O Estado de S. Paulo
PEC 182 propõe excluir do limite de gastos as despesas com benefícios do RGPS e o excesso de precatórios previsto para o ano seguinte
O Orçamento do governo federal precisa do
teto de gastos, e nossos concidadãos mais vulneráveis e mais duramente
atingidos pela pandemia também precisam de um teto para morar, de comida no
prato e de uma renda básica para viver dignamente. O governo alega que esses
dois objetivos são incompatíveis, mas existe no Congresso uma proposta de
legislação tecnicamente superior, que permite ao Executivo financiar novos
gastos com assistência aos mais vulneráveis, mas preservando o arcabouço
institucional na área fiscal e evitando postergar infinitamente o pagamento de
dívidas do governo já sancionadas em definitivo pelo Judiciário (os afamados
precatórios).
A proposta do governo federal para mudar a
forma de calcular o teto de gastos, combinada com a fixação de um limite de
pagamento de precatórios, pode ser encarada como uma bomba fiscal. Trata-se de
uma aventura que terminará com a sociedade toda sem saber o rumo que o País
resolveu seguir, vivendo com juros altos e inflação descontrolada.
Após a aprovação da reforma da Previdência em 2019, apresentei a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 182, com o objetivo de aperfeiçoar e harmonizar as instituições e regras fiscais em vigor no País. São pouquíssimos artigos, mas com efeitos importantes: amplia controladamente o espaço fiscal no teto de gastos e institui no Brasil um sistema de revisão periódica dos gastos públicos. É uma mudança que permite manter o Teto Constitucional até 2036, com possibilidade de alteração em 2026, tal como estabelece a Emenda Constitucional promulgada no final de 2016.
A proposta exclui as despesas com
benefícios previdenciários da base de cálculo do teto de gastos de forma
retroativa a 2016. No Orçamento do próximo ano, essa medida abre espaço de R$
9,2 bilhões. O texto também deveria retirar o excesso de precatórios previsto
para o ano subsequente, em relação ao que se espera gastar no ano corrente, o
que amplia o espaço fiscal adicional para R$ 43,2 bilhões.
Uma simples matemática ajuda a entender por
que é uma boa medida excluir o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) do
limite para gastos. As despesas com previdência social ocupam cerca de metade
do teto do Poder Executivo e crescem a taxas bem acima do indicador que corrige
anualmente esse limite de gastos. Isso quer dizer que as demais despesas do
Orçamento, como investimentos, saúde e educação, serão comprimidas pelo
crescimento do RGPS, comprometendo o suporte estatal em áreas vitais para o
desenvolvimento do País.
Propostas que buscam excluir do teto os gastos
com investimentos, a saúde e a educação apenas acentuam o principal problema do
teto: o efeito de compressão do RGPS sobre as demais despesas do Poder
Executivo. São propostas que acabam com a regra constitucional aprovada em
2016.
Excluir do teto o excesso de precatórios
envolve questões fiscais e morais. Primeiro, abrir espaço fiscal limitando o
pagamento de precatórios, como propõe o governo federal, é uma pedalada fiscal:
gasta-se mais gerando dívida que não aparece nas estatísticas fiscais oficialmente
divulgadas pelo Banco Central e pelo Tesouro Nacional. Segundo, é simplesmente
um calote. O País não pode sinalizar ao mundo que deixa de pagar despesas
decorrentes de sentenças judiciais.
A aprovação da PEC 182 é oportuna porque
abre espaço fiscal de R$ 43,2 bilhões no teto, viabilizando uma agenda social
indispensável para enfrentar a fome e a pobreza extrema. Por outro lado,
permite quitar as dívidas com precatórios, dando exemplo de responsabilidade
aos credores do Estado brasileiro.
A PEC 182 também avança propiciando
inovação institucional. Adotando princípios gerais de um sistema de revisão
periódica de gastos públicos, lá fora conhecido como
Spending Reviews, a PEC coloca o País na
rota dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE) em matéria de governança fiscal. Mais importante: busca instituir no
País um modelo de gestão fiscal que pode revolucionar a forma de discutir o
orçamento público. Não há quem possa racionalmente opor-se à revisão periódica
dos gastos públicos, com transparência e método racional envolvendo toda a
administração pública.
Sobre a proposta do governo, tenho pouco a
dizer: é uma bomba fiscal. Sua fórmula de correção do teto abre espaço fiscal
comprometendo o planejamento orçamentário, já que o Orçamento do ano
subsequente será enviado ao Congresso sem a definição do teto que deveria
orientar a gestão dos recursos públicos. Aí, sim, transforma nosso Orçamento em
peça de ficção. Sobre o limite de pagamento de precatórios, convenhamos, é calote,
é pedalada, é tudo, menos responsabilidade fiscal.
As lideranças do Poder Executivo e do
Congresso Nacional devem entender que o País está à beira de um precipício
fiscal. Nunca foi tão importante priorizar a assistência social e os gastos que
permitem retomar o caminho da prosperidade. Precisamos manter a parcela da
sociedade mais vulnerável protegida por um teto bem construído, sem inflação
fora do controle e longe das taxas de juros elevadas.
*Senador (PSDB-SP)
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