Folha de S. Paulo
Os 200 jornalistas da Folha ousaram botar o
dedo na ferida
A carta aberta à direção desta Folha assinada por cerca de
200 jornalistas propõe um debate necessário e fecundo, que ultrapassa as
fronteiras do jornalismo. É do interesse de toda a sociedade e da democracia. A
carta-manifesto já nasce histórica, num ano decisivo para o futuro do país.
O documento deixa claro que a pluralidade e
a defesa intransigente da liberdade de expressão —princípios com os quais os jornalistas
concordam— não dispensam o jornal do compromisso com a verdade e com o respeito
rigoroso aos fatos históricos.
A pluralidade não pode ser um princípio oco, que se preste a vários tipos de negacionismo. Tem que estar preenchida com a argamassa do discernimento, do espírito crítico, da ética e da honestidade intelectual, essenciais para o exercício do jornalismo.
Estamos vendo as consequências do
negacionismo científico. E aí vem o cerne da carta: se a Folha não dá espaço, por
exemplo, para a relativização do Holocausto e para o movimento antivacina, por
que publicar teses que relativizam
o racismo? A seguir nesse caminho, a chegada do homem à Lua será posta em
dúvida?
A reflexão sobre falsas equivalências serve
a muitas outras escolhas editoriais, não apenas da Folha, mas de boa parte da
mídia e, sobretudo, neste ano eleitoral. Propor discussão não é censura nem
"cancelamento" de quem quer que seja. O dia que jornalistas não
puderem questionar critérios editoriais é porque o jornalismo morreu. Redações
devem —ou deveriam— ser lugar de ponto e contraponto, de disputa de argumentos
e ideias e de afirmação de valores civilizatórios.
Os 200 jornalistas da Folha ousaram botar o dedo
na ferida, fazendo-o por meio de uma carta ponderada e de clareza solar. Devem
ser elogiados por isso, não atacados. Sua coragem está à altura do momento
histórico que atravessamos e dignifica a luta dos jornalistas por um país mais
justo. A esses colegas, minha imensa admiração, respeito e total solidariedade.
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