Folha de S. Paulo
Banco pediu um tempo e vai pensar na
'relação' antes de chutar o pau da política monetária
O Banco Central fez
o mínimo ou o básico. Aumentou
a taxa de juros básica, a Selic, para 7,75% ao ano. Aumentou o ritmo
também: vinha na casa de 1 ponto percentual por reunião, foi para 1,5 ponto
agora. Em dezembro, afora milagres, repete essa dose. A Selic
então terminaria este 2021 em 9,25% ao ano, o maior nível desde meados de
2017.
Foi o maior salto da Selic em 19 anos,
desde que Lula da Silva estava para assumir o governo, depois do pânico da
eleição, desvalorização brutal do dólar e "medo do socialismo".
O salto apenas não foi maior porque o
pessoal do BC ainda parece acreditar que Jair
Bolsonaro, Paulo Guedes e
o centrão não vão conseguir chutar
o pau do teto. Hum.
Por que "mínimo" ou
"básico"? Na praça financeira ou, pelo menos, entre seus porta-vozes,
um aumento menor do que 1,5 ponto percentual significaria que o Banco Central
teria jogado a toalha quanto à inflação de 2022, correndo o risco de perder o
controle para 2023.
A fim de temperar esse "mínimo" ou "básico", deixou uma porta aberta para um aumento maior do que 1,5 ponto na próxima decisão, em dezembro. Isto é, não deu de barato que governo e Congresso vão mudar de vez o teto de gastos federais. Por ora, na linguagem do comunicado em que o BC explicou sua decisão, o BC chamou o sururu de "recentes questionamentos em relação ao arcabouço fiscal", que "elevaram o risco de desancoragem das expectativas de inflação, aumentando a assimetria altista no balanço de riscos".
Isto é, o risco de o teto cair pode levar a
inflação mais alta, mas não está certo que vá cair, considera o BC, ao menos da
boca para fora. O estrago já feito nas expectativas e no crédito do governo
seria compensado pela alta de 1,5 ponto da Selic agora e em dezembro. A
inflação estouraria de longe a meta deste 2021, ficando em 9,5% (meta de
3,75%), mas ficaria razoavelmente no alvo em 2022 (4,1%) e praticamente na
mosca em 2023 (3,1%).
Em resumo, o Banco Central pediu um tempo e
vai pensar na "relação" antes de chutar o pau da política monetária.
O projeto de Jair Bolsonaro, Paulo Guedes e Arthur Lira ainda seria apenas um
"questionamento" do teto.
O que não sabemos, a esta altura da noite
da quarta-feira, é se os donos do dinheiro e seus administradores vão gostar
dessa conversa (a leitora pode não gostar de "o mercado", mas é na
praça financeira, no mercado de dinheiro, que a coisa se decide).
Segundo alguns palpites de gente informada,
parece que sim, os donos do dinheiro vão dar um tempo também. Não se sabe
apenas se os juros da praça vão descer do nível calamitoso de agora ou ficar na
mesma.
E daí se não gostarem? Teremos juros mais
altos na praça e, assim, o pessoal estará dizendo que o BC foi em certa medida
desmoralizado.
No breve comunicado desta quarta-feira, o
BC diz que a inflação pode vir a ser menor se os preços de commodities derem
uma acalmada e, como parece estar acontecendo, a atividade econômica aqui
continuar sendo mais fraca do que o esperado. Ou seja, se for um tanto ruim,
vai ser bom (para a inflação).
Como disse Bolsonaro ainda
nesta quarta-feira, "o mercado é um nervosinho. Um nervosinho.
Qualquer negocinho aumenta a taxa de juros a longo prazo, perdeu mais de R$ 50
bilhões. É assim que acontece".
Vamos ver o que vai ser dos nervosinhos. Em um mês, a taxa de juro de um ano subiu 2,3 pontos percentuais, um massacre. Junto de outros estragos (dólar, Bolsa, percepção de risco, desconfiança geral dos patetas perversos no poder), foi o bastante para jogar as previsões de crescimento de muito pouco para nada (redução da renda, PIB, per capita) ou recessão mesmo.
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