quarta-feira, 27 de outubro de 2021

Daniel Rittner - Leilões de infraestrutura atraem pesos-pesados

Valor Econômico

Haverá disputa na Dutra, BR-381 e nos terminais em Santos

Ecorodovias e CCR entregaram ontem, na B3, seus lances para a relicitação da Via Dutra (Rio-São Paulo). As duas empresas vão competir, na sexta-feira, pelo novo contrato da principal concessão rodoviária do país.

O desconto oferecido sobre a tarifa-teto de pedágio tem um limite de 15%. O governo avalia que ambas vão chegar a esse percentual e entrar na segunda rodada da disputa, que definirá o vencedor pelo pagamento da maior outorga. Para a CCR, está em jogo manter sua concessão mais nobre. Para a Ecorodovias, roubar o “filé mignon” de sua maior concorrente. Dessa briga, depois de amanhã, vai emergir a líder do mercado rodoviário.

Foi uma estratégia do governo ter a relicitação da rodovia, que exigirá aportes de quase R$ 15 bilhões, antes dos demais leilões no setor. Por quê? O capital imobilizado no contrato da Dutra, que terá uma nova pista na Serra das Araras e a modernização da BR-101 (Rio-Santos) como exigência adicional, é tão grande que provavelmente afastará o grupo vencedor de outras disputas. Quem ganhar o certame agora leva o ativo mais cobiçado entre todas as estradas oferecidas. Quem perder fica livre para entrar pesado nos próximos certames.

Os últimos leilões de rodovias têm atraído poucos estrangeiros. A CCR e a Ecorodovias, além de pequenas empresas regionais que formaram consórcios em casos específicos, vêm sendo a salvação da lavoura. Por isso, havia preocupação quanto à sequência das licitações. Mas há sinais bem positivos. O ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas, deve adiar por algumas semanas o leilão da BR-381/262 - entre Minas Gerais e Espírito Santo - por causa do pedido de grupos interessados que querem mais tempo para fazer o cálculo de seus lances. Ele está marcado para 25 de novembro. O fundo Pátria, além das espanholas Sacyr e Acciona, foram ao governo deixando claro que esse prazo adicional é para refinarem suas propostas. A CCR, dependendo do que acontecer na Dutra, também quer entrar. O contrato prevê investimentos de R$ 7,3 bilhões e duplicação integral da chamada “Rodovia da Morte”.

Com as indicações de que o leilão da BR-381/262 será bem-sucedido, o foco do ministério se volta para as Rodovias do Paraná, um conjunto de seis lotes de estradas federais e estaduais que somam 3.368 km e vão requerer R$ 43 bilhões em aportes privados. De forma surpreendente para o próprio Tarcísio e equipe, essas rodovias foram objeto de forte interesse no “road show” que fizeram em Nova York e teriam entrado na lista “top 5” entre ativos os logísticos no Brasil.

Um dos investidores que mais prometeram estudar as rodovias foi o fundo australiano Macquarie Asset Management, que tem US$ 562 bilhões em ativos por 22 países - mas nada aqui. Em concessões de infraestrutura, o histórico de demanda é valioso, por diminuir riscos associados a estimativas errôneas. Esse aspecto joga a favor da relicitação no Paraná.

Passando para portos, o governo agendou para 19 de novembro o leilão de dois terminais voltados para granéis líquidos (combustíveis) em Santos, o STS 08 e o STS 08A. Será o maior arrendamento portuário da história, com investimento de quase R$ 1 bilhão em expansão da capacidade. Também para essa disputa, as sinalizações são ótimas. Raízen, Santos Brasil, Catallini / Spolt, Ultracargo, Ageo e Transpetro podem oferecer propostas. Há chance zero de “vazio” (um leilão sem ofertas).

Pesos-pesados do setor já estão de olho também no leilão do STS 10, o novo superterminal de contêineres em Santos, que será licitado só em 2022. China Merchantes, a filipina ICTSI e a PSA (Port of Singapore Authority) estão de olho. Santos Brasil e BTP, que brigam pela liderança no porto, não querem perder a chance de crescer. As sócias da BTP - APM Terminals (subsidiária da dinamarquesa Maersk) e a suíça TIL - também cogitam participar sozinhas.

Por incrível que pareça, há dúvidas em torno de dois ativos normalmente tidos como “joias da coroa”. No caso do aeroporto Santos Dumont (RJ), a visão do governo federal colide com os planos do Estado e da prefeitura, o que provoca insegurança nos investidores. Em Congonhas (SP), consultores alertam que o cenário mudou. Ninguém sabe se o ritmo das viagens corporativas algum dia voltará aos patamares pré-pandemia. O Zoom veio para ficar. Com mais e-commerce e o receio de circular em ambientes fechados, também por causa da covid-19, haverá menos apelo nos “aeroshoppings”. Além dos blocos capitaneados por Santos Dumont e Congonhas, o governo leiloará juntos os aeroportos de Belém e Macapá. Para esses dois, o mercado aposta na francesa Vinci, que já arrematou neste ano os terminais da região Norte, incluindo Manaus. “Não precisa nem fazer leilão”, diz uma fonte.

Bobos somos nós

A MP 1.055, medida provisória da crise hídrica, não deve mais ser votada no Congresso e com isso perderá validade no dia 7 de novembro. A recuperação dos reservatórios nas últimas semanas amenizou o risco de blecautes e tira um pouco da urgência de decisões tomadas pela “Câmara do Apagão”, apelido da Câmara de Regras Excepcionais para Gestão da Crise Hidroenergética (Creg), criada pela MP. De mais a mais, outra medida provisória pode ser editada com a virada do ano legislativo, se for necessário.

Houve intensa articulação de associações da indústria, do Ministério da Economia e até do Tribunal de Contas da União (TCU) contra uma emenda introduzida pela Câmara dos Deputados que repassaria a conta de construir gasodutos em todo o país para a tarifa dos consumidores de energia. Uma fatura em torno de R$ 33 bilhões para levar gás natural até localidades do país onde o insumo hoje não chega. Seria o desfecho perfeito, para a turma que gosta de socializar custos e embolsar benefícios, de outro “jabuti”: a exigência de novas usinas térmicas no Norte, Centro-Oeste e Nordeste como contrapartida à privatização da Eletrobras. Falta justamente o combustível para viabilizá-las.

Agora, diante da tentativa de empurrar para a sociedade mais um gasto bilionário, preferiram ver a MP caducar. Dizem por aí que a esperteza, quando é muita, engole o dono. Quem dera. Bobos somos nós. O Centrão - aliado a um empresário conhecido pela defesa dos gasodutos - só vai esperar o próximo projeto de lei ou medida provisória sobre energia para atacar novamente. Por ora, devemos um chope a São Pedro.

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