O Estado de S. Paulo
Se depender do procurador-geral da República, Bolsonaro não será denunciado
Ao receber o relatório final da CPI da
Pandemia, o procurador-geral da República afirmou em rede social que o
Ministério Público poderá agora “avançar” em investigações. Até aqui Augusto
Aras não viu crime cometido por Jair Bolsonaro nas mais de mil páginas
produzidas pela CPI, uma convicção que ele foi formando à medida que recebia os
materiais da investigação feita pelos senadores (através do Giac, o Gabinete
Integrado de Acompanhamento da Epidemia Covid-19, que ele mesmo coordena
abrangendo todos os braços do Ministério Público).
À medida que o Giac encaminhava os materiais coletados pela CPI (que formam a base do relatório final), o PGR solidificava a percepção de que a investigação se dava num importante e legítimo palco da política, mas que não passava disso: de atividade inerente à política e com forte coloração eleitoral. E eventuais crimes de responsabilidade cometidos pelo presidente cabem ao Senado resolver, e não ao PGR.
Não é assim que seus próprios auxiliares leram o relatório final, considerado por eles devastador. Ao redor de Aras afirma-se que Bolsonaro encabeçava uma cadeia de comando responsável por omissões, decisões estapafúrdias, negligência e empenhada por razões políticas em condutas que se opunham ao que diziam órgãos técnicos e instituições científicas.
Dois motivos ajudam talvez a entender a
postura até aqui de Augusto Aras. O primeiro, benigno ao PGR, seria de natureza
“doutrinária”. Não caberia ao PGR colocar a República de pernas para o ar – em
contraste com o que fizeram alguns de seus antecessores. No Brasil, segundo
essa versão, corrente em setores influentes no STF, desaprendeu-se a separar o
que é campo do Direito daquilo que é campo da política.
O segundo motivo são as ambições pessoais
do PGR. O ombro dele ainda sente o tapinha repetido por Bolsonaro em várias
ocasiões, prometendo a ele, Aras, a vaga que André Mendonça parece distante de
ocupar no STF. Mais de um ministro do Supremo gosta da ideia, enquanto outros
dizem que deveria haver uma quarentena para evitar que o PGR paute seu
comportamento de olho na vaga vitalícia no STF.
O trabalho da CPI constitui um dos mais
devastadores relatos na história brasileira sobre incompetência, ignorância e
má-fé por parte de um presidente da República, não importa o que operadores do
campo do Direito digam sobre tipificação de crimes. Em relação a Bolsonaro,
Aras está a caminho de ser lembrado como autor de uma nova doutrina, já
apelidada dentro do MPF de Ctrl + T + Del. Seleciona tudo e apaga.
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