O Globo
Todas as pesquisas de opinião disponíveis
no Brasil mostram que, se as eleições presidenciais fossem hoje, teríamos um
segundo turno entre Jair Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva. As projeções indicam
ainda que o petista ganharia do presidente por larga margem. Nos últimos meses,
os índices de popularidade de Bolsonaro têm derretido.
Esses fatores estão orientando a estratégia
da esquerda, que, assim como parte da opinião pública, calcula seus movimentos
para 2022 baseando-se na presunção de que Bolsonaro já era. Parando para
analisar com mais calma os fatos dos últimos dias, porém, a coisa muda de
figura.
A CPI da Covid aprovou na terça-feira seu relatório pedindo o indiciamento de Bolsonaro por nove crimes, mas encontrará na Procuradoria-Geral da República uma barreira sólida — Augusto Aras, que já está bolando formas de postergar qualquer iniciativa a respeito.
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, deu sinais de que não pretende fazer avançar
nenhum eventual pedido de impeachment decorrente da CPI.
Tudo indica que o Tribunal Superior
Eleitoral (TSE) arquivará o pedido de cassação da chapa Bolsonaro-Mourão por
disparo em massa de mensagens na campanha eleitoral de 2018.
No STF, o ministro Kassio Nunes Marques,
nomeado por Bolsonaro, acaba de reconduzir ao cargo o conselheiro do Tribunal
de Contas do Estado do Rio Domingos Brazão, ex-deputado estadual investigado na
CPI das Milícias e afastado por suspeita de corrupção.
Isso depois de uma semana em que Paulo
Guedes perdeu quatro auxiliares-chave, numa debandada contra a mudança de
regras que permitirá ao governo extrapolar o teto de gastos. A saída fez o
dólar registrar sua maior alta desde abril e a Bolsa, a maior queda em um ano.
Para completar, na noite de domingo vazou
um áudio em que o controlador do BTG, André Esteves, se gabava de dar conselhos
a Arthur Lira sobre como lidar com a crise na economia e contava, na maior
naturalidade, sua troca de ideias com o presidente do Banco Central sobre o
patamar ideal para a taxa de juros.
Em qualquer país sério, o episódio teria
causado um furdunço. No Brasil, foi o contrário. O dólar e a Bolsa
estabilizaram, no que observadores mais irônicos interpretaram como reação
favorável do mercado ao constatar quem de fato está no comando.
Com tudo isso acontecendo, os líderes dos
principais partidos do Centrão, PL e PP, estão disputando a tapas a filiação de
Jair Bolsonaro e sua trupe em suas legendas.
O presidente do PL, Valdemar Costa
Neto, divulgou um vídeo anunciando ter convidado Bolsonaro e
seus filhos “e fiéis seguidores da causa brasileira”, esperando que o
presidente da República anunciasse a filiação no dia seguinte, mas o PP de Lira e Ciro Nogueira atravessou a
negociação.
Os dois prometeram a Bolsonaro mais espaço
para seus candidatos e ouviram dele que tinham voltado ao primeiro posto na
fila de suas preferências.
Lira, Nogueira e Costa Neto não são
neófitos na política, nem consta que se movam por paixões ideológicas. Quem
abrigar Bolsonaro em seu partido terá de ir até a urna com ele. Portanto, se
estão cortejando Bolsonaro com tamanha sofreguidão, é porque entendem que,
mesmo com os péssimos prognósticos na economia e o cenário desanimador das
pesquisas, estar colado ao presidente da República ainda vale mais que
abandoná-lo e pular de canoa no meio da corrida eleitoral.
Para esses caciques, o jogo é usar as
verbas e o apelo eleitoral que Bolsonaro ainda tem para engordar suas bancadas
no Congresso no pleito de 2022 e ingressar com mais força no novo governo em
2023, qualquer que seja ele.
Isso mostra que as pesquisas estão erradas?
Não necessariamente.
Mas sugere que é muito cedo para considerar
que Bolsonaro já era. O presidente ainda é forte na disputa. E se tornará um
adversário ainda mais difícil de bater se souber usar a seu favor os R$ 5
bilhões previstos para o fundo eleitoral, mais os quase R$17 bilhões ainda
disponíveis no orçamento secreto.
No fundo, a disputa para filiar o
presidente é uma demonstração de que, para o Centrão, ele pode representar um
risco à democracia, uma tragédia para a saúde pública e uma temeridade para a
economia.
Mas, enquanto esses caciques e suas necessidades
estiverem bem contemplados, a sobrevivência política de Bolsonaro está
assegurada. Por aí se calcula quanto custará mantê-lo vivo até o final de 2022.
Será uma conta que todos vamos pagar.
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