O Globo
O ano econômico de 2022 já começou. O país
vai crescer pouco, os juros subirão em pleno ano eleitoral. A inflação prevista
para o fim de 2021 aumentou e fechou o espaço fiscal no Orçamento, a crise
hídrica deixará custos que continuarão pesando nas contas de luz de 2022. A
turbulência política crônica criada por Jair Bolsonaro elevou a incerteza a
níveis inéditos desde a redemocratização. Somando tudo isso, os economistas
estão voltando aos seus cálculos para reduzir as projeções do PIB.
O chamado espaço fiscal é o que daria ao
governo a chance de aumentar os gastos com apelo eleitoral. É dado pela
diferença entre a inflação em 12 meses até junho e a de dezembro. O teto de
gastos é corrigido pela IPCA até junho, mas as despesas obrigatórias são
corrigidas pelo INPC do ano inteiro. Quando o IPCA em junho chegou a 8,35% o
governo se animou. Calculava que a taxa do ano ficaria em 6,5%. Isso faria o
teto subir mais do que as despesas. Portanto, haveria uma sobra líquida de R$
33 bilhões. Mas a inflação subiu mais do que se imaginava e vai desacelerar
menos nestes meses finais. Nos cálculos de Luis Otávio Leal, economista-chefe
do Banco Alfa, esse espaço está praticamente zerado.
— Pelas minhas contas, a diferença entre os dois índices será de apenas 0,3 ponto percentual. O espaço é irrisório agora — diz Leal.
O problema é que o Orçamento foi para o
Congresso com parâmetros completamente errados. Prevê um crescimento de 2,5% em
2022, o que não ocorrerá, e uma inflação este ano de 6,5%, que será superada.
Para fechar esse Orçamento e ainda sobrar dinheiro para os gastos que Bolsonaro
quer fazer no ano eleitoral só haveria uma saída: não pagar integralmente os
precatórios. Por isso, o ministro Paulo Guedes foi ontem bater na porta do
ministro Luiz Fux. Ele queria um aval do Conselho Nacional de Justiça para não
pagar integralmente as dívidas judiciais. E ouviu do ministro Fux que ele tem
que ir ao Congresso aprovar a PEC dos precatórios.
O governo Bolsonaro está ficando sem espaço
para o seu objetivo de populismo econômico. Será um ano difícil e em grande
parte isso é resultado dos erros sequenciais do presidente na condução do país.
Na política, criou conflitos, na área institucional, fez ameaças, na saúde,
gastou tempo e dinheiro público para sabotar as melhores práticas sanitárias.
Isso aumentou o número de mortes e prejudicou a economia. Bolsonaro é
inflacionário. Suas crises batem no dólar, que contamina outros preços.
O presidente do Banco Central, Roberto
Campos Neto, avisou que fará “o que for necessário” para cumprir a meta de
inflação. É isso que se ouve também dentro do Banco Central quando se fala
sobre a possibilidade de ter que subir juros mesmo em ano eleitoral. Esse
remédio amargo será inevitável porque o ano terminará com a inflação alta.
A crise hídrica deixará herança maldita
para o ano que vem. A térmicas caras que estão sendo usadas agora geram um
déficit que está sendo passado para as contas e continuarão no ano que vem.
Houve uma discussão dentro do governo. A Aneel queria aumentar em 100% a
bandeira vermelha, mas esse acréscimo valeria só este ano. A área econômica
discordou e acabou vencendo a discussão. A alta foi menor, mas a sobretaxa
valerá por mais tempo, entrando inclusive em 2022. Quando as chuvas vierem elas
não vão recompor os reservatórios.
A boa notícia é que tem energia nova
entrando no sistema, de leilões que foram feitos no governo Temer. Serão 7
gigawatts a mais de potência instalada, principalmente eólica, solar e
biomassa, segundo a consultoria PSR. Isso dá um reforço. Quanto menos energia
não hidrelétrica houver no sistema, melhor. Mesmo assim é inescapável que a
crise alcance o ano que vem com preços altos e o esforço de recomposição dos
reservatórios.
A pior sombra que paira sobre 2022 é
resultado do governo Bolsonaro. Com seu projeto retrógrado em todas as áreas,
como a ambiental, com suas omissões em setores decisivos, como educação, com
projetos de reforma que já chegam distorcidos no Congresso, como a reforma do
IR, o governo reduziu o horizonte do país. Agora a economia está em “modo
defesa” como me disse o economista José Roberto Mendonça de Barros ao definir a
atitude dos investidores neste momento. E, quando investidores da economia real
congelam investimentos, o resultado é menos crescimento e menos criação de
emprego.
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