O Globo
É chave para os desdobramentos da grave
crise institucional pela qual passa o Brasil o papel e o comportamento do
presidente do Senado — e, por conseguinte, do Congresso Nacional —, Rodrigo
Pacheco.
Num momento de completo esgarçamento das
relações entre o Executivo e do Judiciário, ele tem de agir por três, porque há
dois outros personagens igualmente cruciais que estão se omitindo de suas
prerrogativas.
Seu vizinho e co-responsável pelo Legislativo, Arthur Lira, está mais interessado em defender interesses próprios e de seu grupo político que com a democracia. Ter recebido a chave do cofre para uma gorda parcela do Orçamento federal, ao mesmo tempo em que define a pauta da Câmara sem ser admoestado nem mesmo pelo próprio governo, são motivos suficientes para Lira ir empurrando com a barriga os abusos de Bolsonaro, enquanto der e lhe for conveniente.
Aras é um caso à parte. Sua omissão é de
tal natureza que faz com que ele desagrade, a um só tempo, seus pares do
Ministério Público Federal, a totalidade de ministros do Supremo Tribunal
Federal, e, cada vez mais, uma grande parcela do Senado, que tenta amaciar em
conversas de bastidores. Senadores que terão de votar sua indicação à
recondução viram embasbacados o mesmo procurador-geral que vê apenas “liberdade
de expressão nas ameaças feitas por Roberto Jefferson a ministros do STF
sugerir que o presidente da CPI, Omar Aziz, poderia ter incorrido em quebra de
decoro ao criticar uma parcela das Forças Armadas. Dois pesos e duas medidas
evidentes, num sinal claro de submissão do representante constitucional da
sociedade ao governo.
Portanto, restou Pacheco como guardião dos
limites republicanos. Seu estilo mineiro, avesso a conflitos, torna sua missão
ainda mais espinhosa. A visita que deverá fazer nesta quarta-feira ao
presidente do Supremo, Luiz Fux, é mais uma sinalização a Bolsonaro de que não
conte com ele para chancelar uma investida contra dois integrantes do Supremo.
O pedido que o presidente insiste em levar
pessoalmente ao Senado para a abertura de impeachment contra Alexandre de
Moraes e Luis Barroso é mais um daqueles pretextos que Bolsonaro inventa para
depois tentar legitimar seus arreganhos autoritários.
Ele sabe que Pacheco não vai instaurar
processo contra os dois ministros, mas, ao anunciar previamente no Twitter sua
intenção e fazer suspense ao longo de dias até consumá-la ele vai fazendo com
que fermente em setores da sociedade e nas redes sociais um caldo de indignação
irracional contra os dois ministros, que depois se generaliza em repúdio ao
Poder Judiciário como um todo. Daí para delírios como a conclamação a um
inexistente poder moderador das Forças Armadas, a partir de uma leitura
golpista do artigo 142 da Constituição, é o caminho natural.
Caminho trilhado sem um pingo de parcimônia
pelo general Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional, e
vocalizado também, nos bastidores, por outros integrantes do primeiro escalão
bolsonarista, militares e até mesmo civis.
O que a absoluta falta de discernimento e
cuidado de Bolsonaro não lhe permite enxergar é que ele testa os limites da
democracia e da tolerância com ameaças iliberais no momento em que lhe escapam
os apoios que conservava espantosamente até aqui, a despeito de não trabalhar,
de sua gestão criminosa da pandemia e de uma economia que patina entre os
indicadores inaceitáveis da vida real e a anunciada intenção de arrombar os
cofres públicos já depauperados para vencer as eleições.
Por todas essas circunstâncias, não é
trivial a responsabilidade colocada sobre o presidente do Senado. Cabe a ele
deixar de lado, por ora, a ênfase num diálogo que Bolsonaro já deixou claro que
não respeita, e fazer ver ao presidente que existem não só juízes, mas também
congressistas.
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