Folha de S. Paulo
Em ritmo mais lento, Selic vai subir mais;
BC manda recado para Bolsonaro
A dose do remédio vai ser menor, mas o
tratamento vai mais longe. O Banco
Central aumentou a taxa básica de juros de 10,75% ao ano para 11,75% ao ano,
mas quase prometeu que a Selic vai a 12,75% em maio. Afora milagres na política
e na economia do Brasil e do mundo, não vai parar aí: 13% é um piso. O arrocho
monetário se aproxima daquele que se viu em 2015, na Grande Recessão.
Pode ser ainda pior, a depender do que vai
ser da guerra, do nível de maluquices
da campanha eleitoral e do que vai fazer Jair Bolsonaro com o gasto
público.
O BC sempre faz alertas "fiscais". Isto é: diz que mais despesa e dívida crescendo sem limite implicam juros mais altos. Mas deu um recadinho extra no comunicado desta quarta-feira.
Está lá escrito: "...políticas fiscais
que impliquem impulso adicional da demanda agregada ou piorem a trajetória
fiscal futura podem impactar negativamente preços de ativos importantes e
elevar os prêmios de risco do país".
"Ativos importantes": dólar.
"Impulso adicional da demanda
agregada": o governo tenta aumentar um tanto o consumo a fim de fazer
o PIB crescer uns décimos a mais, aliviando com uns caraminguás as agruras
do povo miúdo, o que talvez renda uns pontos nas pesquisas.
É o que Bolsonaro tem feito e ainda vai
tentar fazer. O governo reduziu impostos (sobre produtos industrializados; com
ajuda do Congresso, sobre diesel e outros combustíveis). Pretende liberar o saque
de parte do dinheiro do FGTS. Vai antecipar
o pagamento do 13º benefício do INSS. Quer dar
crédito mais barato para pequena e média empresa.
São medidas que vão na contramão da
política de controle de inflação. Por um lado, esses dinheiros sopram algumas
brasas de consumo em
uma economia inflacionada. Por outro, as medidas podem criar a suspeita de
que Bolsonaro queira chutar a porta do cofre, gastar mais, fazer mais dívida, o
que, em tese, pode até encarecer o dólar e as taxas de juros mais longas (mas,
francamente, vai saber).
Sim, o BC afirmou também que esses riscos
fiscais e políticos já estão em parte incorporados nas expectativas
de inflação e no dólar. Em suma, nos preços do mercado. Mas há
possibilidade ainda não computada de a coisa piorar, diz o BC ("assimetria
altista no balanço de riscos").
Em um comunicado colorido por cenários
alternativos, dada a incerteza aumentada pela guerra, o BC disse reafirmou
também que vai ser agressivo. Isto é, vai levar a inflação para a meta em 2023
(a de 2022 já era) e que não vai parar enquanto as expectativas de inflação não
baixem até essas metas.
A projeção básica do BC para a inflação de
2022 é 7,1% para 2022 (acima da mediana do mercado) e de 3,4% para 2023. Isto
é, são projeções com base na estimativa de que a Selic chega a 12,75% em 2022.
Aparentemente, pois, a Selic vai mais longe.
Está dito lá: "...diante de suas
projeções e do risco de desancoragem das expectativas para prazos mais longos,
é apropriado que o ciclo de aperto monetário continue avançando
significativamente em território ainda mais contracionista".
O choque agudo dos preços de commodities
pode passar. Mas os efeitos da crise vão durar mais, por mudanças maiores na
economia e na política mundiais. A bagunça brasileira ainda pode conter a onda
recente de valorização do real, sempre um refresco na inflação.
Tudo mais constante, o Brasil vai crescer
menos. A conta de juros será algo maior, assim como a dívida pública.
Estabilizar essa dívida será mais difícil
(vai exigir mais impostos ou também mais contenção de gastos, a não ser que
ocorra o "milagre do crescimento" do PIB). A situação para o governo
de 2023 também fica mais difícil.
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