Folha de S. Paulo
Oito em cada dez estão insatisfeitas com o
tratamento que recebem da população
Na semana passada, pelo transcurso do Dia
Internacional da Mulher, o Brasil teve de se haver de novo com manifestações
patéticas, típicas do clamoroso reacionarismo do presidente, dessa vez
secundado pelo procurador-geral
da República. Um e outro incapazes de entender o valor da igualdade de
direitos entre mulheres e homens numa sociedade civilizada, muito menos os
avanços na matéria nas últimas décadas.
Eis por que merece leitura atenta o "Observatório Febraban 2022 – mulheres, preconceito e violência", que apresenta os resultados de uma sondagem com 3.000 brasileiras, esmiuçando seus pontos de vista sobre diferentes dimensões das iniquidades de gênero no país.
Embora considerem que as coisas melhoraram
um pouco, oito em cada dez entrevistadas no estudo se disseram insatisfeitas
com o tratamento que recebem da população —as negras mais do que as brancas, as
solteiras mais do que as casadas.
Oportunidades semelhantes no mercado de
trabalho e na educação; combate à violência de gênero e punição dos agressores;
acesso a cargos de liderança; e o compartilhamento efetivo do trabalho
doméstico são considerados indicadores de igualdade mais importantes do que a
superação de normas conservadoras de conduta, maior liberdade sexual ou o
direito ao aborto.
Em consequência, as manifestações mais
sentidas de iniquidade são os desníveis de salário e as oportunidades
profissionais desiguais; o fardo da faina doméstica; e os papéis sociais de
coadjuvantes a que são relegadas as mulheres. Somando-se às manifestações
rotineiras de preconceito e discriminação; ao assédio sexual e moral e à
violência —vivida sobretudo em casa—, constituem, para as brasileiras, o núcleo
das desigualdades de gênero. Dele já não faz parte o acesso à educação,
percebido como um caminho aberto às mulheres. Já a sub-representação política,
embora reconhecida, parece menos relevante.
As brasileiras reconhecem o papel das
feministas para o avanço da igualdade. Uma em cada duas entrevistadas cita a
Lei Maria da Penha —que visa punir a violência de gênero—, como o principal
marco dessa jornada. Bem à frente do direito ao voto, lembrado por 19% das
entrevistadas. Talvez por desconfiança do jogo político, a maioria (55%) se
opõe às cotas partidárias, entendendo que a representação feminina deve ser
espontânea e fruto do mérito individual.
Nem a agenda dos direitos reprodutivos, nem
a da representação política fluem das prioridades captadas pela pesquisa da
Febraban. Condições necessárias para uma sociedade mais justa, só podem ser
obra de paciente persuasão.
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