Folha de S. Paulo
Patético, mediocridade e vergonhoso são
três ingredientes solidários dos atos de 7 de Setembro
Tudo pode acontecer no 7
de Setembro entre a mera reprise das manifestações bolsonaristas e, no
outro extremo, eclosões
de alta gravidade.
As ocorrências podem ser tão mais variadas
quanto maior o número, que se anuncia alto, de cidades com manifestações
programadas.
Em todo esse colar de imprevisões, já têm
lugares assegurados três ingredientes solidários: o patético, a mediocridade e
o vergonhoso.
É possível, mas sem indício nítido, que os pretendentes ao golpe obtenham o que lhes tem sido a carência impeditiva. Os militares bolsonaristas precisam de um pretexto, sem o qual sobram dificuldades até para conter a oficialidade restante, quanto mais para sustentar-se ante reações externas e o mal-estar interno.
Na atual situação do país, tudo deve ser
pensado, creio, a partir desse problema político e técnico.
A agitação
de Bolsonaro em Brasília será na parte da manhã. Como programa estar
na onda paulista a meio da tarde, só por perda do controle haverá de manhã, em
Brasília, ocorrências que o retenham aí. O risco forte chegaria à tarde. De
encontro ao dispositivo de defesa que o Supremo e o Congresso consigam montar.
Sem confiar muito, é verdade, para outra
vez enfrentar a situação patética de dois
Poderes da República a proteger-se do governante que empossaram e
sustentam no outro Poder.
As condições circunstanciais para um golpe
já no 7 de Setembro precisariam de ações muito traumáticas do bolsonarismo, em
especial nas ditas manifestações de São Paulo e Brasília.
E isso não se limita a arruaças. A provável
intenção de Bolsonaro é iniciar uma situação conflituosa que, desenvolvendo-se,
dê aos bolsonaristas militares o pretexto para exterminar a democracia "em
defesa da democracia".
É
o roteiro Trump, consta que elaborado pelo fascista Stefen Bannon,
revisitado pelo discípulo Eduardo Bolsonaro no mês passado.
Trump
discursou mandando os apoiadores para o Capitólio com a missão, puxada
por incitadores, de deflagrar ali as circunstâncias impróprias para a
instalação de um governo inexperiente, em organização, dali a duas semanas.
Se adiada a posse de Biden, que a campanha
"Posse dia 20" inviabilizou, estaria dado o grande passo para a
"solução pacificadora": anular a eleição contestada.
Aqui, Bolsonaro começou os ataques à
eleição ainda na campanha, o que poderia ser um preparativo a arruaça e a
intervenção militar em reação à esperada derrota.
Bolsonaro venceu, mas deixou, para
posterior interpretação, os primeiros e inequívocos sinais de que sua
candidatura veio de uma articulação externa. Assim como está indiciado sobre a
Lava Jato, curitibana nas aparências.
No golpismo de Trump e do caudatário
Bolsonaro, a convulsão pode ser vista como o trampolim para o golpe, sendo
menos provável converter-se em golpe, propriamente.
Não falta quem anteveja neste
7 de Setembro já o começo da guerra civil. Isso exigiria alguma base
armada no lado democrata, que não a tem (por ora?).
O dispositivo
militar e policial de defesa da ordem constitucional já mostrou de que
lado está: a rigor, é o lado em que esteve sempre que a ordem constitucional,
os valores democráticos e os direitos civis foram envenenados —e logo
sucumbiram.
Faltam militares e policiais autênticos.
Nas instâncias civis, entre os encarregados de representar o Estado de Direito
prevalecem a mediocridade, a venalidade política, a corrupção.
No patronato, o acúmulo de riqueza inútil é
obsessivo e a indiferença pelos meios é o comum. Para esses segmentos, o país e
suas multidões não têm interesse, é indiferente haver democracia ou
autoritarismo, avanço ou retrocesso econômico, emprego ou pobreza: eles ganham
sempre.
Por mais de dois anos e meio o
Brasil vê, inerte, a construção de um golpe. Por criminosos e asseclas.
Golpe que o inviabilizará talvez para sempre. Metade, ou mais, da população
medianamente informada está aturdida. O país, parado, à espera.
É vergonhoso.
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