Valor Econômico
BC olha mais do que inércia e expectativa
para decidir aperto
O Banco Central sinalizou mais uma alta de
juro de 0,75 ponto percentual para agosto, dos atuais 4,25% ao ano para 5% ao
ano. Seu plano de voo é retirar todo o estímulo monetário que, nos últimos
anos, procurava levar a inflação, que andava muito baixa, à meta. Em termos
práticos, isso significa uma Selic em 6,5% ao ano. Quais são as chances de o
ritmo de aperto ser mais forte o juro ir ao campo restritivo?
Logo nos primeiros dias após o Comitê de Política Monetária (Copom) sinalizar um aperto de 0,75 ponto, o mercado financeiro passou a atribuir uma probabilidade de um movimento mais forte. As opções de Copom negociadas na B3 chegaram a atribuir uma chance de 59% de uma alta de um ponto na Selic no começo da semana passada. Na sexta, o mercado fechou com uma chance de 53% para alta de um ponto, ante uma probabilidade de 43% para 0,75 ponto.
A precificação de uma alta de um ponto
percentual em agosto parece exagerada, a julgar pela comunicação oficial. A
sinalização do Banco Central é um aperto de 0,75 ponto. A hipótese de que vá
fazer mais do que isso depende de uma evolução mais negativa do cenário
inflacionário. Não tem nada decidido de antemão, mas muitos no mercado
acreditam que sim. Para esse grupo, o Copom já teria feito uma alta de um ponto
na última reunião, de junho, se tivesse tido tempo de sinalizar antes ao
mercado.
O presidente do Banco Central, Roberto
Campos Neto, já negou que o colegiado tenha deixado de fazer o movimento mais
forte apenas porque deixou de comunicar previamente. “Li comentários de que
grande parte da decisão [de alta de 0,75 ponto] teria sido tomada por não ter
comunicado [antes a hipótese de um ponto]”, disse, na divulgação do relatório
de inflação de junho. “Queria enfatizar que não é verdade. A gente teve muitas
oportunidades para comunicar.”
Campos Neto disse que, na verdade, o Copom
queria mais tempo para analisar o comportamento da inflação, em especial dois
pontos citados nos seus documentos oficiais: a evolução das expectativas de
inflação e dos preços mais inerciais, conforme o setor de serviços se recupera.
Desde que o Copom fez essa indicação
explícita dos fatores que acompanha com mais atenção, o mercado financeiro
passou a acreditar que esses são os grandes determinantes de suas decisões. Ou
seja, notícias boas do lado das expectativas têm levado parte dos analistas a
atribuir uma chance maior de alta de 0,75 ponto percentual, enquanto que a
inflação mais pressionada de serviços e preços mais inerciais empurram parte
dos analistas a acreditar em alta de um ponto na Selic.
Na partida, porém, havia um problema nesse
“guidance” feito pelo Copom: o que vale para o comitê, no fim das contas, é a
projeção de inflação no cenário básico para o horizonte relevante de política
monetária e o chamado balanço de risco para a inflação. Expectativas e preços
inerciais são importantes na medida em que afetam tanto as projeções de
inflação quanto o balanço de riscos para a inflação.
Na semana passada, o diretor de política
monetária do BC, Bruno Serra, esclareceu a comunicação de política monetária
para dar o devido peso para esses dois fatores em destaque - e para lembrar
que, no fim, o comitê tem sido disciplinado em seguir um modelo de “inflation
forecast targeting”, ou seja, projetar a inflação, ajustar pelo balanço de
riscos e agir de acordo com os desvios em relação à meta.
“O que a gente pode fazer de melhor é olhar
a inflação prospectiva, condicionantes que vocês todos conhecem, condicionantes
que vão impactar esse modelo [de projeção de inflação], a projeção de inflação,
avaliar o balanço de riscos”, disse Serra num evento do Santander. “Aí sim
tomar a decisão coerente com perseguir o centro da meta no horizonte relevante
[de política monetária], que é 2022 neste momento.”
E como a evolução de preços inerciais entra
nesse arcabouço de projeções de inflação e no balanço de riscos? Serra disse
que, por enquanto, não há nada de diferente em relação ao que já foi divulgado
nos modelos. Quando projeta a inflação, o Banco Central trabalha com um
coeficiente de inércia, ou seja, um número que mostra o quanto a inflação
passada contamina a inflação futura. Segundo o diretor do BC, o Copom não
incluiu no balanço de riscos uma eventual mudança nesse coeficiente de inércia,
por isso não se deve esperar que esse fator tenha um peso maior em agosto.
Nesse evento do Santander, o mercado deu
muito destaque ao fato de Serra ter dito que estamos em “ um momento perigoso”
porque o setor de serviços está se abrindo e pode ter uma pressão inflacionária
adicional de serviços num período em que ainda existem pressões na inflação de
bens. O quanto o Copom, como um todo, está preocupado com esse perigo na volta
dos serviços?
Nesse ponto, temos um fato curioso: embora
o Copom tenha, de certa forma, vinculado seus passos futuros à evolução de
preços inerciais de serviços e Serra tenha falado em “perigo”, o Copom não
considerou na sua última reunião esse fator como importante o suficiente para
entrar no balanço de riscos. No ano passado, por exemplo, o colegiado estava
preocupado com o impulso na demanda do auxílio emergencial, e por isso colocou
esse perigo no balanço de riscos para a inflação.
De fato, a leitura de Serra sobre o perigo
da inflação de serviços é ambígua. Ele destaca o risco de uma pressão maior nos
preços, que está presente não apenas no Brasil como no exterior, mas cita uma
série de fatores que temperam um pouco essa preocupação. O principal deles
talvez seja que, agora, ele não identifica um “salto” relevante de renda que
possa dar uma sustentação aos preços dos serviços.
O diretor do BC também minimizou a
importância dos índices recentes de inflação, das aberturas que o mercado tem
feito para identificar a evolução dos serviços. “Dar peso adicional aos dados
bem da margem só vai confundir o nosso processo decisório, só vai gerar mais
insegurança”, disse, destacando que o que conta é o cenário básico prospectivo
de inflação e o balanço de riscos. Mais uma vez, Serra disse que o BC fará o
que for preciso para cumprir o centro da meta, mas isso significa caminhar
dentro do arcabouço tradicional de decisão.
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