Valor Econômico
Reunião entre siglas tirou o bode na sala
colocado por Lula
Para além da sinalização ao eleitorado e a
setores conservadores, como o mercado, na disputa ao Planalto, a atração do
ex-governador Geraldo Alckmin (sem partido) para ser vice na chapa do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva já teve o primeiro resultado. A
aproximação com o ex-tucano, que vinha liderando as pesquisas para voltar ao
Palácio dos Bandeirantes, aplaina o terreno para o segundo maior objetivo do PT
nas eleições deste ano: ganhar pela primeira vez o governo de São Paulo.
A candidatura do ex-prefeito Fernando
Haddad, como deixou claro Lula, novamente, em entrevista na quarta-feira, é uma
prioridade. Com Haddad liderando, sem Alckmin na jogada, mais um motivo para o
partido redobrar a aposta na queda de braço da negociação com o PSB: remover o
segundo obstáculo, a pré-candidatura do ex-governador Márcio França.
A reunião de ontem entre as cúpulas petista e pessebista foi menos tensa que a de um mês atrás. Em 20 de dezembro, Lula pôs o bode na sala ao lembrar que o PT tinha acabado de lançar o senador Humberto Costa como pré-candidato a governador em Pernambuco. Trata-se do Estado que é o coração do PSB, desde os tempos de Miguel Arraes e de seu herdeiro, Eduardo Campos, morto em acidente aéreo durante a campanha à Presidência de 2014.
Então braço direito de Campos e
secretário-geral do partido, o presidente do PSB Carlos Siqueira saiu irritado
do encontro há um mês. Além de não abrir mão de Haddad em São Paulo, Lula
cresceu o olho sobre o reduto eleitoral mais caro à direção pessebista. Desta
vez, sem a presença do ex-presidente, e depois das manifestações de
insatisfação, a negociação começou a ser destravada. “[A conversa] foi boa, mas
não decisória. O avanço foi tímido, mas houve, ao sinalizar com maior clareza
sobre Pernambuco e Rio”, afirmou o dirigente à coluna.
Entre as decisões do encontro está a de se
fazer novas reuniões sobre as alianças nos Estados, a começar por Pernambuco,
na próxima quinta-feira. Presidente do PT, a deputada Gleisi Hoffmann
reconheceu que o PSB tem a “preferência da indicação” do candidato à sucessão
do governador Paulo Câmara. Não seria nenhuma concessão substancial, dado que
Pernambuco é a joia da coroa do PSB, cujas demandas de apoio ao PT incluem
ainda quatro Estados: São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Rio Grande do
Sul.
Não custa lembrar, contudo, que na última
eleição municipal, em 2020, o PSB penou para eleger João Campos, filho de
Eduardo e bisneto de Arraes, contra a própria prima dele, a deputada federal
Marília Arraes, lançada pelo PT. A disputa entre os dois pela Prefeitura do
Recife ficou marcada por uma campanha extremamente virulenta, de lado a lado.
O clima de beligerância familiar e
partidário, no entanto, arrefeceu desde a retomada dos direitos políticos de
Lula e da perspectiva de volta do PT ao governo federal. O favoritismo de Lula
para derrotar o presidente Jair Bolsonaro, apontado por pesquisas que indicam
possibilidade de vitória já no primeiro turno, apaziguam o campo progressista.
Não à toa, a formação da federação
partidária entre legendas de esquerda, também tratada na reunião de ontem,
tornou-se outra frente de negociação para uma ampla aliança, que inclui, além
de PT e PSB, o PCdoB e o PV. A federação - que obriga as siglas a permanecerem
juntas por quatro anos, em todas as esferas de governo - é fruto de uma
inovação legislativa, mas muito do esforço para sua concretização é explicado
pela expectativa de que haverá um governo Lula.
Sem isso, o ambiente seria de combate ao
protagonismo do PT, como já vinha ocorrendo com a política de alianças
regionais entre o PSB e o PDT, que ficou isolado ao insistir na candidatura do
ex-ministro Ciro Gomes.
A decisão das agremiações de recorrerem ao
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para que a Corte adie o prazo de formalização
da federação, previsto para 1º de março, é outro sintoma de que há um projeto
comum, liderado pelas cúpulas partidárias, embora muitas arestas persistam nas
bases estaduais e municipais.
É nesse contexto, de busca pelo
entendimento, mas com o peso de ter Lula como trunfo eleitoral de
desequilíbrio, que o PT busca prevalecer seus interesses em São Paulo. É
verdade que o PT, como defende Siqueira, não pode querer “tudo”: ter o apoio do
PSB na eleição à Presidência e também nos Estados. Mas também é fato que no
maior colégio eleitoral do país está sediada a dinâmica do poder nacional do
PT, assim como a do PSB está em Pernambuco.
Para preservar São Paulo e o projeto
nacional, o PT tem à disposição, como sempre, o Rio de Janeiro como moeda de
barganha. O mesmo Rio onde o partido sacrificou seu crescimento ao impedir
candidatura própria em troca do apoio do PDT de Leonel Brizola a Lula, em 1998.
Em vez de Anthony Garotinho, o beneficiário agora é o deputado federal Marcelo
Freixo.
Freixo é cristão-novo no PSB mas jogou
contra os interesses do partido e de Márcio França ao defender, nesta semana, a
tese de que é natural o PT bater pé por Fernando Haddad. O significado político
da declaração é amplo. Mostra desde a perda de força da candidatura de França
no PSB - onde já se cogita a desistência - como indica um agrado estratégico de
Freixo à cúpula petista.
Afinal, no PT fluminense, há resistência a
seu nome vinda do líder do partido no Estado e vice-presidente nacional. Para
Washington Quaquá, que defende aliança com o grupo do prefeito Eduardo Paes
(PSD), o deputado “estreita” o palanque de Lula no Rio. “Ele [Freixo] não tem
apoio da direção nacional. Tem apoio da Gleisi”, diz.
A relutância da adesão a Freixo estimulou
nos últimos dias a circulação da ideia de que o presidente da Assembleia, André
Ceciliano (PT), estaria se mexendo para ser o candidato a governador, com o
apoio de Paes. O petista nega a movimentação: “Brizola ensinou que política não
é como árvore que nasce de baixo pra cima. Ela nasce de cima pra baixo. De
novo: será o cenário nacional quem definirá a questão regional. O Rio não será
problema para o presidente Lula. Será solução”.
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