O Globo
Vale tanto quanto uma cédula de R$ 3 a nota
em que Jair Bolsonaro usa o marqueteiro de Michel Temer como ghost-writer para
ajoelhar no milho diante do Supremo Tribunal Federal e fingir um arrependimento
que não tem das ameaças de golpe que sinceramente proferiu no 7 de Setembro.
Quem fingir que acredita no propósito de se
moderar, de obedecer aos desígnios do Judiciário e de zelar pela independência
e harmonia dos Poderes feito por Temer é cínico, burro ou ingênuo. Ou um mix
dos três.
Cínico será o alívio do mercado, dos
ministros e dos deputados da base aliada.
O primeiro grupo tratará de tentar
recuperar os prejuízos dos últimos dias.
Os integrantes do primeiro escalão buscarão
para o espelho, para o travesseiro e para os filhos uma justificativa plausível
para continuar servindo a um governo que busca uma ruptura institucional.
E os nobres parlamentares da base aliada encontrarão a desculpa necessária para continuar mamando nas tetas do Orçamento até exauri-las, sem precisar fingir que estão pensando a sério em abrir um processo de impeachment.
Ingênuo será o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM), se, com base nessa encenação tosca, deixar de devolver a Medida Provisória que susta parte do Marco Civil da Internet ou se receber os caminhoneiros que fazem chantagem com o país com uma paralisação que foi convocada e insuflada por Bolsonaro em pessoa.
Também figura no rol dos ingênuos, desta
vez com uma dose de vaidade por ser lembrado e chamado em casa, Michel Temer,
ao associar sua já questionada passagem pela Presidência (que deixou com
recordes de rejeição) à indefensável e incorrigível gestão de seu sucessor.
Ademais, a pretexto de fazer um favor ao
país, Temer presta um desserviço histórico. Porque ajuda a escamotear o real
propósito de Bolsonaro de solapar a democracia e dinamitar as instituições aos
poucos todos os dias.
Hoje, o presidente se finge de cordeiro,
pede desculpas e faz um ato de contrição. E o faz porque é, além de golpista e
inepto para o cargo, atavicamente covarde e se pela de medo da deposição e da
prisão — dele e dos filhos. Só por isso. O país que se exploda. É nesse avião
que Temer aceitou embarcar.
O último grupo a acreditar na nota de R$ 3
de Bolsotemer é o dos burros, integrado pela ala mais bovina dos bolsominions.
Os comentaristas a soldo, pseudojornalistas, blogueiros golpistas arrancaram os
poucos cabelos que têm e arreganharam as gengivas inflamadas para xingar o mito
de todos os nomes feios que conhecem.
Já lançam Tarcísio Gomes de Freitas, o
ex-técnico transformado em minion pelo chefe, para lhe suceder na eleição de
2022!
De tão desarvorados, se esquecem de relaxar
e lembrar que amanhã mesmo Bolsonaro já estará de volta ao script de
protoditador de anteontem, mandando às favas a máxima temerista de que verba volant, scripta manent (calma,
Centrão, a verba que voa é a palavra, a do orçamento secreto fica).
Que os que estavam vigilantes e preocupados
no dia 8 sigam assim e não desviem de seu papel constitucional de conter um
presidente disposto a lhes sentar o relho e empastelar as eleições.
Os inquéritos de Alexandre de Moraes têm de
seguir, a MP do Marco Civil tem de voltar para o Planalto com selo de endereço
não encontrado, as investigações do TSE sobre as mentiras de Bolsonaro quanto
ao pleito não podem parar, a CPI tem de concluir seu relatório com imputação
dos inúmeros e hediondos crimes cometidos pelo presidente e pelo sumido general
Pazuello, e a indicação de André Mendonça ao STF tem de ser rejeitada, porque
quem o indicou quer fechar o Supremo.
Essa é a pauta de resistência possível e
viável, uma vez que o impeachment, conforme escrevi aqui, não sairá.
Um comentário:
Arrependida pelo seu voto, Vera Guimarães?
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