Folha de S. Paulo
Mutreta no teto faz com que juros deem
salto mortal em poucos dias
Quem olhar as taxas
de juros no mercado de atacado de dinheiro verá que estamos fritos no
curto prazo. Mais adiante, ainda sendo otimista, verá uma névoa de incerteza
com cheiro de fumaça de recessão. As taxas para empréstimos de curto prazo
deram um salto, uma previsão
de inflação alta e de que o Banco
Central vai aumentar a Selic mais rápido, bidu.
A taxa de juros de um ano no atacadão de dinheiro foi para perto de 11,4%, patamar para onde a Selic deve migrar até o início do ano que vem, segundo apostas, pressões e chutes informados no mercado desta terça-feira (faz duas semanas, estava em 8,9%). As taxas "mais longas" ficam altas a perder de vista, uma mistura de sinais de incerteza espessa com recessão. Não é um assunto esotérico. Essa coisa vai estourar nas nossas fuças já machucadas, que dirá na dos mais pobres.
Jair
Bolsonaro, Paulo Guedes e
o centrão envenenaram de vez um cenário que já azedara desde meados do ano, por
culpa deles também. Sim, o sururu recente foi causado pela gambiarra, pelo
casuísmo e pela incompetência
do plano de derrubar o teto de gastos, tal como o fizeram. Era previsível
que fosse dar besteira. Mas deu muita besteira e rápido. Agora, está na conversa
até um "choque de juros".
Por incrível que pareça, quem sabe a
esquerda ajude a aliviar essa barra, derrubando
na Câmara os planos de Bolsonaro, Guedes e Arthur Lira. O pessoal que
passava pano para o tiozão do Zap econômico dado a mentiras lunáticas talvez
tenha de mandar um telegrama de felicitações para PSOL e PT. Mas isso é ainda
muito especulativo, "protesto".
No atacadão de dinheiro, de empréstimos
entre bancos e para o governo, grosso modo, é que se fazem estimativas de juros
de curto prazo, de quanto será a taxa Selic, aquela definida pelo Banco Central periodicamente,
e de quanto vai custar para o governo tomar empréstimos a fim de cobrir seus
déficits e rolar sua dívida. Nesta quarta-feira, vamos saber o tapa para o alto
que o BC vai dar na Selic.
Em poucos dias, as taxas de juros
"mais curtas" deram um salto mortal e ficaram mais parecidas com as
"mais longas" (a curva está quase "flat", plana, em nível
alto). As diferentes taxas de juros para diferentes prazos formam pontos da
linha de um gráfico chamado "curva de juros". Interpretar a
"curva de juros" por vezes é como ler o futuro na borra de café, nas
folhas de chá ou nas entranhas dos urubus. Dado o contexto imediato, parece
claro que a alta foi causada pela ruína promovida por Bolsonaro, Guedes e Lira.
Regredimos a algum ponto do tumulto entre 2015 e 2016.
Caso não se invente um conserto rápido, que
dê conta de parte do estrago, a inflação será mais alta porque acham que vai
ser e porque o preço do dólar não vai cair. A perspectiva de que a dívida
do governo volte a crescer sem controle vai também aumentar o custo de
financiamento do governo e, por tabela, da economia inteira (crédito bancário,
fundos que as empresas levantam no mercado de capitais etc.).
Parte do estrago já está feita. O que ainda
pode ser salvo de 2022 ou 2023 viria por meio de uma solução que permita pagar
auxílio aos pobres, necessária e inevitável, com a manutenção desse teto de
gastos escorado com madeira podre —sim, seria possível inventar uma espécie de
teto novo, mas essa escória no poder é incapaz de fazer isso.
É fácil perceber que não está se discutindo
nada de sério a respeito do que fazer do país, mas apenas como conter os danos
da nova ofensiva de destruição de Bolsonaro-Guedes.
Nenhum comentário:
Postar um comentário