O Globo
A Justiça cubana está julgando e condenando com penas severas os
participantes dos protestos de julho de 2021. Em 11 de julho e nos dias que se
seguiram, milhares de cubanos, muitos deles bem jovens, saíram às ruas para
exigir liberdade e protestar contra as condições econômicas, a escassez de
medicamentos e a resposta do governo à pandemia. Organizações de direitos
humanos estimam que mais de 1.300, a grande maioria manifestantes pacíficos,
foram detidos. Mais de 700 continuam presos provisoriamente, entre eles 39 adolescentes. Muitos julgados dizem que nem sequer tiveram
acesso a um advogado.
As acusações mais graves, de rebelião, podem resultar em sentenças de até 30 anos de prisão. O número exato dos que são julgados é desconhecido, já que o governo cubano se nega a dar qualquer informação sobre os processos, a imprensa oficial não os cobre, e a imprensa estrangeira não tem acesso aos julgamentos.
O governo cubano nega que haja qualquer
restrição ao direito de manifestação no país. Quando confrontado com os fatos,
justifica a dura repressão dizendo que os protestos são atos de rebelião insuflados
pelos Estados Unidos.
A situação dos direitos humanos em Cuba é
muito ruim. O último relatório da Human Rights Watch dá a dimensão do
problema.
Aos detidos nos protestos de julho,
somam-se os coletivos de artistas presos em manifestação no dia 15 de novembro.
Eles foram os únicos que arriscaram se manifestar numa marcha cívica pela
mudança depois da dura repressão de julho. O rapper Maykel Osorbo, autor de
“Patria y vida” (que inverte o slogan revolucionário “Patria o muerte”), ganhador do
principal prêmio no Grammy Latino neste ano, continua preso e incomunicável. Outros participantes do clipe
que promove a canção também seguem presos provisoriamente.
Em fevereiro, o governo autorizou uma série
de atividades econômicas privadas, mas o exercício do jornalismo independente
continua proibido. Embora a oferta de internet venha sendo ampliada desde 2017,
o acesso à rede foi interrompido várias vezes durante os protestos.
Um decreto de 2021 que regulamenta as
telecomunicações determina que os provedores interrompam, suspendam ou cancelem
os serviços quando publicarem informação “falsa” ou que afete o “respeito à
ordem pública”. Outro decreto, de 2018, proíbe a difusão de informação
“contrária ao interesse social, à moral, aos bons costumes e à integridade das
pessoas”. Segundo a Human Rights Watch, esse decreto tem sido rotineiramente
usado para interrogar jornalistas e críticos ao regime e confiscar seu material
de trabalho.
Embora se denomine socialista, o regime
limita a liberdade de organização sindical. Ainda que a legislação autorize a
formação de sindicatos independentes, o governo não tolera, de fato, a atuação
dos que não pertençam à Central de Trabalhadores de Cuba, controlada pelo
Estado.
Cuba tem um regime de partido único, sem
liberdade de organização, sem liberdade de expressão e sem liberdade sindical.
O regime assegurou ganhos sociais muito relevantes em saúde e educação, mas a
ditadura não pode ser o preço a pagar pelos direitos sociais.
A defesa intransigente dos direitos humanos
precisa estar acima das identidades de esquerda ou de direita, sobretudo num
mundo onde esses direitos são atacados por Bolsonaros e Maduros. Este é o
momento de a esquerda brasileira — que muito corretamente protestou contra a
repressão e as prisões arbitrárias de manifestantes no Chile em 2019 e 2020 —
se indignar e protestar também contra prisões ainda mais arbitrárias e com
penas mais severas em Cuba em 2021.
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