O Globo
O presidente Bolsonaro acrescentou nos
últimos dias mais uma preocupação às suas desditas. Além do receio de que um
dos seus filhos, ou alguns deles, sejam presos em decorrência dos inquéritos
abertos no Supremo Tribunal Federal (STF) devido aos desvios de dinheiro
público (peculato) com as “rachadinhas” dos salários de servidores nos seus
gabinetes parlamentares, ele teme que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) o
torne inelegível para a eleição do ano que vem.
Não é por acaso que escolheu como alvos preferenciais os ministros Alexandre de
Moraes e Luis Roberto Barroso. Este é no momento presidente do TSE, o outro o
será durante a eleição presidencial. No Supremo, Bolsonaro acha que está
resguardado, pois uma eventual punição depende de denúncia do Procurador-Geral
da República, e não há indicação de que a renovação de seu mandato o tornou
mais independente.
Ao contrário, como quer ir para o Supremo, Augusto Aras depende da reeleição de
Bolsonaro. A próxima vaga será em maio de 2023, com a aposentadoria do ministro
Ricardo Lewandowski, e em outubro do mesmo ano, com a saída da ministra Rosa
Weber. Mesmo que, como tudo indica, o escolhido André Mendonça não venha a ser
confirmado agora pelo Senado na vaga do ministro Marco Aurélio Mello,
dificilmente Bolsonaro abrirá mão do apoio certo de Aras ao duvidoso de um novo
Procurador-Geral.
A possibilidade de cassação da chapa Bolsonaro/Mourão pelo TSE é bastante
difícil, depois que o tribunal deixou de cassar a chapa Dilma/Temer por
“excesso de provas”. Mas há também hoje “excesso de provas” contra a campanha
de Bolsonaro, por abuso do poder econômico. Se por alguma manobra
política/jurídica chegar-se ao ponto de um consenso em torno do afastamento de
Bolsonaro, o vice-presidente Hamilton Mourão assumiria a presidência sem nenhum
problema, segundo avaliação de militares, e poderia se candidatar à reeleição
em 2022.
Seria, por caminhos transversos, uma terceira via com apoio militar, depois de idealmente ter colocado ordem na bagunça institucional em que vivemos. O destino de Mourão está atrelado a essas variáveis, pois ele prefere continuar morando em Brasília. Uma candidatura a senador, no Rio, onde morava, ou Rio Grande do Sul, onde nasceu, teria preferência à possibilidade de vir a ser candidato ao governo do Rio de Janeiro. Mesmo que apareça neste momento à frente do deputado federal Marcelo Freixo nas pesquisas de opinião, é uma hipótese que está descartada pelo momento.
Ao mesmo tempo há um trabalho no Palácio do Planalto, que envolve ministros militares e o Chefe do Gabinete Civil Ciro Nogueira, para reaproxima-lo de Bolsonaro, o que vem se demonstrando difícil. Mesmo distanciado, está convencido de que não haverá arruaças nas manifestações marcadas para o Sete de Setembro, mesmo que Bolsonaro esteja esticando a corda ao máximo às vésperas da data, como se ela significasse a arrancada final para sua tomada do poder pela força, com apoio popular.
Bolsonaro tem vivido nos dias recentes em um mundo paralelo, e finge estar certo de que montam contra ele uma armadilha para impedi-lo de competir, ou então uma apuração fraudada para derrotá-lo. Seriam pretextos para um contragolpe, como classifica suas ações antidemocráticas.
Nada indica que terá sucesso, mas é capaz de provocar grandes confusões em Brasília e em São Paulo, onde discursará para seus seguidores. O discurso na Capital deve ter um tom mais contido, porque de nada adiantará tentar estimular, à la Trump, a invasão do Congresso ou do Supremo. O esquema de segurança na Praça dos Três Poderes estará reforçado, e a multidão contida à distância.
Mas, na Avenida Paulista, território de seu arqui-inimigo João Doria, Bolsonaro pode ficar tentado a insuflar seus seguidores à radicalização, o que, dependendo do que acontecer, pode acelerar as medidas judiciais contra ele. Quando escolheu o General Hamilton Mourão para seu vice, um dos zeros de Bolsonaro comemorou, dizendo que a oposição pensaria duas vezes antes de tentar impedi-lo. O feitiço virou contra o feiticeiro, e Mourão passou a ser visto por setores militares e políticos como possível solução para o problema em que Bolsonaro se tornou.
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