignoram o papel dos atores
As instituições estão funcionando? Embora
legítima, a pergunta é analiticamente pobre. Mas ela é cada vez mais enunciada
com propósitos meramente retóricos. A avaliação das instituições na opinião
pública e entre analistas é marcada por vieses e imprecisões.
As pesquisas de opinião sobre o Poder
Executivo, por exemplo, são influenciadas pelo alinhamento político dos
respondentes em relação ao ocupante do poder, como mostrou Reeves e Rogowski,
em pesquisas em 64
países. A avaliação do Judiciário, por sua vez, tende a ser inversamente
correlacionada à do Executivo, como mostrou Bartels
e Johnson: é positiva quando a do ocupante do Executivo não o é.
A pergunta geral sobre o funcionamento das instituições é também imprecisa por várias razões. Em primeiro lugar, ela exige uma resposta dicotômica —sim ou não—, quando, na realidade, a resposta exigiria uma métrica contínua ou ordinal, de, por exemplo, zero a dez. E mais: as instituições estão funcionando pior ou melhor em relação a quê? Ao passado? A outros países?
Em terceiro lugar, estamos falando do Poder
Judiciário, das instituições eleitorais, do Poder Legislativo, das instituições
reguladoras ou de controle? Do federalismo? Do Poder Executivo? As instituições
informais também contam (como argumenta o Nobel de Economina Douglass North)?
Em quarto lugar, como medir o funcionamento
institucional? A ausência de escândalos de corrupção significa melhor ou pior
desempenho das instituições de controle? O número de pedidos de impeachment
sinalizam mau ou bom funcionamento?
Finalmente, a pergunta pressupõe que
existiria um modelo ideal em relação ao qual ocorreriam desvios. Debate-se o
presidencialismo como se o modelo de separação de Poderes desenhado por Madison
não fosse ele próprio, como defendem alguns analistas, constitutivamente
instável.
Além disso, sabemos que a escolha de
desenho institucional é marcada por "trade offs" pelos quais alguns
valores serão sacrificados em favor de outros. Discutir o tema sem referência a
essas questões torna-se um exercício apenas retórico.
O debate sobre instituições tornou-se hiperinstitucionalista:
uma vez adotado um modelo institucional ou conjunto de regras, supõe-se que
tudo o mais se ajustaria. Tudo o mais neste caso incluiria a própria sociedade.
Ignoram-se os atores. O funcionamento institucional não deriva apenas de regras
institucionais; as instituições são habitadas por atores, cujas preferências,
normas e valores variam amplamente, inclusive em relação em termos de sua
intensidade. Sob certas configurações, esses fatores podem subverter o
funcionamento das instituições.
*Professor da Universidade Federal de
Pernambuco e ex-professor visitante do MIT e da Universidade Yale (EUA).
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